Melhorar a política sem negar a política

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Por Redação
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ANÁLISE: Marco Antonio C. Teixeira

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Surpreendente. Não há outra palavra a ser mencionada em relação às mobilizações de ontem. Nem os mais otimistas esperavam tanta gente nas ruas, sobretudo em São Paulo. Um breve diagnóstico aponta duas grandes causas que justificam tamanha queixa contra o governo: a crescente consternação pública com o alcance dos escândalos de corrupção e o agravamento das condições econômicas do País, que provocam indignação até em segmentos que antes sustentavam o PT eleitoralmente.

Os grupos presentes nos protestos, apesar de convergirem na insatisfação contra o governo, revelam expectativas distintas acerca do futuro de Dilma Rousseff. Alguns, minoritários, defendem intervenção militar. Outros querem o impeachment, sem ainda haver motivação concreta. Os demais desejam que a situação do País melhore o quanto antes e fazem a opção por uma solução democrática: que o processo eleitoral se encarregue da alternância de poder e, se surgirem fatos para um impeachment, que os mecanismos democráticos se encarreguem disso dentro das regras do jogo, como ocorreu com Fernando Collor.

O tamanho dessa mobilização pode contribuir para fortalecer nossas instituições democráticas. O desafio é construir mecanismos que possam canalizar a mobilização em prol de mudanças institucionais. Assim, encontrar novas lideranças que possam negociar com a classe política é indispensável. Se isso não for possível, corre-se o risco de repetir junho de 2013: muita gente na rua, alguns ganhos substantivos, mas pouca interlocução para pressionar por mais avanços. Não há como fazer política sem negociar com os políticos. Não há como melhorar a política negando a própria política.

Se março de 2015 aprender com junho de 2013 - que, ao não apresentar novas lideranças, contribuiu para que os políticos voltassem ao padrão "de costas para a sociedade" -, os ganhos serão maiores. O Planalto, por sua vez, poderia mostrar sensibilidade à pressão social e regulamentar a Lei Anticorrupção, símbolo da inércia do governo. Se o Planalto demorar a agir, o efeito do tamanho da manifestação paulista pode contaminar de vez o País.

CIENTISTA POLÍTICO E PROFESSOR DA FGVSP

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