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A anemia das medidas tributárias em tempos de pandemia

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Por André Felix Ricotta de Oliveira
Atualização:
André Felix Ricotta de Oliveira. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Com essa crise sanitária que ataca diretamentea todos e em todos os sentidos -setores econômicos, políticos e sociais - , em razão da saúde e das dificuldades hospitalares, mas também pela necessidade do isolamento social, milhares de empresas estão fechando, aumentando o desemprego, com trabalhadores autônomos e  informais vivendo dificuldades para se manterem. Registra-se, que em São Paulo, estamos quase chegando à efetiva quarentena (no sentido estrito e original da palavra).

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Um dos grandes dilemas mundiais é como acabar com isolamento social, e a melhor forma de retomar à vida normal e a economia, mitigando os efeitos colaterais. Uma das ferramentas para essa retomada econômica, manutenção dos empregos e do empreendedorismo, está nas medidas tributárias que podem e devem ser adotadas pelo Governo, utilizando-se do caráter extrafiscal de normas tributárias disruptivas de estímulo ao desenvolvimento.

Contudo, o Governo somente está tomando medidas tímidas em matéria tributária, que não resguardam a iniciativa privada, a garantia dos empregos, e nem contribui para que as empresas consigam retomar suas atividades empresariais e alavancar a economia do país.

No âmbito federal foram tomadas basicamente quatro medidas tributárias para combater a crise atual, quais sejam:

(a) A redução da alíquota do IOF a zero para as operações de créditos contratadas no período de 03/04/20 a 03/07/2020; sendo tal benefício para qualquer modalidade de empréstimo, inclusive contratos de renovações e prorrogações;

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(b) Redução temporária das alíquotas das contribuições do sistema "S" em 50%, exceto a contribuição ao Sebrae;

(c) Prorrogação do prazo para pagamento das contribuições sociais e previdenciárias (contribuição sobre a folha cota patronal, RAT, do segurado individual, Funrural, contribuição previdenciária do empregador doméstico, PIS, COFINS, CPRB e FGTS) devidas nos meses de abril e maio para agosto e outubro de 2020. As empresas optantes pelo Simples Nacional também tiveram prorrogação dos vencimentos dos recolhimentos de abril, maio e junho para outubro, novembro e dezembro.

(d) Por fim, a desoneração dos bens e medicamentos necessários para o combate do coronavírus da incidência do IPI e do Imposto de Importação.

Se as medidas do Governo Federal foram tímidas para mantença dos empregos e retomada da economia, as do Governo Estadual de São Paulo e o Município nem se fala, praticamente não fizeram nada na área tributária, apenas prorrogação do Simples Nacional referente ao ICMS e ISS.

Tais medidas são meros paliativos, que efetivamente não ajudaram muito as empresas, apenas dão um respiro momentâneo, pois quando acabarem as prorrogações dos prazos para pagamento dos tributos, o contribuinte terá que arcar com as exações devidas no mês de exercício mais as contribuições e impostos que estavam suspensos.

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Ora, se em uma situação normal dificilmente um contribuinte consegue pagar os tributos devido no mês cumulado com os que estão em aberto, ou seja, pagar dois impostos, duas contribuições de mesma natureza de uma só vez, imagina na situação atual em que a maioria dos contribuintes voltarão ou tentarão retomar suas atividades com receitas diminutas!  Óbvio, que não conseguirão responder pelos tributos devidos e acarretarão níveis absurdos de inadimplência.

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Reduzir o IOF para facilitar o acesso ao crédito também não ajuda muito, pois a maioria das empresas pedirem empréstimos devido à crise, já estarão tão prejudicadas que dificilmente conseguirão financiamentos ou linha de crédito. As instituições financeiras emprestam para quem está bem financeiramente, não para quem está precisando se reerguer ou recomeçar sua atividade. Geralmente, quem precisa de empréstimo não tem acesso.

Diante dessa pandemia imaginável, medidas mais audaciosas precisam ser tomadas para efetivamente proteger a economia, o contribuinte e o emprego. Não adianta um país com alta carga tributária (maior que a média da OCDE) querer elevar mais a carga tributária visando obter mais recursos para arcar com os gastos da crise. Medidas nesse sentido somente prejudicariam mais a situação financeira dos empreendedores, dos trabalhadores e das empresas para retomarem suas vidas, seus negócios e a economia.

Quando digo medidas audaciosas, o Governo terá que reduzir em primeiro momento a sua entrada de receitas advindas da tributação, diminuindo a carga tributária e concedendo efetivos benefícios fiscais, objetivando ajudar a retomada do crescimento econômico e a mantença do emprego.

Necessário, nesse momento, diminuir o custo tributário da atividade empresarial e os encargos sobre o emprego. Algumas medidas que poderiam ser tomadas, seriam a redução temporária das alíquotas das contribuições incidentes sobre a folha de salários, a suspensão do Imposto de Renda por estimativa das empresas no Lucro Real (as empresas dificilmente terão lucro no final do exercício e estarão dispendendo recursos financeiros para antecipar um impostos que não será devido), retorno da alíquota inicial na época da instituição do Simples Nacional, acabar com asdificuldades e obstáculos para os contribuintes aproveitarem créditos e prejuízos fiscais, fim da exigência da certidão negativa de débitos - CND (a maioria das empresas terão restrições), redução temporária da alíquota do ICMS e respeito ao princípio da não-cumulatividade garantindo o total aproveitamento de créditos do imposto (crédito financeiro garantido pela Constituição Federal) para liquidar seus débitos, entre outras.

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Deve-se acabar com as burocracias e empecilhos legais ou não, que impedem o contribuinte de aproveitamento integral de seus créditos fiscais advindos de pagamento a maior ou indevidamente de tributos para compensar com seus débitos tributários, bem como o integral direito do contribuinte aproveitar os créditos de PIS e COFINS advindo da aquisição de insumos.

Quanto às empresas prestadoras de serviços é de fundamental importância tirá-las do regime da não cumulatividade do PIS e da COFINS, pois não possuem muitos direitos aos créditos para compensar com as respectivas contribuições devidas, tendo em vista que seu principal custo são os salários dos trabalhadores e estes não dão direito a crédito para compensar com o PIS e a COFINS.

O Governo terá, inicialmente, uma diminuição das suas receitas, irá se endividar, porém sempre terá receitas entrando nos cofres públicos, mas também precisa fazer sua lição de casa e reduzir drasticamente suas despesas e acabar com as mordomias e penduricalhos existentes em todos os Poderes, em prol de toda sociedade, da retomada econômica e do emprego, atingindo a finalidade do Estado ou próximo daquilo que é o bem comum da população. Posteriormente, passando essa crise e com o desenvolvimento econômico a tendência é um aumento de arrecadação fiscal.

Está mais do que na hora de ser respeitado o princípio da República e revermos os gastos públicos, os privilégios e despesas supérfluas, para enxugar o Estado e ajudar a diminuir o custo Brasil.

Estamos diante de uma oportunidade para reduzir os gastos da máquina pública e da carga tributária para podermos manter os empregos, sair dessa crise, retomar as atividades econômicas e cotidianas.

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*André Felix Ricotta de Oliveira é advogado. Professor de Direito Tributário. Doutor em Direito Tributário e presidente da Comissão de Direito Tributário e Constitucional da OAB-Pinheiros

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