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Propina foi institucionalizada, diz a Polícia Federal

Para Lava Jato, envolvimento no esquema de pagamentos ilícitos ia de diretores responsáveis por obras ao diretor presidente da Odebrecht

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Por Beatriz Bulla , Fabio Serapião e Ricardo Brandt
Atualização:
Porto Maravilha, no Rio Foto: Fábio Motta|Estadão

No dia 6 de novembro de 2014, o diretor regional da Odebrecht Realizações Imobiliárias Rodrigo Costa Melo, responsável pelo contrato da obra do Porto Maravilha, no Rio, enviou e-mail ao seu superior, Antonio Pessoa de Souza Couto, diretor superintendente da unidade do Grupo Odebrecht, em que pede a liberação de R$ 1 milhão para “Turquesa”. O dinheiro seria propina nas obras de revitalização da região portuária do Rio, uma das maiores parceria público-privadas (PPP) executadas pela Concessionária Porto Novo, formada pela Odebrecht, OAS e Carioca Engenharia. Cinco dias após o pedido, Couto responde ao subordinado: “ok”. Ato contínuo, o diretor ligado à obra de Porto Maravilha escreve para Paul Altit, o líder empresarial da Odebrecht Realizações: “PA, Seguindo o processo, solicito sua aprovação para a operação”. Altit responde e copia Ubiraci Santos, um dos responsáveis pelo controle na holding do departamento da propina: “Ok Bira”. Com a aprovação de suas chefias imediatas, Rodrigo Melo aciona o Setor de Operações Estruturas, em e-mail enviado para a secretária Maria Lúcia Tavares, e solicita a entrega do dinheiro em duas parcelas. A troca de mensagens dos executivos da Odebrecht, em quatro níveis hierárquicos do grupo, as planilhas de registro de pedido e registro de pagamentos fazem parte do rol de provas descobertas pela Lava Jato de que os pagamentos de propinas e lavagem de dinheiro foram institucionalizados no grupo e envolviam desde diretores responsáveis pelas obras até seu diretor presidente, Marcelo Bahia Odebrecht – afastado do cargo desde que foi preso em Curitiba, em 19 de junho de 2015. “Trata-se de um sistema institucionalizado e profissionalizado, com observância à hierarquia empresarial, e que admitidamente assume contornos subreptícios ao se valer de codinomes para preservar a identidade dos destinatários”, registra a Polícia Federal. Para investigadores, foi a institucionalização operacional dos pagamentos que arrastou mais de 50 executivos do grupo a buscarem a delação e fez com que o acordo com a força-tarefa do Ministério Público Federal fosse a única saída para tirar da cadeia seu diretor presidente e afastar o risco de falência do Grupo Odebrecht.Desvantagem. O caso da propina nas obras do Porto Maravilha - já conhecido desde março, quando foi presa a secretária do Setor de Operações Estruturas Maria Lúcia Tavares – é emblemático para mostrar como as descobertas da Lava Jato e uma eventual delação do grupo levaram a Polícia Federal e o Ministério Público Federal a novos escândalos fora da Petrobrás e comprova que o Grupo continuava a delinquir mesmo depois de iniciada a Operação Lava Jato, em março de 2014. Além de guardar registros de propina para agentes públicos e políticos nos contratos de refinarias e plataformas, os arquivos do Setor de Operações Estruturas têm dados sobre pagamentos em obras de estádios da Copa 2014, como o Itaquerão, em São Paulo, em negócios de transporte (concessões de aeroportes e rodovias), no setor de saneamento e outros. As ordens de pagamentos têm identificação de executivos responsáveis pelos pedidos, os contratos relacionados, unidades envolvidas nas despesas, nomes dos superiores que autorizavam pagamentos, beneficiários, nomes da contas usadas e valores envolvidos. Tudo cifrado, com uso de codinomes, siglas e senhas, com objetivo de ocultar a intricada sistemática financeira montada oficialmente no grupo para cuidar do chamado “custo Brasil”. Um risco para políticos não só do PT, PMDB e PP - foco no esquema de corrupção na Petrobrás -, mas também do PSDB e de outras legendas, ainda não investigados. Para a força-tarefa, a descoberta do Setor de Operações Estruturadas e suas planilhas são a prova mais contundente encontrada pela Lava Jato, nos dois anos e meio de operação, da corrupção profissionalizada em empreiteiras do cartel que atuou na Petrobrás entre 2004 e 2014. Com mais de 50 delações premiadas fechadas até aqui, os procuradores da Lava Jato consideram que as provas encontradas contra a Odebrecht colocaram a empreiteira em grau de desvantagem nas negociações. “Na mesa de negociação de uma delação, é como numa negociação comercial ou entre um casal: quem mais quer, menos pode”, afirmou um dos investigadores, em reservado.

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