Pedro Prata
14 de abril de 2022 | 17h33
Viralizou nas redes sociais um vídeo no qual uma entrevistadora do instituto de pesquisas eleitorais Quaest supostamente diz qual seria seu voto nas eleições de 2022. Segundo a Quaest, a mulher foi demitida e as entrevistas, refeitas. O episódio, no entanto, motivou o compartilhamento nas redes sociais de boatos antigos sobre levantamentos de intenção de voto — como o de que as pesquisas nunca se aproximam do resultado das eleições e o de que entrevistadores descartam a opinião de eleitores de direita.
No vídeo em questão, um homem interpela uma mulher e mostra o crachá dela, de entrevistadora da Quaest. Ela afirma que tem “liberdade de expressar” em quem vai votar, sem dizer qual seu candidato. O homem que grava o vídeo diz que, como pesquisadora, ela deveria ser imparcial. A mulher então responde que não estava fazendo entrevistas; o autor da gravação a acusa de não registrar respostas a favor do presidente Jair Bolsonaro (PL) na pesquisa para distorcer o resultado a favor do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Em nota, a Quaest confirmou que a mulher de fato era pesquisadora do instituto. A empresa disse que a entrevistadora foi gravada “fazendo afirmações que não estão de acordo com as normas de isenção e neutralidade que norteiam” suas pesquisas. As cinco entrevistas feitas pela mulher foram descartadas e refeitas no dia seguinte, segundo o instituto. A Quaest também encorajou denúncias de comportamentos semelhantes por meio de sua ouvidoria.
Um youtuber com mais de 832 mil inscritos publicou um segundo vídeo sobre o ocorrido. Além de mostrar a gravação da ex-pesquisadora da Quaest, ele cita conteúdos enganosos antigos sobre pesquisas eleitorais. Por exemplo, diz que entrevistadores já foram flagrados “fazendo pesquisa em porta de presídio” e se “recusando a continuar o questionário” quando o entrevistado “diz ser apoiador da direita ou de Bolsonaro”.
Confira abaixo a checagem das alegações feitas pelo youtuber:
O que diz o youtuber: que a entrevistadora da Quaest começou uma entrevista com um homem em Minas Gerais, mas se recusou a continuar quando ele se disse eleitor de Bolsonaro e passou a falar de Lula.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: o vídeo é verídico, segundo o instituto Quaest. A entrevistadora foi desligada do quadro de funcionários e as cinco pesquisas que ela havia feito foram descartadas.
O vídeo foi gravado em Nova Porteirinha (MG) em 1º de abril. Nele, o autor do vídeo opina que a mulher deveria ser imparcial e sugere que ela é eleitora do ex-presidente Lula: “Petista não sabe o que é isso.” No entanto, ela não declara seu voto em nenhum momento do vídeo.
Além disso, o homem que está gravando pergunta se ela estava conduzindo uma entrevista com outro homem que aparece em seguida e se ela teria encerrado o processo ao ouvir que ele era eleitor de Bolsonaro. Ela nega que tivesse começado a entrevista e justifica que já havia feito “a idade dele” – os institutos pedem uma quantidade específica de entrevistados de cada gênero e idade para representar as estatísticas populacionais de toda a população. O homem então responde: “Não entrevistou, mas tentou colocar na cabeça dele…”
O que diz o youtuber: que os resultados das pesquisas eleitorais “nunca chegaram próximas do resultado final de uma campanha”.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é falso. As pesquisas de intenção de votos chegaram perto do resultado das urnas nas últimas eleições.
Em 2018, o Ibope divulgou uma pesquisa (registro BR-01537/2018) na véspera do primeiro turno que apontava o favoritismo de Bolsonaro, com margem de erro de dois pontos percentuais para mais ou para menos. O instituto apontava que o candidato teria 41% dos votos válidos; Fernando Haddad, 25%; Ciro Gomes, 13%; e Geraldo Alckmin, 8%. Já o instituto Datafolha apontava (com margem de erro de dois pontos percentuais) 40% dos votos válidos para Bolsonaro; Haddad, 25%; Ciro Gomes, 15%; e Alckmin, 8%. Depois de fechadas as urnas do primeiro turno, Bolsonaro teve 46% dos votos válidos; Fernando Haddad, 29%; Ciro Gomes, 12%; e Geraldo Alckmin, 4%.
No segundo turno, a última pesquisa divulgada pelo Ibope apontava Bolsonaro com 54% de intenções de voto e Haddad, 46%. O Datafolha mostrava 55% para Bolsonaro e 45% para Haddad. Após a contagem final, Bolsonaro teve 55% dos votos válidos e Haddad 44%.
Em 2014, o Ibope (pesquisa nº BR-01021/2014) contabilizava, às vésperas da eleição, com margem de erro de dois pontos percentuais, Dilma com 46% dos votos válidos; Aécio Neves, 27%; e Marina Silva, 24%. Já o Datafolha (pesquisa nº BR-01037/2014) apontava, com a mesma margem de erro, Dilma com 44% dos votos válidos; Aécio Neves, 26%; e Marina Silva, 24%. Com a contagem dos votos, Dilma ficou com 41,59% dos votos válidos; Aécio Neves, 33,55%; e Marina Silva, 21,32%.
No segundo turno, o Ibope (pesquisa nº BR-01195/2014) apontava, com margem de erro de dois pontos percentuais, Dilma com 53% dos votos válidos e Aécio com 47%. O Datafolha, por sua vez, mostrava (pesquisa nº BR-01210/2014), com a mesma margem de erro, Dilma com 52% e Aécio Neves com 48%. Após a contagem, Dilma teve 51,64% dos votos válidos e Aécio Neves, 48,36%.
Toda pesquisa eleitoral em ano de eleição deve ser registrada no Tribunal Superior Eleitoral. Você pode conferir todos os levantamentos clicando aqui.
O que diz o youtuber: que uma entrevistadora do Ibope teria sido filmada, em 2018, conduzindo uma pesquisa na porta de um presídio e que isso provaria que a entrevista foi fraudada.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: o jornal Folha de S. Paulo publicou uma reportagem, em 2018, na qual confirmava a veracidade do vídeo — que teria ocorrido com uma entrevistadora do Datafolha. No entanto, o instituto negou que tivesse havido irregularidades na conduta da profissional.
As imagens foram gravadas durante uma pesquisa eleitoral em Corumbaíba (GO). Na filmagem, é possível ouvir a entrevistadora informar que não sabia que estava em frente a um presídio e que abordou uma mulher que passava pelo local. Segundo o jornal, o presídio de Corumbaíba fica em uma avenida com “supermercados, igrejas, agências bancárias e um hospital”, o que garante grande movimentação de pessoas. Este é o tipo de local sugerido pelos institutos de pesquisas para que seus entrevistadores abordem transeuntes.
Ao jornal, o Datafolha negou irregularidades na conduta da mulher. E disse que orienta seus entrevistadores a não permitirem filmagens das entrevistas.
O que diz o youtuber: que entrevistadores de institutos de pesquisa já foram filmados se recusando a continuar uma entrevista quando o entrevistado diz ser apoiador da direita ou de Jair Bolsonaro.
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é enganoso. Em 2018 circularam dois vídeos, desmentidos pela Folha e pela Lupa, no qual homens afirmam que os entrevistadores se recusaram a ouvi-los para a pesquisa. Eles alegam que o motivo para isso seria o fato de eles serem eleitores do presidente Jair Bolsonaro.
O instituto Datafolha disse à Lupa que os entrevistadores possuem uma cota de sexo e idade do eleitorado para cumprir. Isso é feito para melhor representar as estatísticas da população em geral. Por isso, uma pessoa pode não ser ouvida para a pesquisa se não se encaixar no perfil que o entrevistado procura.
Além disso, o instituto ainda reforçou que os pesquisadores não podem entrevistar pessoas que se ofereçam para participar da pesquisa. Isso serve para evitar vieses e desvios no resultado final. O procedimento correto é escolher pessoas de forma aleatória na rua.
O youtuber ainda disse que uma entrevistadora de um instituto de pesquisas já foi filmada respondendo por conta própria um questionário e que isso provaria uma fraude. O Estadão Verifica não conseguiu identificar o conteúdo a que ele se refere.
O youtuber Gustavo Gayer publicou o vídeo sobre pesquisas eleitorais em 3 de abril e obteve 236 mil visualizações desde então. O Estadão Verifica procurou ele por e-mail, mas não obteve resposta até a publicação desta checagem.
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