Denúncia contra Cabral envolve apenas Andrade Gutierrez; investigação continua, diz MP

Investigadores afirmam ter conseguido provas que corroboram delação de um executivo da empresa envolvendo o ex-governador; força-tarefa afirma que métodos de lavagem de dinheiro tinham grande 'sofisticação'

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Por Constança Rezende e Vinicius Neder
Atualização:

RIO - O procurador da República Lauro Coelho Jr., coordenador da força-tarefa da Lava Jato no Rio, afirmou nesta quarta-feira, 7, que a denúncia oferecida na terça-feira, 6, contra o ex-governador do Rio Sérgio Cabral (PMDB) e mais 11 pessoas no âmbito da operação Calicute envolve apenas o pagamento de propinas por parte da empreiteira Andrade Gutierrez. A ação da PF, deflagrada em 17 de novembro, levou à prisão preventiva do ex-governador. A Calicute é um desdobramento da Lava Jato.

"As investigações continuam", disse Coelho Jr., em entrevista coletiva. Segundo o procurador, as investigações conseguiram provas que corroboraram afirmações em depoimento de delação premiada de um executivo da Andrade Gutierrez.

A advogada Adriana Ancelmo e o ex-governador do Rio Sérgio Cabral (PMDB) Foto: Vera Donato|Estadão

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'Sofisticação'. Segundo o procurador Eduardo El-Hage, a organização criminosa que envolve Cabral trabalhava com um nível de "sofisticação muito grande" em termos de métodos de lavagem de dinheiro.

De acordo com El-Hage, o grupo envolvendo Cabral e colaboradores próximos, inclusive ex-secretários de seus governo, "sempre trabalhava com dinheiro em espécie". A sofisticação é grande, disse o procurador, porque o esquema de lavagem misturava recursos lícitos com ilícitos, pois duas empresas legais, de pessoas próximas a Cabral, eram usadas, a Reginaves, da marca processadora de frangos Rica, e a rede de resorts Portobello.

Em ambos os casos, consultorias de colaboradores de Cabral (Carlos Miranda e Luís Carlos Bezerra) e o escritório da advocacia de Adriana Ancelmo, esposa de Cabral, firmavam contratos fictícios com as empresas, disse El-Hage.

Assim, as duas empresas devolviam o dinheiro para os envolvidos no caso de corrupção, misturando o dinheiro de propina com a receita real das empresas. Conforme El-Hage, é um sistema mais complexo do que apenas usar empresas de fachada, sem funcionários. "O método (de lavagem de dinheiro) mais difícil de identificar é o da mescla, quando mistura recursos lícitos com ilícitos", afirmou El-Hage, em entrevista coletiva que ocorre neste momento na sede do MPF do Rio. 

Prisão. A denúncia também pediu a prisão de Adriana Ancelmo, aceita pelo juiz federal Marcelo Bretas. Na denúncia, o Ministério Público Federal descreve os supostos episódios de lavagem de dinheiro que envolveriam, de um lado, o escritório Ancelmo Advogados, e, de outro, empresas de consultoria que pertencem a pessoas próximas de Cabral.

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Segundo os procuradores, o fato de agentes da Polícia Federal terem achado R$ 53 mil em espécie na casa de Cabral, ao cumprir mandado de busca e apreensão no local, mostra a necessidade dos pedidos de prisão, afirmaram os procuradores .

“A PF encontrou ontem (terça) mais de 50 mil em espécie. É sinal de que eles continuam a movimentar quantidade grande em valores em espécie”, afirmou o procurador Eduardo El-Hage.

Ao todo, na denúncia, são relacionados 21 fatos criminosos de corrupção passiva, lavagem de ativos e pertencimento a organização criminosa.

Crise. O procurador da República Leonardo Cardoso de Freitas disse que a corrupção praticada por Cabral agravou a crise financeira que vive o Estado do Rio. O governo calcula o rombo nas contas deste ano em R$ 17,5 bilhões. Segundo a denúncia, o grupo de Cabral teria desviado R$ 224 milhões em obras públicas com diversas empreiteiras como na reforma do Maracanã, o Arco Metropolitano e o PAC das Favelas.

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“Gostaria de ressaltar a importância desse caso para mostrar como é necessária e urgente que se combata a corrupção no Brasil”, disse Freitas.

Segundo Freitas, o Estado do Rio foi “assolado por uma organização criminosa que praticou extensos atos de corrupção narrados na denúncia”. “Este mesmo Estado que hoje vive uma crise aguda, que, sem dúvida nenhuma, seria menor se toda essa corrução e desgoverno que acompanha essa corrupção não tivessem sido praticados nesse passado recente”, afirmou o procurador.

Na decisão em que prendeu Cabral, o juiz Marcelo Bretas escreveu também que “com a corrosão dos orçamentos públicos, depreciados pelo ‘custo-corrupção’, toda a sociedade vem a ser chamada a cobrir seguidos rombos orçamentários”. “Aliás, exatamente essa é a razão que levou o governador do estado do Rio de Janeiro em exercício a decretar, no dia 17 de junho deste ano, o estado de calamidade pública devido à crise financeira”, escreveu o juiz.

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O procurador da República José Augusto Vagos lembrou ainda que o Tribunal Regional Federal da 2ª Região julgará na tarde desta quarta habeas corpus de dois colaboradores de Cabral que estão presos desde a deflagração da Operação Calicute, um desdobramento da Lava Jato em parceria entre Ministério Público Federal e Polícia Federal de Curitiba e do Rio. Vagos disse esperar que as prisões sejam mantidas pelos desembargadores.

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