Justiça: quando e como usá-la

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Por crespoangela
Atualização:

Texto de Andréia Fernandes

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Qualquer consumidor que já teve algum problema com alguma compra ou prestação de serviço conhece o caminho das pedras: reclamar à empresa, enviando a queixa por escrito ou a registrando no SAC. Se o problema persistir, recorre-se ao Procon ou a outro órgão de defesa do consumidor. E, se nada disso funcionar, resta o Poder Judiciário. É neste momento que surgem as dúvidas: quando e como é possível acessar a Justiça? Custa caro? Demora?

"Cada caso é um caso. É preciso saber quais são os reais direitos antes de encaminhar a questão à Justiça. Vale consultar um advogado de confiança ou um órgão de defesa do consumidor", aconselha o advogado Antônio André Donato, especialista em direitos do consumidor. "E é também por meio de uma avaliação profissional do problema que se define de que forma ingressar com a ação", completa.

Simples e ágeis

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O Juizado Especial Cível - o antigo Pequenas Causas - é o caminho mais rápido e eficiente para resolver pendências judiciais mais simples. "A maioria das causas que entram aqui, cerca de 70%, envolvem questões de consumo", afirma a juíza Mônica de Carvalho, diretora do Juizado Central da Capital.

Uma das principais vantagens desses juizados é que, para ações de até 20 salários mínimos, não é preciso contratar advogado. "Para dar entrada na ação é simples. A pessoa que não estiver familiarizada com processos judiciais deve ir a um dos postos munida apenas de seu RG e submeter-se a uma 'triagem'. Um funcionário analisa o caso e já prepara a petição inicial - a abertura do processo", explica Mônica. Para causas de 20 a 40 salários mínimos, no entanto, a pessoa deve ir obrigatoriamente acompanhada por um profissional.

No mesmo dia em que ingressa com a ação, o autor é informado sobre quais documentos deve providenciar e se há necessidade de testemunhas. "Ele também já toma conhecimento da data de audiência de conciliação com a empresa. Esta audiência tem a função de dar uma última possibilidade de solução amigável. Se não há acordo, é agendado o julgamento", explica a juíza.

Os Juizados Especiais Cíveis foram criados para resolver problemas em, no máximo, três meses. Atualmente, porém, leva-se até um ano entre a abertura do processo e o dia do julgamento. "Já fomos bem mais ágeis, mas podemos dizer que somos vítimas de nosso próprio sucesso. A demanda é crescente - só o posto central recebe cerca de 150 novas ações todos os dias", afirma Mônica.

Complexidade

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Casos mais complexos, que demandam maior perícia ou cujo valor ultrapasse o teto de 40 salários mínimos dos Juizados Especiais Cíveis, devem ser encaminhados à Justiça comum. "O primeiro passo é contratar um advogado de confiança, que seja honesto quanto à possibilidade de sucesso da ação. Quando decide ingressar com um processo, o consumidor deve estar ciente de que o caminho será longo, podendo se estender por até mais de uma década. Precisa estar disposto a enfrentar a resistência da empresa, que geralmente leva o caso até a última instância", explica o advogado Antônio André Donato.

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O consumidor Edson Pereira da Silva, cliente de Donato, é prova da persistência necessária nesses casos. Recentemente, ele saiu vitorioso de uma ação de quase dez anos contra a montadora de automóveis General Motors. O caso chama atenção: Silva pleiteou indenização da empresa por ter comprado um carro cujo estofamento causava choques elétricos.

"Era uma causa difícil e inédita, que poderia ser julgada improcedente", diz Donato. O fator decisivo foi a preparação das provas: o consumidor documentou, por escrito, todas as reclamações que fez sobre o problema na concessionária onde havia comprado o veículo - e exigiu também respostas formais da empresa. Em um dos retornos, a GM admitiu que seus carros poderiam produzir choques elétricos. Na carta, a única solução oferecida pela empresa foi que Silva deixasse de usar roupas feitas em determinados tecidos quando fosse dirigir. "Quando recebi essa resposta, decidi entrar com a ação. Foi uma questão de princípio", diz Silva.

No processo, o consumidor sustentou que a empresa tem responsabilidade porque não prestou informações adequadas. Para ele, a GM sabia das descargas elétricas que o veículo poderia provocar. Silva perdeu a causa em primeira instância, mas persistiu. Depois de vários recursos, finalmente a Justiça acatou seu pedido e obrigou a montadora a pagar o ressarcimento do valor do carro e uma indenização por danos morais. Em contato com a reportagem, a GM afirmou que não comenta decisões judiciais. "O desfecho comprova a importância de o consumidor sempre se preocupar em registrar suas queixas. Imprimir e-mails, guardar anúncios publicitários. É preciso que a causa esteja bastante caracterizada, clara. Caso contrário, não vale o esforço", finaliza Donato.

Ação coletiva: ato de cidadania

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Outro caminho para o consumidor valer-se da Justiça para garantir seus direitos são as ações civis públicas, que ganharam força com a promulgação do Código de Defesa do Consumidor (CDC), há 16 anos. A lei define quem pode mover estas ações (Ministério Público, União, Estados, municípios, entidades da Administração Pública ou órgãos de defesa do consumidor) e estabelece que direitos ou interesses podem ser defendidos por elas.

O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) é uma das entidades privadas que estão autorizadas a mover ações coletivas. "Elas nascem das reclamações que recebemos dos próprios consumidores. Se muitos nos procuram para queixar-se, por exemplo, de uma cláusula abusiva de contrato de plano de saúde, podemos ingressar na Justiça para exigir a nulidade desta norma nos contratos de todos os clientes da empresa", explica Paulo Pacini, advogado do Idec.

Pacini ressalta que a ação coletiva não impede que o consumidor mova um processo individual. "Se ele quiser pleitear uma indenização por dano moral ou material, ele pode, paralelamente, ingressar com sua própria ação."

Para o advogado, as ações civis públicas são uma conquista do consumidor porque visam ao bem comum da sociedade. "Não são só as pessoas envolvidas em determinada ação que saem beneficiadas. Quem, posteriormente, descobrir-se lesado pelo mesmo motivo, pode valer-se da mesma decisão judicial para exigir seu direito." Foi o que ocorreu com uma das ações mais famosas movidas pelo Idec: a que visa à recuperação das perdas do Plano Verão, do então presidente José Sarney, de janeiro de 1989. Após a reivindicação do Idec, a Justiça tem reconhecido o direito à devolução da remuneração não creditada naquela época para todos os consumidores lesados.

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