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A crise e o Banco Central

Por André Pimentel
Atualização:
André Pimentel. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

A atuação do Banco Central Brasileiro tem sido alvo de diversos questionamentos pelos participantes de mercado. Desde o início do turbulento ano de 2020, o comportamento do real tem sido negativo e tem suscitado demandas de uma atuação mais contundente por parte da autoridade monetária. Antes mesmo da pandemia atingir o Brasil, a moeda local já tinha desvalorizado frente aos principais pares e impunha movimentos de aversão a risco em outros mercados.

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Com a chegada do Covid-19 ao Ocidente começou a ficar claro que a doença teria efeitos muito mais graves do que os antecipados e que o seu combate em países com mais apego à democracia não seria tão trivial quanto o travado no gigante asiático. Como resposta, bancos centrais ao redor do globo, liderados pelo FED, começaram políticas de estímulo e injetaram trilhões de dólares nas economias em busca de aumentar a liquidez, permitindo que indivíduos e empresas tivessem alguma chance de sobrevivência durante o isolamento social recomendado pela OMS.

Mesmo com os estímulos apresentados o que vimos foi o movimento de queda mais rápida da história nas bolsas, o qual foi mais sentido, obviamente, nos países que já mostravam situação frágil anterior à crise. Entre essas nações estava o Brasil, que vinha de um longo período de recessão e tentava aprovar reformas para melhorar a situação fiscal. O resultado foi uma saída de recursos até dez vezes superior àquela verificada na Crise Financeira de 2008. Com tamanha saída de recursos, ficou inevitável a acelerada desvalorização da moeda e foi necessária atuação do Banco Central para enfrentar a disfuncionalidade que se apresentava. Alternando entre intervenções no mercado à vista, futuro e mesmo com compromissadas em dólar, a autoridade monetária interveio com mais de U$40bi na tentativa de atenuar o movimento, mas, como sempre enfatizado, mantendo a livre flutuação e evitando estabelecer um patamar ótimo para a moeda.

Ocorre que a expectativa de forte queda no PIB resultou em também relevante redução nas projeções de inflação. Como a meta estabelecida pelo CMN para o Banco Central reside exatamente na inflação, o COPOM se viu compelido a implementar novos cortes na taxa básica de juros, mesmo com a SELIC já se encontrando nos patamares mais baixos da história, iniciando uma mudança estrutural que certamente terá consequências nos mais diversos segmentos da economia.

A queda do país no ranking de taxa de juros mundial já vinha proporcionando redução significativa no volume de operações tradicionalmente de curto prazo que visavam se beneficiar do diferencial de juros, os chamados carry trades, e se observou a saída destes recursos. Adicione-se a isto a nova realidade vivida, onde os juros existentes já não são proibitivos para operações de hedge, e resultam em demanda por moeda estrangeira muito superior do que à historicamente verificada.

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Em meio a essas mudanças estruturais, efeitos temporários da crise fizeram com que as importações desabassem, enquanto as exportações apresentaram resiliência importante. Isso seria bastante positivo em termos de fluxo se o Investimento Estrangeiro Direto - este um fluxo normalmente de longo prazo - não tivesse sido fortemente afetado pela pandemia. Além destes diversos vetores de fluxos há outro, e ainda incipiente, efeito da mudança estrutural resultante da baixíssima taxa de juros no país: a viabilidade de investimento no exterior pelos brasileiros. Historicamente receptor de recursos de investimentos e importador de poupança, o Brasil tem visto essa fonte de recursos minguar desde a perda do grau de investimento em 2015, o que tem tido importante papel na mudança de direção observada na moeda brasileira. Mas a possibilidade de enviar recursos ao exterior inaugura uma nova era para os investimentos dos brasileiros. Antes desestimulada pelas altas taxas de juros locais, a hoje tão falada diversificação geográfica ganha terreno e impõe novos desafios às projeções de fluxos e expectativas para o preço de equilíbrio da moeda.

Diante de tantas fontes de mudanças nos fluxos e de novos comportamentos de difícil previsibilidade, as projeções dos participantes do mercado tendem a ter uma maior variação e parece razoável esperar uma volatilidade elevada na moeda. O mais provável é que este movimento perdure até que o novo equilíbrio seja alcançado naturalmente e que qualquer comportamento mais agressivo por parte da autoridade monetária seja insuficiente, por eventualmente não conter remessas em movimentos estruturais, ou inapropriado, no caso de influenciar o preço da moeda e permitir a saída dos recursos num nível artificialmente valorizado. O que a moeda precisa é de intervenções em momentos de disfuncionalidade, como tem sido feito pelo Banco Central, de tempo e de paciência. Estes últimos, fatores normalmente em falta no mercado financeiro e extremamente importantes para o equilíbrio em qualquer mercado que tenha enfrentado crise e mudanças de fluxos tão relevantes quanto as enfrentadas pelo real.

*Andre Pimentel, diretor de investimentos na gestora de recursos Infinity Asset

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