PUBLICIDADE

Nabhan diz que Câmara faz 'uso político' de MP; Maia diz que secretário mente

Presidente da Câmara, Rodrigo Maia respondeu: 'É um mentiroso'; oposição critica governo por querer aprovar 'MP da grilagem de terras'

Foto do author André Borges
Por André Borges
Atualização:

BRASÍLIA – O acirramento dos ânimos entre o Palácio do Planalto e o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, ganhou um novo foco: a Medida Provisória da regularização fundiária, a MP 910. O governo afirma que Maia tem segurado a votação da proposta – conhecida na oposição como a “MP da grilagem de terras” – sem ter motivos, porque já haveria uma maioria formada para aprovar a medida. A oposição, no entanto, critica o governo de agir com açodamento e de querer aprovar um tema sensível sem o devido debate.

Mentor da proposta, o secretário de assuntos fundiários do Ministério da Agricultura, Nabhan Garcia, amigo do presidente Jair Bolsonaro, disse ao Estadão que não há mais motivos para segurar a votação e que Maia faz “uso político” da situação. Procurado pela reportagem, o presidente da Câmara reagiu duramente à crítica e disse: “É um mentiroso”, referindo-se a Nabham.

Luiz Antônio Nabhan Garcia, secretário especial de Assuntos Fundiários Foto: Dida Sampaio/Estadão

PUBLICIDADE

Para não caducar, a MP precisa ver aprovada e sancionada até o dia 19 de maio, caso contrário perderá a sua validade. “Se a maioria já tem um posicionamento, põe em pauta. Agora, ficar segurando... Isso aí é que gera um desgaste desnecessário. Por que ele (Rodrigo Maia) está fazendo isso? Será que é porque a oposição sabe que vai perder no plenário? O plenário é soberano, tem 513 deputados. Isso aí é inaceitável”, afirmou Nabhan.

A MP 910 estabelece novos critérios para a regularização fundiária de imóveis da União e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). No alvo da medida estão assentamentos ocupados até 2012, com área de até 15 módulos fiscais, unidade fixada para cada município e varia de 5 a 110 hectares.

O governo argumenta que, ao titular as posses, vai conseguir ter maior controle da terra e, inclusive, responsabilizar seus proprietários por danos que venham a cometer ao meio ambiente. Críticos à medida alegam, porém, que o governo está cedendo terras a grileiros e invasores da floresta, inclusive atropelando áreas como terras indígenas que estavam em processo de demarcação há anos.

Segundo o secretário, que é ex-presidente da União Democrática Ruralista (UDR) e defensor ardoroso dos pleitos ruralistas, o que Maia está fazendo “ignora o que foi acordado entre as lideranças” de partidos e governadores. “É uma coisa preocupante. Democracia é a liberdade do contraditório, onde o que prevalece é a maioria. Ele está segurando a votação injustificadamente." 

Nabhan diz que não teve contato com Maia para tratar do assunto. Afirma que o governo vive “uma situação extremamente constrangedora” e que seu desfecho “está efetivamente nas mãos do presidente Rodrigo Maia”.

Publicidade

“Se não for colocado em pauta e votado até amanhã, vai caducar, porque não dá tempo. Tem que ir para o Senado, que leva no mínimo uma semana, depois é que vai para o presidente Bolsonaro sancionar. Nada justifica. É um uso político. Caso essa MP caduque, isso vai mostrar que é a minoria é que está mandando. Quem está mandando no Congresso Nacional é a minoria.”

Maia respondeu que não conhece Nabhan Garcia, mas lembrou que o secretário prometeu, ainda durante a campanha de Bolsonaro e com o apoio do então candidato, atuar para que o governo apoiasse a anistia de dívidas estimadas em R$ 17 bilhões contraídas pelo agronegócio com o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural), o que acabou não ocorrendo desde que Bolsonaro foi eleito, por receio de incorrer em crime de responsabilidade fiscal.

“Não conheço (Nabhan Garcia). Pelo que sei, este Nabhan prometeu a anistia do Funrural e até agora o governo não cumpriu”, respondeu Rodrigo Maia à reportagem. “Não sei quem é, mas pelo jeito é mentiroso”, disse o presidente da Câmara.

Editada em dezembro do ano passado, a MP 910 já foi usada por cerca de mil posseiros, que conseguiram regularizar a situação das terras que ocupam. Mesmo que a medida venha a caducar, esses terão seus direitos garantidos. O presidente da Frente Parlamentar do Meio Ambiente, Rodrigo Agostinho (PSB-SP), afirma que ainda não há acordo para votar a MP da grilagem. “O texto melhorou, mas falta coisa para sair acordo”, disse.

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

Segundo Agostinho, está em jogo a regularização de grandes grilagens na Amazônia. “Já tivemos grande conquistas com o relator, mas o texto ainda permite grilar e regularizar terras públicas sem vistoria qualquer. Isso equivale a 1.650 hectares na Amazônia. Isso está incentivando muito o desmatamento de florestas públicas”, disse Agostinho. O relator, deputado Zé Silva (MG), líder do Solidariedade na Câmara, diz que o consenso está “bastante adiantado”.

Na quinta-feira, 7, Bolsonaro usou as redes sociais para pedir apoio à aprovação da MP. "Colocá-la em votação, e NÃO DEIXÁ-LA CADUCAR, é um compromisso com a dignidade desses produtores (rurais) e com o desenvolvimento do nosso Brasil", escreveu nas redes sociais. A publicação de Bolsonaro ocorreu após uma reunião no Palácio da Alvorada, com Nabhan Garcia.

A ministra Tereza Cristina (Agricultura) também tem atuado pela aprovação da medida. No final de abril, ela afirmou "estar lutando" para que a proposta do governo não caduque. Nesta quarta, ela terá reunião para falar sobre o tema com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o relator do texto, Zé Silva (SD-MG). Em conversa com o Estado, o relator afirmou que está atuando como "engenheiro de consenso".

Publicidade

No início da semana, Maia disse que há um acordo de lideranças na Câmara prevendo que a só seria pautada se houvesse consenso entre Ministério da Agricultura, a bancada do agronegócio e a bancada do meio ambiente, o que ainda não ocorreu. De acordo com aliados, o presidente da Câmara está disposto a manter o entendimento. A bancada ambientalista está em alerta e afirma que não há nenhum consenso sobre a proposta. Pelo contrário. O que veem é um risco de regularização do governo de territórios invadidos por grileiros e desmatadores ilegais.