Vídeo em que entrevistadora responde pergunta sobre intenção de voto sem que eleitor saiba não é de pesquisa registrada no TSE

Situação mostrada em gravação viral não tem qualquer relação com institutos de pesquisa mais tradicionais, como Datafolha e Ipec; registro no Tribunal Superior Eleitoral é necessário para divulgar resultados

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Por Ariel Freitas e Milka Moura
Atualização:

Circula nas redes sociais vídeo em que um homem diz que a entrevistadora de um instituto de pesquisas eleitorais havia preenchido em um formulário eletrônico, sem que ele soubesse, que ele votaria no candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para presidente. A gravação tem mais de 114 mil visualizações no Facebook e tem sido compartilhada com mensagens que suscitam dúvidas sobre a confiança dos levantamentos sobre intenção de voto, que apontam o petista à frente na corrida para a Presidência. A situação mostrada no vídeo, no entanto,  não tem relação com nenhum dos institutos de pesquisa mais tradicionais, como Datafolha e Ipec. A pesquisa em questão sequer é registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) -- condição necessária para divulgação de resultados.

 

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O Estadão Verifica apurou que o caso ocorreu no município de Machadinho D'Oeste, em Rondônia. A empresa responsável pelas entrevistas é a Previsão Pesquisa e Marketing LTDA. No vídeo, uma funcionária aparentemente confusa mostra o celular em que está registrando as respostas. O homem que grava as imagens afirma que não respondeu a nenhuma das perguntas mostradas no aparelho e diz que a mulher preencheu as alternativas sem questioná-lo. O autor do vídeo pede que ela exclua o questionário. "Eu vi a senhora preenchendo sozinha, a senhora não me perguntou nada!", diz ele.

A Previsão Pesquisa e Marketing Ltda não tem nenhuma pesquisa registrada no Sistema de Registro de Pesquisas Eleitorais (PesqEle), do TSE. A plataforma reúne informações sobre contratantes, verba, municípios, metodologia e questionários utilizados. De acordo com resolução do TSE, todas as empresas que realizam pesquisas e desejam divulgá-las ao público devem cadastrá-las no sistema. 

Em contato com o Estadão Verifica, a Previsão Pesquisa e Marketing LTDA informou que o episódio que aparece na filmagem ocorreu na última semana. O diretor executivo da empresa, Sebastião do Valle, disse que o levantamento em questão não era para divulgação, e sim para consumo interno, com foco estadual. Ele afirmou que todas as equipes sempre saem a campo acompanhadas e que os pesquisadores são treinados antes do trabalho. Valle afirma que o questionário é sempre discutido e explicado. 

No vídeo, a funcionária diz que é a primeira vez que ela faz uma pesquisa e afirma não ter sido treinada a usar o celular utilizado para registrar as respostas. Valle afirmou acreditar que a mulher tenha ficado nervosa. "Essa pesquisadora só tinha feito quatro ou cinco entrevistas, então o procedimento que nós adotamos foi afastar a entrevistadora da coleta", afirmou. "Os questionários feitos por ela foram desprezados, foram deletados do sistema e não entram no cômputo geral". 

A Previsão Pesquisa e Marketing LTDA está registrada como apta a atuar no Conselho Regional de Estatística da 7ª Região (CONRE-7), que atende os estados do Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia e Roraima. O registro é válido até o dia 31 de março de 2023. 

Caso não se aplica aos demais institutos de pesquisa

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É enganoso afirmar que a situação do vídeo é semelhante ao processo dos institutos de pesquisa eleitorais. O Estadão Verifica entrou em contato com as principais organizações que realizam pesquisas no País. O Ipec (o antigo Ibope) afirmou que nas entrevistas presenciais os pesquisadores não mostram fotos de candidatos, como aparece no vídeo. O entrevistador apresenta um disco padrão com os nomes dos candidatos -- é possível acessar o questionário no PesqEle. "Nossos pesquisadores, além de treinados, ao contrário dessa pesquisadora, não usavam celular com aplicativo. Eles usam um tablet preparado só para as pesquisas. Todas as entrevistas são gravadas e checadas", esclareceu o Ipec.

O instituto Datafolha informou ao Estadão Verifica que suas pesquisas presenciais são feitas em pontos de fluxo nas cidades brasileiras. Além disso, todos os levantamentos são registrados no TSE, onde também é informado o método de coleta.

A Quaest não quis comentar. Em nota, o TSE informou que não se manifesta sobre casos que podem se tornar objeto de análise da Corte Eleitoral. 

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Ataques frequentes aos institutos preocupam a Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa

Para a Associação Brasileiras de Empresas de Pesquisa (ABEP), os últimos ciclos eleitorais trouxeram grandes desafios para os profissionais que buscam democratizar o acesso à informação nesse período de captação de votos.  Segundo o presidente Duilio Novaes, os ataques frequentes a funcionários de empresas e institutos focados em pesquisa é uma afronta à liberdade de expressão e à democracia. "A internet proliferou o ataque aos institutos de pesquisa, que realizam um trabalho fundamental de acesso à informação para a população brasileira, um mecanismo importante para a democracia", comentou.

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