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31 anos do ECA: precisamos ouvir mais nossas crianças e adolescentes

Por Marina Helou
Atualização:
Marina Helou. FOTO; DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

No dia 13 de julho celebramos os  31 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente, sem dúvidas um dos marcos mais importantes no país. A proteção e garantia dos direitos de meninos e meninas no Brasil deve ser uma responsabilidade compartilhada entre governos, parlamento e a sociedade de modo geral. E apesar de constituir uma legislação tão significativa, importante e potente, sabemos que o conjunto de garantias ali descritas ainda é uma realidade muito distante na vida de milhares de crianças e adolescentes brasileiras.

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Desde a eclosão da crise sanitária no país e que atualmente se soma à crise política e econômica, novos desafios foram adicionados à agenda de proteção e afirmação de direitos de crianças e adolescentes no Brasil. Somos o país com menos dias de aula letivo no mundo durante a pandemia, o que impacta diretamente na vida das crianças e adolescentes. Assim, além das condições estruturais do racismo, da violência doméstica e de gênero, e da desigualdade social que impacta na efetivação dessas garantias, aparece a evasão escolar, o trabalho infantil, a insegurança alimentar - políticas públicas que o Brasil tinha tido sucesso em avançar e a cada dia apresentam mais retrocessos.

Considerando este cenário e pensando que a violência aparece como um fator constante na vida de meninos e meninas, foi elaborada uma consulta de opinião para adolescentes da Grande São Paulo, provocada pelo Comitê Paulista pela Prevenção de Homicídios na Adolescência, em parceria com a Rede Conhecimento Social e outras organizações sociais. Este processo contou com a participação de 10 adolescentes que se engajaram na elaboração das perguntas e hipóteses da escuta e o questionário foi replicado entre quase 750 jovens. As perguntas transitavam em torno de múltiplas violências, agrupadas em alguns blocos, como violência policial, proteção à mulher, fortalecimento emocional e micro violências cotidianas. A partir das respostas,  pudemos entender um pouco das suas percepções e realidades, mas também às urgências frente à violação de seus direitos.

Elas  e eles afirmam que já presenciaram situações de violência contra adolescentes na internet (92%), na escola (79%), ou na rua onde moram (60%). Este universo de informações ilustra como a exposição à violência está presente em equipamentos e espaços físicos e virtuais. Além disso, 24% dos jovens relataram ter perdido alguém próximo, com menos de 19 anos, por suicídio.

Ao focalizar em aspectos como gênero e LGBTfobia, 25% das adolescentes mulheres e 37% de respondentes que se identificam como LGBTQIA+ disseram terem sofrido violência sexual, revelando que apesar de grave, este tipo de violência afetou um número significativo de adolescentes.

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Quando analisamos as informações a partir do recorte de raça, 36% dos jovens que se declaram pretos dizem que já foram seguidos ou abordados no supermercado, algo que apenas 11% dos respondentes brancos relatam. Sobre o racismo, 57% daqueles que se declararam pretos disseram já terem sofrido com situações deste tipo. Assim, está claro que além do gênero, a raça é também um fator determinante e que atinge de formas distintas meninos e meninas, brancos e não brancos.

É importante apontar que a consulta chama atenção para a importância de se ouvir e dar voz efetiva às crianças e adolescentes, pois além de serem os sujeitos a quem as políticas de prevenção e redução da violência são endereçadas, são os que também trazem alternativas frente a este cenário. Na fase final da consulta, elas e eles mostram que campanhas informativas sobre racismo, igualdade de gênero, mudar o treinamento das forças policiais, criar espaços para adolescentes se reconhecerem e  interagirem são alternativas a serem adotadas para mudar a realidade que vivenciam.

Todos esses dados são fundamentais para ajudar a identificar as diferentes formas de violência e sinalizar, igualmente, alternativas para seu enfrentamento. No entanto, é preciso dar ênfase à urgência de se pautar ações de prevenção e redução dos espaços e dinâmicas de violência aos quais meninos e meninas estão vulneráveis.

Para isso, é importante que  a sociedade, governos e o parlamento invistam em políticas públicas e ações que, além de buscar erradicar essas violações, sejam também propositivas quanto à efetivação do ECA. Tarefas que eram, são e permanecerão como prioridade absoluta se quisermos construir uma sociedade livre de violência de nossos meninos e meninas.

*Marina Helou é deputada estadual pela Rede Sustentabilidade, administradora pública pela Fundação Getúlio Vargas (FGV-EAESP)

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