Supremo prepara fase mais voltada à Constituição

Com aval de Barbosa, que anunciou aposentadoria para junho deste ano, pauta prioriza casos de repercussão e de inconstitucionalidade

Por Felipe Recondo
Atualização:

Brasília - A decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, de se aposentar no fim de junho coincide com o início de uma nova etapa da Corte, chancelada pelo próprio ministro. Se sob sua gestão o STF ganhou os holofotes e foi decisivo para romper o manto da impunidade que protegia políticos poderosos, a próxima fase marca a retomada da vocação de guardião da Constituição.

Ministros ouvidos pela reportagem acreditam que a recente decisão de remeter para as turmas de julgamento os inquéritos e ações penais contra autoridades será o motivo principal para essa mudança. A medida tende a desobstruir a pauta de julgamentos do plenário do Supremo e abre espaço para os temas “nobres”, como processos de repercussão geral e ações diretas de inconstitucionalidade.

ED1405292050 BSB 29/05/14 NACIONAL BARBOSA/DESPEDIDA O presidente do STF, Joaquim Barbosa, ao lado do presidente da Camara, Henrique Alves, durante encontro no Congresso. Barbosa anunciou sua aposentadoria durante essa visita de despedida.FOTO ED FERREIRA/ESTADAO Foto: Ed Ferreira/Estadão

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Por essa visão, o caso do mensalão funcionou como estágio necessário à “evolução” da Corte. O processo foi aberto em 2007, levado para julgamento no plenário em 2012 e ainda hoje tem pendências a serem resolvidas pelos ministros, como o direito ao trabalho externo dos condenados ao regime semiaberto, barrado em decisões monocráticas de Barbosa nas últimas semanas.

Apesar disso, a sentença à prisão de um ex-ministro (José Dirceu), ex-deputados (Roberto Jefferson e Valdemar Costa Neto, entre outros) e ex-dirigentes partidários (José Genoino e Delúbio Soares) fortaleceu o Supremo como “tribunal penal” que ajudou a expiar a imagem de que a Justiça só atingiria os desprovidos de dinheiro e proteção política. Novo rito. Antes de decidir julgar políticos com foro privilegiado nas turmas, o Supremo adotava a prática de reservar uma das duas sessões semanais do plenário para o julgamento de inquéritos e ações penais, em razão das especificidades dos processos criminais e dos riscos de prescrição. Hoje, existem mais de 500 inquéritos em tramitação e 99 ações penais na fila. O STF continuará tendo de correr contra o tempo para julgar esses casos, mas a partir das próximas semanas os processos serão discutidos sem transmissão ao vivo e com a participação de 5 dos 11 ministros. As sessões das turmas não são exibidas pela TV Justiça. Como consequência, os julgamentos são mais rápidos, os ministros resumem seus votos e flexibilizam a ritualística que caracteriza as sessões plenárias. Dentre os atuais integrantes e defensores da alteração, há quem diga que o julgamento do mensalão teria levado metade do tempo caso não fosse transmitido ao vivo para todo o País. A prioridade agora, mudança chancelada pelo próprio Barbosa, é justamente reservar a pauta do STF para os temas mais “nobres”, ligados à Constituição. O problema principal a ser resolvido hoje na Corte é o congestionamento de processos com repercussão geral reconhecida. Do julgamento desses 750 assuntos escolhidos pelos ministros - cuja solução irradiará sobre todas as instâncias - dependem mais de 150 mil ações em tramitação em outros tribunais, paralisados à espera da manifestação do STF. Em seguida, a prioridade passa a ser o julgamento de processos de inconstitucionalidade. Hoje, cerca de 1.800 ações em tramitação no Supremo contestam leis federais e estaduais, sob alegação de incompatibilidade com a Carta. Como guardião da Constituição, o Supremo deveria ter como tarefa primordial analisar essas ações. ‘Menos nobres’. Os ministros vinham alterando o regimento para tirar do plenários assuntos “menos nobres”, sem relação direta com a constitucionalidade de leis. Pouco depois de julgado o pedido de extradição do ex-ativista italiano Cesare Battisti, condenado à prisão perpétua na Itália que recebeu em 2010 asilo político do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, os ministros remeteram demais casos análogos para as turmas. Na mesma decisão que transferiu os processos criminais para as turmas, o tribunal eliminou a competência do plenário para julgar as centenas de ações ajuizadas no tribunal contra atos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Os habeas corpus - aproximadamente 2.400 aguardam julgamento - já tramitam nas turmas. 

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