‘Decisão do TSE atingiu o espírito da Lava Jato’

Para professor, votação na corte eleitoral contra cassação da chapa pode influenciar decisões no Congresso e no Supremo

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Por Adriana Ferraz
Atualização:

O professor da Fundação Getulio Vargas (SP) Fernando Abrucio afirmou que o resultado a favor da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer no julgamento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) vai atingir o “espírito da Lava Jato”. Leia a seguir a entrevista ao Estado.

Absolvição no TSE é 'apenas um respiro', diz Abrucio Foto: AMANDAPEROBELLI/ESTADAO

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A absolvição da chapa Dilma-Temer pelo Tribunal Superior Eleitoral representa o fim da crise política enfrentada pelo presidente Temer ou só um respiro?

Apenas um respiro para que o presidente tente reorganizar a governabilidade do País, mas acho muito difícil que ele consiga restaurar o momento anterior à delação da JBS. Até porque há muitas pedras no meio do caminho. As próprias perguntas feitas a ele pela Polícia Federal (dentro do inquérito autorizado pelo Supremo Tribunal Federal contra Temer) já nos indicam quais são essas pedras: Rodrigo Rocha Loures (ex-assessor de Temer flagrado recebendo uma mala com R$ 500 mil), Lúcio Funaro (apontado como operador do deputado cassado Eduardo Cunha) e outras duas novas, o tal do Edgard e o Ricardo (que a PF quer saber quem são). E sempre tem o fantasma do amigo que ficou preso em Curitiba, Eduardo Cunha, o grande guardador dos segredos da República. 

O senhor se refere à apresentação pela Procuradoria-Geral da República de uma eventual denúncia contra o presidente?

Sim, uma denúncia ou qualquer outro tipo de novidade pode acontecer a qualquer momento. É isso que os parlamentares que compõem a base governista temem. E essa possível surpresa pode prejudicá-los, apesar de não necessariamente provocar a queda de Temer no dia seguinte. Mas, usando a metáfora do relator da ação ministro Herman Benjamim (dita durante seu voto), quanto mais tempo eles ficarem segurando o caixão ao longo do velório, mais vão parecer cúmplices do presidente.

O senhor acredita que Temer tenha apoio para barrar uma denúncia contra ele na Câmara?

Não acho muito difícil para ele conseguir os 172 votos necessários para barrar a denúncia. Mas isso talvez ocorra com uma quantidade de número de votos muito menor do que o número necessário para aprovar emendas constitucionais. Esse será o sinal de que acabou, em termos de agenda legislativa importante, o governo Temer. Após isso, ainda podem vir delações do Funaro, do Loures.

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É neste momento que o PSDB, por exemplo, deverá optar por deixar a base?

No caso do PSDB não é que os parlamentares não queiram votar as reformas. O que os deputados do PSDB estão dizendo aos senadores do partido é que continuar formalmente neste governo significa perder votos em 2018. Antes da delação da JBS isso não era líquido e certo. Depois dela e de todas as consequências é líquido e certo que perdem um voto a cada dia.

Então a absolvição no TSE não aumenta nem devolve parte da força ao governo?

Acho que só aumenta o martírio e o calvário, porque pode ser que, já na semana que vem, a base tenha que começar a se articular para derrubar a denúncia do (procurador-geral da República, Rodrigo) Janot. Para mim, o resultado desse julgamento tem dois significados. O primeiro é que o sistema político, ou pelo menos a maioria que forma o Congresso, em articulação com setores da sociedade e do Judiciário, não conseguiu encontrar o dia seguinte do Temer, ou seja, não chegou a um consenso sobre o seu sucessor, seja por brigas internas ou por medo das eleições diretas. O segundo é que o espírito da Lava Jato foi fortemente atingido por essa decisão. E aí as consequências disso são imprevisíveis.

Quais seriam essas consequências?

Basta olhar os votos dos ministros. Houve uma crítica muito forte ao Ministério Público e uma posição de que, mais forte do que o clamor das ruas, é o garantismo do governo. E isso pode abrir precedente, em uma reação da cúpula do sistema de Justiça contra esse espírito da Lava Jato. As consequências podem ser, por exemplo, a aprovação da lei de abuso de autoridade pelo Congresso e a revisão da visão do Supremo sobre prisão em segunda instância.

Neste contexto, acha que o Supremo pode rever mais prisões?

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Sim, e acho que vai ficar muito difícil condenar Lula. O número de provas relativas à chapa Dilma-Temer é milhões de vezes maior na comparação com os casos do triplex e do sítio. Se o Lula for pego e o Temer salvo, a tese de que a Lava Jato tem por objetivo tirar o PT do poder volta à tona.