Em movimento desacelerado

Um caso de corrupção alastrada envolvendo a gigante Petrobrás se apresenta como uma ameaça à implantação de um mal necessário, a reforma política

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Por Redação
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Em 8 de março, a presidente do Brasil, Dilma Rousseff, aproveitou um discurso televisionado sobre o Dia Internacional da Mulher para justificar a necessidade de apertar o cinto. Isso seria necessário para fechar um déficit orçamentário de 6,75%, evitar um doloroso rebaixamento na classificação de crédito e reativar uma economia enfraquecida. Num eco da campanha eleitoral do ano passado, a presidente atribuiu as mazelas econômicas do País diretamente à crise financeira global (e a uma seca recorde em 2014). O governo fez o máximo que pôde para enfrentar esses eventos adversos, a presidente explicou. "Agora precisamos dividir parte desse esforço entre todos os setores da sociedade." Como fizera na eleição, a presidente não mencionou que a maioria dos grandes mercados emergentes, e muitos vizinhos latino-americanos, se saíram melhor que o Brasil. Mas, seja como for, muitos brasileiros não a estavam escutando, Tão logo a presidente apareceu no ar, várias cidades grandes reverberaram com o barulho de panelas sendo batidas. Numa exibição sem precedente de desagrado com seu governo, milhares foram às janelas e varandas com utensílios de cozinha. Em seu apartamento em São Paulo, este correspondente mal conseguiu ouvir o que a presidente estava dizendo por cima da barulheira, que durou quase todos os 15 minutos do pronunciamento pré-gravado. Mais preocupante que o panelaço para Dilma, porém, foi a bomba-relógio detonada no começo do fim de semana. Em 6 de março, Teori Zavascki, ministro do Supremo Tribunal Federal, divulgou a lista de políticos que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, gostaria de ver investigados em conexão com um multibilionário esquema de propinas descoberto um ano atrás na Petrobrás, a gigante estatal de petróleo. Zavascki aprovou a maioria dos pedidos de Janot. Como o Supremo precisa concordar com qualquer investigação de qualquer um que goze de privilégios parlamentares, a decisão libera procuradores e a polícia para caçar pistas que apontem para parlamentares. Será a maior investigação do gênero da história brasileira. Zavascki abriu 21 inquéritos sobre 50 indivíduos, entres os quais 22 deputados federais e 12 senadores. A título de comparação, o mensalão - um esquema que operou de 2003 até vir à luz em 2005 e em que o PT de Dilma arranjava o pagamento de propinas regulares a aliados parlamentares em troca de seus votos - começou com uma simples investigação. Aquele escândalo feriu o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, o antecessor de Dilma, e colocou alguns dos principais luminares do PT atrás das grades. O "petrolão" provavelmente será ainda mais danoso. Apesar de a própria presidente não estar sendo investigada, todos menos dois dos 49 suspeitos têm vínculos com a coalizão governante liderada pelo PT. A petição de Janot descreve uma "complexa organização criminosa" em que companhias construtoras que ganharam contratos com algumas divisões da Petrobrás desviaram cerca de 3% do valor dos contratos para subornar políticos. Alguns receberam propinas únicas, outros aparentemente recebiam pagamentos mensais de RS 30 mil a R$ 500 mil, a depender de sua influência.

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