Pioneiro na defesa da democracia após a eleição de Jair Bolsonaro, ainda em 2018, o movimento Direitos Já! vê agora nascer outros grupos dentro da sociedade civil com a mesma intenção de assegurar a manutenção do Estado de Direito em meio a uma escalada autoritária da retórica bolsonarista.
Neste sábado, 6, a partir das 16h, o movimento realiza uma live com representantes de vários espectros políticos, do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) ao governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), com participação ainda do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM). A mediação será de Fernando Guimarães, coordenador do grupo, que comemora o advento de novos manifestos em oposição ao governo Bolsonaro.
Nesta entrevista ao Estadão, Guimarães afirma que "o grande desafio é dialogar com a sociedade. Ciscar pra dentro, com humildade acolher quem está arrependido de ter acreditado no Bolsonaro, e cada vez mais isolar as vozes do autoritarismo." Leia os principais trechos:
O Direitos Já! foi criado há um ano e meio. De lá pra cá você percebe uma necessidade maior de lutar pela democracia?
O Direitos Já! Fórum pela Democracia surgiu em novembro de 2018 e foi lançado em setembro de 2019 em um ato no TUCA, que reuniu Dom Claudio Hummes, Noam Chomsky,lideranças de 16 partidos políticos e centenas de organizações da sociedade civil, entre elas a UNE, UBES, Centrais Sindicais, ABI, religiosos, movimento negro, indígena, feminista, LGBT e diversos artistas e intelectuais. Desde o primeiro momento já tínhamos a compreensão da urgência de defender a democracia da agenda anticivilizatória desse governo. O alinhamento de todos os campos democráticos em defesa do Estado Democrático de Direito é mais do que nunca um imperativo histórico.
O que propõe o grupo? E como as ações são realizadas? Encontros, agora lives?
O Direitos Já! é um movimento de resistência e resposta aos permanentes ataques que são desferidos aos valores fundamentais expressos na Constituição Brasileira. Atuamos em duas frentes, uma menos visível, mas absolutamente fundamental, que é a ação de bastidor. Temos um conselho político com a participação de lideranças dos mais diversos partidos e um fórum de organizações da sociedade civil, que são poderosos instrumentos para estreitar os diálogos, construir convergências e influenciar respostas orgânicas e institucionais. Já a parte visível da nossa ação, além de manifestos, debates e lives, é a realização de grandes atos públicos. O nosso lançamento em São Paulo foi seguramente o mais amplo e significativo ato dos últimos 30 anos. Em função da pandemia, tivemos que suspender o ato que se realizaria em São Luís no dia 30 de março e a nossa programação em outras capitais. Nesse mês de junho, temos duas datas muito significativas, dia 6, às 16h, faremos uma live com o presidente da Câmara dos deputados, Rodrigo Maia; o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso; e o ex-presidente do STF Nelson Jobim; além dos governadores Flávio Dino e Camilo Santana. E, no dia 26, às 19h, faremos outra live com cem das mais representativas lideranças da política e da sociedade.
O fato de reunir representantes da direita, esquerda e centro aproxima o grupo do movimentos das Diretas Já? É por isso a semelhança no nome?
Sem dúvida. O momento é extremamente delicado e exige demonstrações de responsabilidade histórica. Não é hora de olharmos para o retrovisor, remoer diferenças ou fazer cálculos eleitorais. Precisamos unir todos os democratas em seus gestos de grandeza no firme propósito de salvaguardar a democracia, afinal, é justamente ela e somente ela que pode assegurar a liberdade para as disputas dos distintos projetos de sociedade. Temos obtido muito sucesso nessa permanente construção. Nos últimos dias promovemos colóquios com economistas dos mais diversos partidos e participação de importantes setores da sociedade, alcançamos importantes consensos e vamos em breve apresentar ao Congresso Nacional uma importante contribuição de saídas econômicas para a crise e proteção social. A defesa da democracia passa por assegurar a vida e a dignidade das pessoas.
Na avaliação dos integrantes do grupo, a democracia corre perigo hoje no Brasil? De que forma a sociedade deve se mobilizar contra avanços autoritários?
A democracia vem sendo minada a cada dia por esse governo, cujo líder exercita a sua forte vocação autoritária. Seu projeto é o enfrentamento permanente das instituições republicanas, dos limites constitucionais do exercício da Presidência da República, do desmonte de todos os avanços democráticos e civilizatórios conquistados pela sociedade. Estamos certos que, se não fosse a pandemia, o povo estaria aos milhões tomando as ruas em defesa da democracia e em reação ao descaso com que Bolsonaro tem tratado as dezenas de milhares de mortes, que tomam essa proporção pela sua necropolitica. A sociedade deve estar permanentemente mobilizada e articulada na resistência. Precisamos agir com firmeza e muita sabedoria. É preciso fortalecer respostas orgânicas, defender e apoiar o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal nos seus sistemas de freios e contrapesos sempre que o poder executivo ultrapassar seus limites.
De que forma esses outros grupos que estão surgindo podem ajudar nessa defesa da democracia? A tendência é que todos se tornem uma coisa só?
Todos os movimentos que surgirem em defesa da democracia são muito bem-vindos. Esperamos contar com a participação de todos eles no nosso grande ato dia 26. Cada um tem as suas características e não há razão para que se tornem uma coisa só. O fundamental é que todos tenhamos um processo permanente de diálogo para avaliarmos as consequências de cada ato ou iniciativa. O momento é perigoso e não permite erros. Não podemos nos permitir agir por impulso. A pior coisa que pode ocorrer nessa hora é uma gincana de proativismo em busca de curtidas e popularidade nas redes sociais. Cada movimento dos que orquestram esse projeto autoritário busca uma determinada reação do campo democrático. Não devemos morder a isca nem jogar no campo deles. O nosso grande desafio é dialogar com a sociedade. Ciscar pra dentro, com humildade acolher quem está arrependido de ter acreditado no Bolsonaro, e cada vez mais isolar as vozes do autoritarismo.