Itália autoriza extradição de Pizzolato e ex-diretor vai cumprir pena na Papuda

Condenado no processo do mensalão deve retornar na quinta-feira ao Brasil, quase 15 meses depois de deixar o País com passaporte falso; governo de Roma considerou combate à corrupção mais relevante que o princípio de não extraditar um nacional

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Por Beatriz Bulla , Talita Fernandes , Jamil Chade e Andrei Netto
Atualização:
Ex-diretor do Banco do Brasil Henrique Pizzolato em fevereiro deste ano na Itália Foto: Alexandre Auler/Estadão

Atualizado às 21h06

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GENEBRA - A Itália autorizou a extradição do ex-diretor de marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato, condenado no julgamento do mensalão. A decisão tomada pelo governo de Mateu Renzi, revelada nesta sexta-feira, 24, pelo portal Estadão.com.br, marca o fim de quase dois anos de disputa jurídica e tratativas políticas entre os dois países. O Brasil espera transferir Pizzolato, que está preso em Módena, na próxima quinta-feira, em voo comercial ou em avião fretado, se houver risco de hostilização do condenado.

Segundo autoridades brasileiras, trata-se da primeira vez que um cidadão italiano é entregue a uma nação estrangeira para cumprimento de uma condenação judicial. Pizzolato nasceu no Brasil, mas também tem passaporte italiano. Para Roma, combater a corrupção foi considerado um aspecto mais importante que o princípio de não extraditar um nacional.

“O fato de termos um crime de corrupção como base nos pareceu muito importante na decisão italiana de abrir essa exceção e extraditar um nacional. O compromisso de combate à corrupção foi colocado na decisão”, disse o diretor do Departamento Internacional da Advocacia-Geral da União (AGU), Boni Soares.

Condenado pelo Supremo Tribunal Federal a 12 anos e 7 meses de prisão por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e peculato (uso de cargo público para obter vantagem pessoal), Pizzolato será trazido ao País pela Polícia Federal e encaminhado para o Complexo Presidiário da Papuda, em Brasília.

O ex-diretor terá direito a assistência consular - uma das garantias dadas pelo Brasil em resposta enviada este mês ao governo italiano - e poderá descontar o período de 11 meses em que ficou preso no país europeu. Assim, estima-se que em 1 ano e 2 meses de regime fechado no Brasil, ele poderá pedir progressão para o semiaberto.

Essa decisão ficará a cargo do relator do caso, ministro Luís Roberto Barroso, mediante pedido do condenado e parecer do Ministério Público. No entanto, o fato de Pizzolato ter fugido do Brasil com um passaporte falso, em nome de um irmão morto há mais de 30 anos, pode dificultar a progressão de regime. O governo brasileiro não descarta cobrar de Pizzolato o ressarcimento das custas judiciais com o processo de extradição.

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‘Escudo’. Ao decidir pelo retorno de Pizzolato ao Brasil, o governo italiano minimizou a dupla cidadania do ex-diretor. Para Roma, ele se utilizou do passaporte do país europeu “apenas como escudo”, pois não tinha residência nem vínculos reais com a Itália. Enquanto esteve foragido, Pizzolato chegou a se hospedar na casa de um sobrinho, onde foi localizado e preso pelos carabinieri, a polícia italiana.

O que foi decisivo, segundo fontes do governo italiano, foi a carta do Brasil às autoridades em Roma dando garantias de que Pizzolato teria tratamento adequado na Papuda ou em uma unidade prisional de Santa Catarina, se ele assim o desejar - todo preso tem direito de pedir para cumprir pena em penitenciária próxima da família. O teor completo do documento não foi divulgado. 

A decisão pela extradição havia sido comunicada ao condenado na noite da quarta-feira, mas só chegou à embaixada do Brasil em Roma na manhã de ontem, pouco antes de ser revelada pelo Estadão.com.br. A informação pôs fim aos planos de Pizzolato de evitar ir para uma prisão brasileira.

Ao fugir do País, Pizzolato tinha a esperança de pelo menos convencer as autoridades italianas de que havia sido condenado por um julgamento “político” e de ter sido “uma vítima da má Justiça do Brasil”, como afirmou em entrevista exclusiva ao Estado. O ex-diretor do BB alegava ter fugido para “salvar sua vida” e, depois de preso pela polícia italiana, tentou alegar que o sistema prisional brasileiro não garantiria seus direitos humanos.

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Essa argumentação dos advogados italianos de Pizzolato chegaram a fazer eco nos tribunais do país. Ao analisar pedido de extradição do Brasil, a Corte de Bolonha decidiu soltar Pizzolato da prisão, em Módena, sob essa alegação. Essa sentença foi revertida há dois meses pela Corte de Cassação de Roma, instância máxima do Judiciário italiano, que considerou prerrogativa do governo de Roma dar a palavra final sobre a extradição. Ontem, veio a público a decisão do Ministério da Justiça italiano pelo retorno de Pizzolato.

“Sempre confiei na Justiça italiana", afirmou Miqueli Gentiloni, advogado contratado pelo Brasil para defender o caso. Para o defensor de Pizzolato, Alessandro Sivelli, a decisão do governo foi de “caráter político”. “Não foi uma iniciativa corajosa e o Estado italiano preferiu apenas uma avaliação política do caso”, disse a jornais de Módena.

Battisti. Os advogados de Pizzolato chegaram a usar o caso do ex-ativista Cesare Battisti - condenado na Itália por terrorismo que recebeu asilo político no último dia do governo Luiz Inácio Lula da Silva - na argumentação para convencer a Justiça do país europeu a não extraditar o brasileiro. Ao não levar a situação de Battisti em conta, o governo italiano buscaria indicar que a tensão daquele caso é “página virada”.

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Em nota conjunta, o Ministério da Justiça e a Procuradoria-Geral da República destacaram o “sucesso da cooperação internacional” envolvendo os órgãos brasileiros e as autoridades italianas.

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