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Suíça quer transferir ao Brasil processo contra suspeitos do cartel de trens em SP

Medida permite que detalhes bancários de envolvidos sejam revelados e promotores avancem nas investigações sobre irregularidades em contratos firmados com governos do PSDB

Por Jamil Chade e correspondente
Atualização:

Atualizado às 14h40

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GENEBRA - O Ministério Público da Suíça quer transferir ao Brasil todos os processos de investigações criminais que existem contra os suspeitos no caso do cartel dos trens de São Paulo, o que significa que a Justiça brasileira receberá os detalhes de todas as contas do envolvidos e que hoje estão bloqueadas. O trâmite pode ocorrer nos primeiros meses de 2015, depois de receber um sinal verde do Ministério da Justiça em Berna.

A informação foi dada a uma delegação de procuradores e promotores brasileiros que, nesta semana, estiveram em Berna para trocar informações sobre o caso envolvendo as empresas Alstom e Siemens e funcionários públicos nacionais. Nesta quinta-feira, a Polícia Federal indiciou 33 pessoas suspeitas de envolvimento no cartel do setor metroferroviário que operou em São Paulo entre 1998 e 2008, nos governos de Márcio Covas, José Serra e Geraldo Alckmin, todos do PSDB. Entre os indiciados está o atual presidente da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), Mário Bandeira.

PF abriu inquérito em 2008 para investigar ação do cartel no setor de trens e metrôs de SP Foto: Daniel Teixeira/Estadão - 29.03.2012

Caso sejam dadas ao Brasil, as informações permitirão que o Ministério Público brasileiro e promotores paulistas possam aprofundar as investigações contra João Roberto Zaniboni, ex-diretor da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), contra o lobista Arthur Teixeira e o também ex-diretor da CPTM, Ademir Venâncio de Araújo, que detém cinco contas na Suíça com um montante bloqueado de US$ 1,2 milhão.

Os três são considerados peças fundamentais para entender de que forma as multinacionais Alstom e Siemens operavam para garantir contratos. Outro foco do processo é o ex-juiz do Tribunal de Contas, Robson Marinho.

Na Suíça, eles estavam sendo investigados por lavagem de dinheiro e todas suas contas haviam sido bloqueadas.

A decisão der Berna de transferir os casos ao Brasil ocorreu depois de avaliar que teriam sérias limitações no caso. Mesmo que os condenassem, os suíços não conseguiriam que o Brasil os extraditasse. Pela Constituição, a Justiça não autorizaria a extradição de um nacional.

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Agora, com a transferência, todos os extratos bancários e todas as informações seriam também entregues. "Esse é o cenário de pesadelo para os suspeitos", disse Silvio Marques, promotor paulista que fez parte da delegação.

Passos. Para que seja concretizada, a transferência do processo ainda precisa passar pelo Ministério da Justiça na Suíça para uma decisão final e de acordo com tratados internacionais.

Aos representantes brasileiros, os suíços insistiram que a decisão ainda depende de uma chancela do governo. Mas em Berna fontes já dão o procedimento como uma certeza e que aguardaria apenas um trâmite burocrático que ocorreria nos próximos meses.

Uma vez aprovada em Berna, a transferência envolveria ainda uma pergunta formal ao Brasil se existe o interesse e quem ficaria responsável.

A pessoa indicada seria o procurador da República, Rodrigo de Grandis, que admite que a iniciativa pode abrir "novas portas" para a investigação no Brasil. Segundo ele, há sim o interesse em receber o processo.

No caso das contas do ex-prefeito Paulo Maluf no exterior, o STF chegou a pedir a Luxemburgo, França e Jersey que os processos fossem transferidos ao Brasil. Mas isso não acabou ocorrendo.

Condições. De Grandis apontou que os suíços não colocaram condições para a transferência do caso e apenas terão o direito de questionar como está o andamento do processo no Brasil.

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Mas, entre os suíços, a percepção é de que essa transferência poderia ter ocorrido há anos se não fosse pela lentidão da investigação no Brasil.

Num esforço de demonstrar que existe uma cooperação, um dia antes da reunião de Berna, a Polícia Federal fez busca na residência e no escritório de Zaniboni, no que foi uma operação executada justamente a pedido do Ministério Público da Suíça ainda em 2011 e jamais realizada. Berna abriu investigação sobre a origem os mais de US$ 826 mil que Zaniboni manteve depositado em Zurique. O ex-diretor garante que o dinheiro foi resultado de uma consultoria que prestou.

Nesta semana, a Polícia Federal indiciou 33 pessoas no caso do cartel dos trens. Quando retornar ao Brasil, na semana que vem, De Grandis vai avaliar o informe preparado pela PF e decidir como incorporar as informações dos suíços. "Vamos avaliar qual é a melhor estratégia", disse. Para ele, os extratos bancários e documentos dos suíços "certamente" vão além da apuração realizada até hoje no Brasil desde o início do caso.

Há meses os brasileiros vinham pedindo para que as informações sobre as contas desses suspeitos e, até agora, Berna tinha evitado abrir seus arquivos. Hoje, porém, fontes do MP suíço confirmaram ao Estado que o acesso aos detalhes das contas já bloqueadas foi garantido aos brasileiros.

Os suíços haviam concluído o caso que existia contra a Alstom, depois que a multinacional pagou uma multa milionária e encerrou o processo em Berna. Mas, agora, as suspeitas são contra brasileiros que teriam usado o sistema bancário suíço para lavar dinheiro fruto dessa corrupção.

O que chama a atenção dos suíços é que parte do dinheiro foi depositado por Arthur Teixeira, apontando pela PF aponta como o pagador de propinas do cartel de trens. Dados bancários de posse dos suíços revelam de fato o nome de Teixeira.