'Esquerda não tem plano B sem ex-presidente', diz historiador

Para professor da USP, Lula ‘personalizou o petismo’ e Doria pode ser ‘outsider’ da eleição presidencial de 2018

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Por Marianna Holanda
Atualização:

A decisão do juiz Sérgio Moro de cassar os direitos políticos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, apesar de ainda caber recurso, põe em xeque os planos do petista – e da esquerda como um todo – para 2018. Se Lula, que lidera as pesquisas de intenção de voto, não for candidato à Presidência, os eleitores de esquerda ficarão órfãos. A avaliação é do professor da USP e autor do livro História do PT, Lincoln Secco. “A esquerda não tem plano B sem o Lula”, disse.

O ex-presidente foi enfático em seu primeiro pronunciamento após a condenação: “Pode saber que eu estou no jogo”. E, sob aplausos de seus apoiadores na sede nacional do PT em São Paulo, afirmou que vai “reivindicar” ser o candidato do partido no ano que vem.

Lincoln Secco vê Fernando Haddad e Ciro Gomes como opções para a esquerda em 2018 Foto: Epitacio Pessoa/Estadão

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Para o professor, o partido deveria pensar em uma alternativa caso Lula não consiga reverter o processo na segunda instância. Secco, no entanto, disse acreditar que isso não tem sido feito.

O professor vai além: “Sem o apoio do Lula, nenhum candidato da esquerda se viabiliza”. Nem Fernando Haddad, nem Ciro Gomes, nem Guilherme Boulos. Leia abaixo os principais trechos da entrevista com Secco:

Após a condenação por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, Lula insistiu que será candidato do PT no ano que vem. Como o sr. vê essa estratégia? O PT sempre foi um partido bom de tática e frágil na estratégia. O seu último congresso mostrou que ele não pensa em opções além da candidatura de Lula em 2018. Ele não se coloca a hipótese da inelegibilidade de Lula, por exemplo. Mas esse é o discurso oficial do partido e faz sentido. Impedir o PT de ter um candidato competitivo a um ano do pleito equivale a banir a esquerda da vida política.

Mas o partido não deveria pensar em alternativas, caso isso se concretize? Acho que sim, mas não tem (alternativas). E nessa situação é melhor denunciar o impedimento da única candidatura que ele pode lançar. Por outro lado, acho ele vai protestar sem radicalizar. Pois para ser coerente deveria boicotar as eleições. Só que um partido com o tamanho da sua presença institucional possivelmente não faria isso.

Como o sr. avalia a condenação de Lula? Como muitos, eu acho que o juiz tinha suspeitas, mas não provas. Como (Moro) já havia se comprometido politicamente com a condenação não tinha alternativa. Ainda acho que a condenação pode ser revertida na segunda instância, porque condenar um ex-presidente sem provas abre um precedente.

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A condenação influencia a disputa eleitoral de 2018? Essa é a grande incógnita. O problema é como o País estará em 2018. Lula candidato poderia ser visto como fator de instabilidade política ou estabilidade social? Se o País estiver pior e sob muitos protestos, Lula aparecerá com força, seja como candidato, seja como eleitor de outro nome do PT. E o adversário da esquerda dificilmente será um nome do establishment do PSDB ou PMDB. Um outsider dentro ou fora desses partidos pode radicalizar o processo político. O que não seria nada bom.

O prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), poderia ser esse candidato outsider? É ruim ter um outsider? Sim, com certeza poderia ser Doria. Ele não é um produto orgânico do PSDB. Não é ruim em si, mas não é bom para o sistema de partidos. 

Como o sr. vê o cenário de um outsider do PMDB ou do PSDB concorrendo com um candidato de esquerda que não seja Lula? As chances da direita seriam maiores sem Lula no páreo, mas o quadro seria imprevisível, porque haveria uma dispersão de candidatos e votos com a incômoda presença de Bolsonaro. O candidato da esquerda provavelmente seria do próprio PT por uma questão de sobrevivência eleitoral dos candidatos a deputado.

Alguém conseguiria vencer sem a bênção do Lula? Não. Sem apoio do Lula nenhum candidato da esquerda se viabiliza porque ele concentra a memória do legado petista no poder. Lula personalizou o petismo. A esquerda não tem plano B sem o Lula. Mas o PT, provavelmente, apelaria a um parlamentar ou governador do próprio partido. 

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Quais os nomes da esquerda para 2018, então? O PT possui o nome de Haddad (Fernando Haddad, ex-prefeito de São Paulo), mas ele possivelmente não teria apoio do Lula. Gleisi Hoffmann (senadora e presidente do partido) se crescer teria. Ciro Gomes terá que se viabilizar sozinho e só teria apoio se chegasse a um segundo turno. O Boulos pode ser um vice, se o processo eleitoral se radicalizasse. Mas ele não tem a mínima chance eleitoral hoje, não tem estrutura partidária.

Surgiu uma conversa de que ele se filiaria ao PSOL...  Pode ser. Mas o PSOL é eleitoralmente inviável. E a relação do Lula com Boulos é boa. Para o PSOL seria ótimo pois teria um candidato legitimado por importante movimento social.