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De vendedor de celular a 'arquivo morto'

Amigos ainda questionam morte do comerciante Paulo Morato, alvo da Operação Turbulência

Por Pablo Pereira
Atualização:

RECIFE - Paulinho era um garoto alegre e cresceu na casa de tias no bairro Rio Doce, em Olinda, longe dos pais, que eram separados. Na adolescência, ele fez dos amigos uma família. Adulto, virou Paulão, simpático comerciante de celulares e acessórios em Tamandaré, a cerca de 100 km do Recife, casado na igreja com Jane, mas que nos últimos dois anos andava afastado dos velhos amigos.

Na quinta-feira, a polícia pernambucana divulgou um documento do Instituto Médico Legal (IML) informando que Paulo César de Barros Morato, de 47 anos, procurado pela Operação Turbulência da Polícia Federal sob acusação de ser “testa de ferro” de um esquema de lavagem de dinheiro, morreu envenenado por chumbinho em um motel de Olinda, na região metropolitana do Recife, quando fugia da PF no dia 21.

O corpo do comerciante Paulo Morato foi encontrado em motel em Olinda (PE) Foto: Sérgio Bernardo/JC Imagem

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“Isso foi um choque. É muito difícil de entender”, disse ao Estado o padre Arlindo Júnior, de Tamandaré. “Conheci o Paulinho ainda criança. Brincamos muito juntos em Olinda até lá pelos 10 anos de idade”, contou o pároco da igreja que Morato frequentava na cidade litorânea. O religioso da Matriz de São Pedro contou que deixou de se encontrar com o amigo na adolescência, quando o seminário os separou. Mas voltaram a ter contato, 14 anos depois, quando o padre foi viver na pequena Tamandaré.

“Aí ele já era o Paulão”, afirmou. “Mas continuava boa pessoa, homem simples, batalhador, frequentador da missa e ajudante no mutirão para a construção da Igreja.” Ao reencontrar-se com o amigo de infância, aproximou-se dos ritos da religião a ponto de fazer parte da organização dos encontros de casais católicos da paróquia.

“Para nós, fica difícil entender que ele esteja sendo acusado de ser ‘testa de ferro’ ou chefão de esquema de corrupção”, disse o padre. Casais de amigos, que não querem aparecer, dizem que poderiam reunir o dinheiro necessário para o funeral do amigo, que passou a semana na laje do IML.

Com uma vida simples, nos últimos dois anos, porém, Morato começou a se afastar da comunidade. Foi justamente depois da queda do avião do ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos (PSB), em Santos (SP), que a distância aumentou. Ele se mudou para o Recife. O padre ficou sabendo também que o amigo havia se separado da mulher, depois de 26 anos de convívio. “Não sei como é que aconteceu isso de se aproximar do tal grupo de empresários e políticos”, disse Arlindo.

Fachada. Mais ou menos nesta época Morato foi morar numa casa alugada na praia de Pau Amarelo, em Paulista, ao norte de Recife. Foi lá que, na manhã do dia 21, agentes federais foram prender o dono de uma empresa, a Câmara & Vasconcelos Locação e Terraplanagem, com sede em endereço chique de escritórios em Boa Viagem, mas que, segundo a PF, não passava de fachada. De acordo com as investigações, Morato fazia parte de uma quadrilha que movimentou mais de R$ 600 milhões gastos no pagamento de políticos e campanhas eleitorais, como a de Campos para governador, em 2010, e a para presidente, que terminou com a queda da aeronave.

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No dia 21, data da fuga da PF, Morato chegou ao motel dirigindo um Jeep Renegade Sport, financiado em nome de uma enteada, enquanto agentes da PF prendiam os empresários João Carlos Lyra Pessoa de Melo Filho, Eduardo Freire Bezerra Leite, Apolo Santana Vieira e Artur Roberto Lapa Rosal. E resgatavam três aeronaves, dois helicópteros e um avião, no valor de R$ 9 milhões.

Morato foi encontrado pelos funcionários do motel depois de 24 horas de silêncio na suíte número 2 e, segundo os peritos do IML, parecia ter morrido ainda na terça-feira. Entre os objetos recolhidos no local da morte havia medicamentos para diabetes e hipertensão, dezenas de envelopes de depósitos bancários do Banco do Brasil e R$ 3 mil em dinheiro, além de cheques em branco.

Em Pau Amarelo, Morato era visto na vizinhança como um homem rico. O pessoal da rua chegou mesmo a pensar que ele fosse ganhador da Mega Sena.

A confirmação da presença de veneno de rato no corpo do amigo do padre de São Pedro coloca o caso em outra fase. Mas o resultado das investigações, na Polícia Civil ou na Federal, parece que não mudará o que pensam amigos e parentes de Morato sobre ele. Na última terça-feira, quando a morte dele completou uma semana, padre Arlindo recebeu “casais amigos de Paulão” na Matriz de São Pedro para a missa de sétimo dia. “Rezamos por ele”, afirmou o pároco.