Rescisão de delação não invalida prova, diz Raquel Dodge

Em sua primeira entrevista coletiva, procuradora-geral da República é questionada sobre colaboração premiada da J&F e afirma que ‘a lei é clara’

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Por Beatriz Bulla e Fábio Fabrini
Atualização:

BRASÍLIA - A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, disse nesta terça-feira, 26, em sua primeira entrevista desde que assumiu o cargo no dia 18, que “a lei é clara” ao estabelecer que provas produzidas em delação premiada são válidas mesmo quando o acordo é rompido. Ao falar sobre a Operação Lava Jato, ela afirmou que o momento atual é de “estudo” das colaborações que foram assinadas na gestão de seu antecessor, Rodrigo Janot, como a do Grupo J&F. 

“A lei é clara no sentido de que a rescisão do acordo não invalida a prova produzida no âmbito da delação premiada”, afirmou. Porém, ao ser questionada sobre possível ilegalidade no caso J&F por interferência de integrante do MP em favor dos delatores, Raquel disse que há diferença entre casos de rescisão e de nulidade do acordo. 

A procuradora-geral da Republica, Raquel Dodge Foto: DIDA SAMPAIO/ESTADÃO

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“Do ponto de vista jurídico há diferença entre rescisão e nulidade desse instrumento. A questão será analisada no momento oportuno considerando essas duas possibilidades jurídicas. No momento não posso adiantar nenhum raciocínio sobre isso”, disse Raquel. Pelo entendimento legal, a nulidade pode levar ao não aproveitamento das provas da delação.

O empresário Joesley Batista e o executivo Ricardo Saud, delatores do grupo, tiveram seus acordos rescindidos por Janot. O ex-procurador-geral avaliou que os dois omitiram do Ministério Público informações que deveriam ter sido prestadas. Com argumento de que as provas produzidas pelos delatores continuavam válidas, Janot utilizou as informações da colaboração na denúncia apresentada contra o presidente Michel Temer por obstrução da Justiça e organização criminosa. 

Denúncia. Raquel disse que dará continuidade à denúncia contra Temer se a Câmara autorizar o processamento da acusação. Nas palavras de Raquel, se a denúncia for aceita pelos deputados e recebida pelo Supremo Tribunal Federal, “deverá ter continuidade porque a ação penal pública é indisponível, não pode nenhum procurador voltar atrás”.

“Estamos conhecendo o conteúdo dessas delações e compreendendo a validade delas”, disse. Ela apontou que sua equipe não teve acesso a nenhum dos documentos sigilosos da Lava Jato antes de sua posse, que ocorreu em 18 de setembro. “Nesses dias minha equipe e eu temos trabalhado mais de 12 horas por dia nos inteirando de todos os documentos que existem”, afirmou. 

A procuradora-geral não adiantou se vai abrir investigação contra integrantes da equipe de seu antecessor pela possível atuação suspeita na condução dos acordos da J&F. “Todas as outras atuações investigatórias serão comunicadas uma vez que tenham sido instauradas, e não é o caso ainda.”

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A hipótese de investigação de auxiliares de Janot surgiu após a revelação de gravação em que Joesley sinalizava que o ex-procurador Marcelo Miller ajudou os delatores na negociação do acordo antes de se desligar da PGR. 

Na semana passada, reportagem do jornal Folha de S. Paulo revelou uma conversa do procurador Sidney Madruga, da equipe de Raquel, que disse que havia uma tendência de investigar o ex-chefe de gabinete de Janot, Eduardo Pelella. Após a divulgação, Madruga pediu sua exoneração do cargo. Pelella encaminhou ofício no mesmo dia da reportagem à procuradora-geral se colocando à disposição para “qualquer esclarecimento”.

Lava Jato. Raquel se comprometeu em trabalhar “com afinco” na continuidade dos trabalhos da Lava Jato. “O compromisso do MPF com o combate à corrupção, em especial com a Lava Jato, é o meu compromisso”, afirmou. Ela ressaltou o caráter “inibitório e transformador” da operação, que, em seu entendimento, mostrou ser possível enfrentar o crime com “os instrumentos jurídicos que temos à disposição no País”. 

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