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A adoção do arrolamento de bens e direitos pela Receita Federal e a violação aos princípios da eficiência e razoabilidade

Por Maucir Fregonesi Junior e Gabriela Miziara Jajah
Atualização:
Maucir Fregonesi Junior e Gabriela Miziara Jajah. FOTOS: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

O arrolamento de bens e direitos é medida administrativa prevista na Lei nº 9.532/1991 (arts. 64 e 64-A), e vem regulamentado pela Instrução Normativa RFB nº 1565/2015. É aplicado aos casos em que o contribuinte (pessoa física ou jurídica) teve contra si a lavratura de auto de infração cujo débito exceda 30% de seu patrimônio líquido conhecido e, cumulativamente, seja superior ao valor de 2 milhões de Reais.

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Nesse sentido, o arrolamento de bens e direitos não se confunde com penhora nem com qualquer outro tipo de garantia ou constrição patrimonial do contribuinte. Na realidade, trata-se de procedimento empregado pela Receita Federal do Brasil para o monitoramento de patrimônio de contribuinte contra quem houve o lançamento de crédito tributário, no intuito de se viabilizar o pagamento do débito fiscal se assim vier a decidir, ao final, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais - CARF. Daí porque os próprios Tribunais entenderem que o arrolamento de bens e direitos não constitui sanção política empregada pelo poder público com o fim de pressionar o contribuinte para o imediato pagamento de tributos.

Entretanto, na prática, nem sempre é isso que ocorre, sobretudo nas hipóteses de autuação fiscal relacionada à amortização de ágio ou de planejamento tributário, em que a Autoridade Fazendária atribui concomitantemente, ao lado da pessoa jurídica, a responsabilidade solidária de seus diretores e administradores.

De fato, nesses casos, não é incomum nos depararmos com situações em que a Receita Federal do Brasil deixa de proceder ao arrolamento do patrimônio da pessoa jurídica (a devedora principal) quando este supera em muitas vezes o valor do crédito tributário lançado no auto de infração respectivo.

Inobstante tudo, a Autoridade Coatora não deixa de impor o mesmo arrolamento aos diretores e administradores dessa empresa, caso o patrimônio destes seja inferior, como dito, a 30% do montante consignado na autuação fiscal.

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É verdade que o art. 2º, § 2º, da Instrução Normativa RFB nº 1565/2015 estipula expressamente que, havendo pluralidade de sujeitos passivos, deverão ser arrolados os bens e direitos daqueles cuja soma dos créditos tributários sob sua responsabilidade exceder, individualmente, os limites previstos na lei.

Ora, independentemente da dicção literal e fria da lei, a que serve mesmo o arrolamento de bens e direitos? O intuito da norma não foi o de acompanhar a evolução patrimonial do contribuinte, evitando-se, com isso, uma eventual dilapidação que pudesse comprometer o pagamento de um futuro crédito tributário?

Se assim é, não há dúvida que, nas hipóteses acima mencionadas, a formalização do arrolamento de bens e direitos em face de diretores e administradores da pessoa jurídica, em detrimento desta, acaba não apenas por frustrar o objetivo último da norma jurídica (a satisfação do crédito tributário), mas também por desvirtuá-la, eis que pode consubstanciar notório caráter de sanção política.

Com efeito, nos casos de autuação fiscal de elevado valor, em que seja desnecessário o arrolamento de bens da pessoa jurídica, em razão da existência de patrimônio mais que suficiente para cobrir o futuro débito fiscal, impor esse procedimento àquele cujo patrimônio, no mais das vezes, é irrisório para tanto (o do diretor ou o do administrador) acaba por violar os princípios da razoabilidade e eficiência.

Isso porque, considerando-se que todos os devedores (principal e solidários) respondem pelo valor total do futuro débito fiscal, se o devedor principal (a pessoa jurídica) possui condições econômicas para pagar a eventual dívida, não há qualquer razoabilidade de se considerar individualmente o patrimônio dos corresponsáveis para esse fim.

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Mais que isso! Como preceitua o artigo 37, caput, da Constituição Federal, a Administração Pública em geral, inclusive a Receita Federal do Brasil, deve também pautar seus atos pelo princípio da eficiência, o que não se coaduna com o arrolamento de bens daquele que possui menor capacidade contributiva para fazer frente a eventual débito fiscal da pessoa jurídica que, nessas circunstâncias, possui todas as condições patrimoniais para a sua quitação.

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Além disso, ao assim agir, é certo também que a Autoridade Fazendária está utilizando o arrolamento de bens e direitos como instrumento de sanção política, ou seja, valendo-se desse legítimo procedimento com o único fim de impor o pagamento de tributos. Afinal, não é difícil imaginar o temor, contratempos e constrangimentos que a pessoa física sofre com o arrolamento de seu patrimônio, gerado por um suposto débito fiscal da pessoa jurídica onde trabalha.

Felizmente, o Judiciário tem socorrido aqueles que vivem tal situação!

*Maucir Fregonesi Junior e Gabriela Miziara Jajah são sócios da área tributária do SiqueiraCastro Advogados

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