BRASÍLIA - Os olhos fechados da diplomacia americana para a tortura na ditadura brasileira começaram a mudar com a eleição do democrata Jimmy Carter, em 1977. Disposto a mudar a relação escusa dos Estados Unidos com os governos militares da América Latina, Carter autorizou a divulgação do primeiro relatório sobre Direitos Humanos no Brasil que falava abertamente da tortura contra presos políticos.
O relatório incorporava informações repassadas periodicamente pela embaixada no Brasil, mas que até então eram apenas para consumo interno. Entre elas, a de que tortura, punições desumanas, cruéis e degradantes, prisões arbitrárias, invasões de casas e negativa de julgamentos justos eram uma constante no Brasil e continuavam acontecendo mais de 10 anos depois do golpe militar. Da mesma forma, não havia melhora na censura política e a falta de liberdade de expressão.
O documento, apresentado ao Congresso americano, causou revolta e levou o então chanceler brasileiro, Antônio Azeredo da Silveira, a dar entrevistas desmentindo a publicação - fato devidamente relatado ao Departamento de Estado em vários relatórios da embaixada. Os documentos contam, ainda, da reação irada do governo de Ernesto Geisel à visita da primeira-dama, Rosalynn Carter, a dois missionários americanos que haviam sido presos e espancados, em Recife, acusados de subversão. A foto correu o mundo e abalou o governo brasileiro, preocupado com sua imagem no exterior.
Os documentos que estão nas mãos da Comissão Nacional da Verdade são apenas uma pequena parte do que o governo americano tem sobre a ditadura no Brasil. Ali estão só relatos da embaixada no Brasil e nada sobre a cooperação entre CIA, Serviço Nacional de Informação e os militares americanos e brasileiros. Trazidos pelo vice-presidente Joe Biden, os 43 telegramas foram apenas um gesto de boa vontade, para agradar a presidente Dilma Rousseff, como ele mesmo admitiu. Apesar das poucas informações, mostram o quanto os americanos estavam bem informados sobre o que acontecia no Brasil.