Zulaiê Cobra deixa o PSDB com pesadas críticas ao partido

Ex-deputada diz que legenda não faz oposição a Lula e critica Serra

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Por Agencia Estado
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Deputada federal por três mandatos consecutivos, hoje sem cargo público, Zulaiê Cobra Ribeiro entregou sua carta de desligamento do PSDB, legenda que ajudou a fundar. Ela disse não se conformar com o novo posicionamento do partido, que em sua opinião não consegue fazer oposição ao governo Lula. "A impressão que eu tenho é que viraram um tapete para o Lula pisar quando sai do Palácio (do Planalto). Isso não é oposição." Zulaiê critica a posição do governador José Serra, que diz ser "adido de Lula" e guiado apenas por projeto pessoal de ser presidente da República, e também do governador mineiro, Aécio Neves. "Essas duas maiores vozes, que poderiam ser oposição, são hoje extensão do governo Lula". Também alfineta o presidente do PSDB, Tasso Jereissati, e Fernando Henrique Cardoso. Pré-candidata em várias eleições, afirmou que ser "pré-candidata é uma desgraça?, pois sempre abriu mão de seus objetivos em prol do que seria melhor para o PSDB, e que nunca teve espaço na legenda, a não ser o aberto com seu próprio esforço. Ela avisa que se nada for feito perante essa situação, muita gente deve deixar a agremiação, mas não cita nomes. Veja abaixo principais trechos dessa entrevista ao Estado: Estado - Quais as razões de sua saída doPSDB? São dois os fatores. O primeiro é que estamos nos distanciando do PSDB formado há 18 anos atrás. O PSDB está perdendo sua identidade. Se faz uma oposição sem muito rumo. Estado - O que a senhora julga ser oposição? É para fazer o quê? Eu queria fazer uma coisa mais radical aos escândalos que o governo federal vem passando. É preciso denunciar, falar o que está acontecendo. Mas o PSDB está tendo uma atitude contemplativa. Estado - Não deu certo o que os tucanos fizeram? Só confundiu a população. O povo me pára nas ruas para saber o que está acontecendo com o PSDB. Querem saber o que o partido está fazendo. Eu acho que as ações do partido são muito frágeis. Estado - Isso vem desde a derrota nas eleições para presidente em 2006? Não, vem desde o primeiro mandato do atual presidente da República. Na eleição de 2006 complicou ainda mais. O discurso do Geraldo (Alckmin, candidato derrotado por Lula) mudou muito. Quais eram os planos do PSDB? Eu não sei. Estado - Qual a força do partido hoje? Politicamente o PSDB enfraqueceu muito. Estado - A senhora tem contato com o governador José Serra? Não tenho contato com o Serra. Ele não me liga, não se conversa com ele. Estamos distantes do governo Serra. Há muitos militantes descontentes. Estado - Há outros covistas, como a senhora, que podem deixar o partido? Quem são? Tem muita gente descontente. Não vou falar em nome de ninguém e nem citar ninguém. Mas há muitas pessoas que podem deixar o PSDB se as coisas não mudarem. Estado - E o que leva a esse descontentamento todo? Há um fluxo de águas não muito transparentes. Está difícil de trabalhar nossos ideais. Encontramos muitas dificuldades. Me sinto desanimada. O próprio Mário Covas dizia que o PSDB não foi criado para pulsar nas ruas. E os partido está muito distante das ruas hoje. O povo não acredita mais no PSDB. Estado - A senhora disse que eram duas as razões de sua saída do partido. Qual é a segunda? A primeira é essa desfiguração do partido. A segunda é a falta de oportunidade. Estado - Falta espaço para a senhora dentro do partido? Desde 1996 tento ser candidata a um cargo majoritário. Fui pré-candidata em várias oportunidades. Tentei a Prefeitura de São Paulo em 1996 e 2004. Tentei ser candidata ao Senado em 2002 e 2006. Tinha condições de ganhar. Havia pesquisas que mostravam isso. Em 1990 fui candidata a vice-governadora na chapa encabeçada por Mário Covas. Mas sempre tive de disputar com alguém dentro do partido. Sempre lutei para ser candidata ao Senado. Todos em São Paulo sabem disso. Percorri todos os diretórios do Estado. Falei com todo mundo. Mas cinco dias antes da convenção do partido foi feito acordo. O Serra me chamou e falou que a vaga era do (Guilherme) Afif (do DEM, ex-PFL). Estado - Isso lhe deixou magoada? Esse negócio de ser pré-candidata é uma desgraça. Sempre abri mão para fazer o melhor para o partido. Nos últimos 18 anos fui pré-candidata no mínimo seis vezes. Sou a única mulher do conselho político do partido. Tenho uma vida inteira dedicada ao PSDB. Estado - A senhora entende que há uma disputa interna dentro do partido entre uma ala ligada ao governador José Serra e outra ligada ao ex-governador Geraldo Alckmin, que dificulta as ações do partido? Há um pouco de disputa entre Serra e Alckmin. Mas também há a ação do presidente Tasso Jereissati, a disputa entre o governador (de Minas) Aécio (Neves) e Serra, com vistas à eleição de 2010 para presidente. Estado - O que se deve fazer então? A visita do Tasso ao presidente da República. (No partido) Não querem que eu fale a respeito. Mas não foi vista com bons olhos. A impressão que eu tenho é que viraram um tapete para o Lula pisar quando sai do Palácio (do Planalto). Isso não é oposição. Estado - O que irrita os descontentes do PSDB? Irrita esse apoio, em São Paulo, ao prefeito Kassab. Ele diz que não concorrerá à reeleição. Mas acho que vai. Irrita a posição do Jutahy (Júnior, ex-líder do partido na Câmara), que declarou apoio à candidatura de Arlindo Chinaglia (PT). A gente não pode ter um líder que anuncia seu voto e pede votos para um petista. Irrita também a reunião do Tasso (Jereissati) com o presidente da República. E na saída ele (Tasso) diz que é preciso fazer oposição consciente. O que ele quer? Estado - E os encontros de Serra com Lula? Foi manchete do Estado o acordo entre os dois (Lula e Serra). Os dois maiores representantes do PSDB em governos estaduais jogam hoje junto com Lula. O Serra quer ser candidato de qualquer jeito. Dizem que o Aécio pode ser candidato pelas mãos de Lula. Essas duas maiores vozes, que poderiam ser oposição, são hoje extensão do governo Lula. Estado - E qual a posição do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso diante de tudo isso? O Fernando Henrique ficou muito distante do partido. Mas ainda é uma voz que deixa a gente entusiasmada. Ele está enfrentando melhor essa questão de oposição. Mas sinto que tem receio de falar alguma coisa. O Fernando Henrique está travado. Estado - Antes, em algum momento da sua carreira, já lhe passou a idéia de deixar o PSDB? Não podia acreditar que teria de sair do PSDB. Estado - Falta espaço para a senhora dentro do partido? Nunca tive espaço no PSDB. O que consegui foi pelo meu próprio esforço. Estado - A senhora entende que o partido, hoje, é comandado apenas por uma cabeça: a de José Serra? O partido está nas mãos do Serra. Ele tem as bancadas federal e estadual. Estado - Isso dificulta as ações dos outros integrantes? Ele (Serra) age como um adido do Lula. Não está preocupado em ser rolo compressor. Está preocupado em fazer um governo que seja o melhor governo que São Paulo já teve, de olho na disputa presidencial em 2010. Estado - Na eleição do ano que vem, para prefeito, o PSDB vai de Geraldo Alckmin? A situação do Geraldo é difícil, embora ele tenha votos. Conversei com ele no final de março. A situação é delicada. Ele me disse que não quer sair para prefeito. Mas acho que deve ser o candidato. As pesquisas vão mostrar isso. Estado - Qual o projeto do PSDB e de Serra para o futuro? É um projeto único, de uma pessoa só. Todos nós no partido não fazemos parte desse projeto. Fazemos a campanha (de Serra), mas não fazemos parte do projeto dele (de ser presidente da República). Estado - A senhora conversou com os cardeais do partido para falar da sua saída? Só o Geraldo me procurou. O Fernando Henrique eu não consegui. O Tasso também não. Estado - Está saindo magoada? Saio sem mágoas. Mas é uma atitude dolorosa, difícil. Estado - O que precisa ser feito para mudar essa situação, na sua opinião? Se os deputados começarem a discutir essas questões (de uma única pessoa mandar), alguma coisa pode acontecer lá na frente. É preciso por os pingos nos is. Eu comecei a levantar a bandeira. Sou vista como radical. Mas faço as críticas para melhorar. É preciso ter atitude própria de partido de oposição. Serra e Aécio precisam levantar uma bandeira diferente do que esta, que é a bandeira do Lula, do PT. Estado - Para qual partido a senhora vai agora? Recebei apoio de alguém? Acho que só posso ir para algum partido pequeno. PFL (DEM), nem pensar. Eu estou pensando. O Martus Tavares (ex-ministro do Planejamento de FHC) me encontrou num restaurante e disse que estou certa, que é preciso ter um partido realmente de oposição. Me disse que se eu formar um partido assim, ele me acompanha. Estado - O PSDB foi ingrato com a senhora? O PSDB faz isso com todo mundo.

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