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Um olhar crítico no poder e nos poderosos

Opinião|Flor da lama

Em meio à crise política, à tragédia na economia, à lama  e à microcefalia que avança, há algo de muito novo surgindo no País

Foto do author Eliane Cantanhêde
Atualização:

Os caciques do Senado passaram o dia inteiro maquinando o voto secreto e o relaxamento da prisão do líder do governo, Delcídio Amaral, mas, no frigir dos ovos, o resultado foi oposto: voto aberto e a manutenção da prisão por 59 votos a 13. Mais do que o corporativismo, pesou a presença da mídia e a pressão das redes sociais. À autopreservação da instituição, somou-se a autopreservação individual. Quem venceu foi... você!

De todos os partidos, só um votou pelo voto secreto: o PT. Quem diria?! Enquanto o presidente do partido, Rui Falcão, assinava nota declarando publicamente que não devia “qualquer solidariedade” ao líder do governo, a bancada petista agia em sentido contrário. Dos 13 votos contra o Supremo Tribunal Federal e a favor de tirar Delcídio da cadeia, nove foram do PT. Se não foi em cumprimento a uma ordem superior da direção, por que seria? “Eu posso ser você amanhã”?

Em uma inédita votação, o plenário do Senado decidiu manter preso o líder do governo na Casa, Delcídio Amaral (PT-MS), por 59 votos a favor, 13 contra e 1 abstenção Foto: André Dusek/Estadão

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Unidos ao PMDB na alegria do poder e na tristeza de julgar um companheiro, os petistas confundiram-se com Renan Calheiros e Jader Barbalho na apologia do voto secreto e com Fernando Collor no voto para livrar a cara de Delcídio, apesar de tudo.

Rede, DEM, PSB, PRB, PSD e PSDB encaminharam pelo voto aberto e o PMDB, ora, ora!, liberou a bancada para votar como bem entendesse. O inusitado ficou por conta do PDT. Telmário Motta decretou o voto secreto, mas Cristovam Buarque passou-lhe a rasteira com a maior elegância: pegou o microfone e, ironicamente, agradeceu a sua grandeza por “liberar a bancada”, já que ele próprio, fulano e beltrano votavam pelo voto aberto. Motta engoliu em seco e ficou por isso mesmo.

Como lembrou o jovem senador Randolfe Rodrigues, da Rede, ministros do Supremo são nomeados pelo presidente da República e têm cargo vitalício, mas senadores chegam aonde chegam pelo voto do povo brasileiro. Faz uma diferença danada. Se até os ministros já sucumbem daqui e dali à pressão que vem de fora para dentro, imagine quem depende do voto de quatro em quatro anos (deputados) ou de oito em oito (senadores)?

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As manifestações de junho de 2013 não foram um episódio que brilhou intensamente e se apagou melancolicamente. Foram um marco, porque a sociedade brasileira foi para as ruas, mostrou a sua força e nunca mais recuou. Além das outras manifestações pelas capitais e cidades do interior, as pessoas estão nas redes, na imprensa, na mídia. Cobram, pressionam, tensionam. A votação de 25 de novembro de 2015 no Senado mostrou que não é em vão.

Emergem tanto o protagonismo de Sua Excelência, o eleitor, quanto um novo protagonismo de Sua Excelência, o parlamentar que tem princípios e coragem pessoal para remar contra a maré corporativista ao encontro do mar de insatisfação da sociedade.

Randolfe, Cristovam, Luiza Erundina, Mara Gabrilli, Jarbas Vasconcellos, Chico Alencar e tantos outros que, em vez de seguirem tudo o que “seu” mestre mandar, seguem suas consciências e ouvem o que seu eleitor tem a dizer. A união dessa minoria com a grande maioria do País é que faz a força.

Essa força tende a pesar nesta semana na direção da cassação de Delcídio e de Eduardo Cunha no Senado e na Câmara, como já norteia a tramitação da nova CPMF. Mas o principal é que a união da maioria de fora com a minoria de dentro respalda o vigor das instituições brasileiras, capazes de confrontar uma história e séculos de injustiça e fazer valer o princípio de que a Justiça é igual para todos. 

Começa a parecer trivial, aqui dentro, que um banqueiro como André Esteves esteja entre as grades. Mas, lá fora, agentes políticos e financeiros já anotam que algo está mudando neste país. Em meio à crise política, à tragédia na economia, à lama de Mariana e à microcefalia que avança, há algo de muito novo surgindo no horizonte do Brasil.

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Opinião por Eliane Cantanhêde

Comentarista da Rádio Eldorado, Rádio Jornal (PE) e do telejornal GloboNews em Pauta

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