Notícia falsa gera ameaças contra organização jesuíta que atende refugiados venezuelanos

Vídeo viral afirma que atendimento jurídico era 'lição' sobre como 'invadir a casa dos brasileiros'

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Por Alessandra Monnerat e Caio Sartori
Atualização:
Venezuelanos chegam caminhando àcidade de Pacaraima (RR), na fronteira do Brasil com a Venezuela, em 16 de março Foto: Edmar Barros/Futura Press

Uma notícia falsa gerou ameaças de morte e linchamento virtual contra um integrante de uma organização jesuíta que atende refugiados em Boa Vista, Roraima. Por meio do WhatsApp do Estadão Verifica -- (11) 99263-7900 --, leitores enviaram um vídeo que mostra orientações jurídicas para a desocupação de um grupo de venezuelanos de um imóvel. No entanto, a filmagem foi compartilhada como uma "lição" sobre como "invadir a casa dos brasileiros". No Facebook, uma das postagens do filme teve mais de 580 mil visualizações em pouco menos de 24 horas.

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De acordo com o Serviço Jesuíta a Migrantes e Refugiados (SJMR), a gravação foi feita após a desocupação de uma pousada na capital roraimense que, segundo a organização, estava abandonada. A assessoria de imprensa da entidade informou que o que é visto no vídeo não é um incentivo à invasão de propriedades brasileiras, e sim a orientação sobre o processo legal de desocupação. O SJMR afirma que os venezuelanos estavam no imóvel há quatro meses.

Na filmagem, um representante da ONG afirma que os ocupantes não podem ser retirados pela Polícia Militar. O homem, que é advogado registrado na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de São Paulo, explica que é necessária uma ordem judicial para expulsar os invasores do local.

"Entendemos que as entidades responsáveis pela realização da reintegração de posse são públicas e respondem à decisão de um juiz de Direito. Qualquer outra forma de intervenção forçada frente a estas populações é arbitrariamente constituição de crime, desrespeito às leis republicanas e aos princípios fundantes do Estado Democrático de Direito",  afirma uma nota do SJMR.

O presidente da OAB de Roraima, Rodolpho Morais, disse em entrevista ao jornal local Folha de Boa Vista que o advogado será submetido ao Conselho de Ética da instituição. "Nós não temos como julgar se a orientação dele foi certa ou errada, uma vez que a investigação ainda será aberta, por meio de um ofício, para que haja esclarecimento. Ele terá direito de recorrer ou entrar com recurso", disse.

Integrante de ONG jesuíta recebeu ameaças de morte

Após a publicação do vídeo, o perfil pessoal, o número de telefone e a inscrição da OAB do advogado do SJMR foram vazadas com xingamentos. De acordo com a instituição, também foram enviadas ameaças de morte. A página "Roraima Sem Censura" escreveu que o representante da organização foi "diagnosticado pela psiquiatria como psicopata" e "veio para o Estado de Roraima formar quadrilha e implantar o terror às famílias brasileiras de bem".

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O proprietário da página, Ezequiel Calegari, publicou um vídeo em que ele entra na sede da organização jesuíta e desfere ofensas aos funcionários do local. A gravação teve 110 mil visualizações em pouco mais de um dia. Candidato a deputado estadual pelo partido Patriota, Calegari disse acreditar que a ONG de fato estava incentivando invasões de terra. Perguntado se sabia da veracidade das acusações contra o representante do SJMR, afirmou: "Eu não sei, eu publico as coisas pra agradar meus eleitores".

A Cáritas Brasileira, organismo da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) publicou uma nota em apoio ao SJMR, destacando que a entidade foi fundada em 1980 e tem capítulos em cerca de 50 países. No Brasil, há escritórios em Belo Horizonte, Porto Alegre e Boa Vista -- este último, inaugurado em 2017.

Veja uma públicação com a notícia falsa abaixo:

https://www.facebook.com/arcanjo.miguel.31542/posts/985376158310060

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