BRASÍLIA - É preciso promover ajustes na Constituição, mas essa é uma tarefa muito difícil de ser cumprida com o presidencialismo de coalizão existente no País, avaliou o presidente do Sebrae, Guilherme Afif Domingos, que foi deputado constituinte. "Não acredito que o presidente tenha condições políticas, com esse Congresso de 'toma lá, dá cá', de fazer as reformas que se quer no País", afirmou.
O Estado inicia uma série de reportagens sobre os desafios de reconstrução do País. Hoje, ela aborda a necessidade de ajustar as contas públicas e mostra como a Constituição de 1988 está na raiz de boa parte dos problemas enfrentados atualmente.
Para Afif, o presidente Michel Temer deveria começar pela reforma política. "Com isso, ele iria ao encontro das ruas, e não de encontro às ruas", avaliou. Ao mudar a forma como se elege o Congresso Nacional, o governo estaria em linha com o sentimento presente nas manifestações de rua, que "esses políticos não me representam", e criaria um ambiente melhor para alterar pontos da Carta. "Se ele não fizer essa conexão com as ruas, a crise vai consumir o governo", alertou.
Uma forma de iniciar essa discussão seria desengavetar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que o próprio Temer relatou, em 2004. De autoria do então deputado Luiz Carlos Santos (PMDB), ela previa uma revisão constitucional. A proposta seria elaborada por uma comissão a ser indicada pelo Congresso. O texto seria aprovado por maioria, em votação unicameral em dois turnos.
Afif contou que, ainda na Constituinte, ajudou a aprovar um dispositivo que previa uma revisão do texto constitucional cinco anos após sua promulgação. Justamente para fazer uma reflexão e ajustar o que fosse necessário. O prazo permitia que esse trabalho fosse feito após a realização das primeiras eleições diretas após a ditadura militar. Porém, a revisão ocorreu logo após o impeachment de Fernando Collor.
Num ambiente político traumatizado pelo processo, não houve clima para aprovar mudanças profundas na Constituição. "Todo mundo ficou com medo", comentou. Dessa forma, perdeu-se a oportunidade de fazer ajustes que, na época, já se mostravam necessários.