Conselho de Ética aprova a cassação do mandato de Cunha por 11 votos a 9

Após oito meses de tramitação e quatro horas de sessão, a maioria dos deputados concluiu que Cunha mentiu à extinta CPI da Petrobrás

PUBLICIDADE

Foto do author Julia Lindner
Por Julia Lindner e Daiene Cardoso
Atualização:
Sessão do Conselho de Ética desta terça-feira, 14, que votou pela cassação de Eduardo Cunha Foto: Dida Sampaio|Estadão

BRASÍLIA - Após cerca de oito meses de tramitação, o processo mais longo do Conselho de Ética chegou ao fim nesta terça-feira, 14, com a aprovação do pedido de cassação do deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Em votação nominal, a maioria dos deputados concluiu que Cunha mentiu à extinta CPI da Petrobrás sobre possuir contas no exterior. O resultado foi decidido pela deputada Tia Eron (PRB-BA), voto considerado incerto até momentos antes da votação. Com o apoio de Eron ao relatório de Marcos Rogério (DEM-RO), Cunha perdeu por 11 votos a nove. "Não posso absolver o representado. Quero votar sim com o relatório", disse Tia Eron. A votação sofreu uma reviravolta com o voto de Wladimir Costa (SD-PA), aliado de Cunha, que votou a favor da cassação do peemedebista. Momentos antes do anúncio da deputada Tia Eron, ele ainda fazia a defesa do presidente afastado da Câmara, afirmando que ele foi o grande responsável pelo processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff e chamando os petistas de "vagabundos". Antes de Costa mudar de voto, a expectativa era de que Eron poderia empatar o placar em 10 a 10. O voto de minerva ficaria favor da perda de mandato de Cunha viria do presidente do Conselho, José Carlos Araújo (PR-BA), o que acabou não sendo necessário. Durante sua exposição final, Rogério rejeitou a possibilidade de aditamento ao processo e o voto em separado que pedia apenas uma suspensão do mandato por 90 dias, mantendo assim a íntegra de seu parecer. Reafirmando que as provas contra Cunha são robustas e fartas, ele disse que o peemedebista é o titular de contas na Suíça, as quais tentou camuflar. "As provas estão aí, basta olhar sobre essa mesa o conjunto dos autos", declarou o relator, que chamou a engenharia financeira montada por Cunha de "verdadeira laranjada". "Estamos diante de uma fraude, de uma simulação, de laranjas de luxo criados para esconder a existência de contas", emendou o deputado.

Depois de a sessão ser adiada repetidas vezes, o Conselho de Ética finalmente aprovou em 14 de junho, por 11 votos a 9, o parecer para cassação de Eduardo Cunha. Aliados e adversários do ex-deputado tentavam ganhar tempo para convencer a deputada Tia Eron (PRB-BA), que desempataria a votação."Ninguém manda nesta nega. Eu não posso aqui absolver o representado nessa tarde. Eu não posso. Eu voto sim", disse a deputada. Foto: Dida Sampaio/Estadão Foto: Dida Sampaio|Estadão

Rogério defendeu que o processo disciplinar é técnico e ético. "Creio que a única sanção aplicável é a perda do mandato", insistiu. O relator falou que o escândalo é o maior que o colegiado já julgou, uma "trama para mascarar uma sucessão de crimes". Segundo o relator, Cunha mentiu para atacar a Procuradoria Geral da República e usou a CPI da Petrobras no ano passado para barrar as investigações. "Ele mentiu e omitiu informações relevantes à Câmara", reiterou. Último a falar na sessão, o advogado Marcelo Nobre disse que nas 90 páginas do parecer não havia provas de contas de Cunha no exterior. "Cadê o número da conta do meu cliente? Não me venha com pirotecnia. Eu não preciso de 90 páginas, eu preciso de uma linha", discursou. O defensor de Cunha repetiu que delação não faz prova contra o deputado e que ele não era obrigado a declarar o truste. "O que tem acontecido aqui é linchamento. Condenar sem provas é linchamento", afirmou. Com a decisão do colegiado, a defesa de Cunha possui cinco dias úteis para recorrer da decisão à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ). A comissão não analisa o mérito do que foi aprovado pelo conselho, apenas discute vícios regimentais apontados pelo representado. Assim que o recurso chegar à CCJ, ele tranca a pauta e um relator será nomeado para apresentar um parecer sobre seus questionamentos. Se a comissão entender que houve algum erro procedimental, pode solicitar que o Conselho o corrija. Depois, caso o recurso de Cunha não for aceito, o processo segue para o plenário da Casa.Discussão  Durante a sessão de hoje, que durou aproximadamente três horas, os parlamentares contrários a Cunha relembraram "manobras" para postergar o processo, que teve início em outubro de 2015. O líder do PPS, Rubens Bueno (PR) disse que os deputados "faltaram" com o povo, porque a Casa já poderia ter votado resolução para declarar a vacância do cargo ocupado por Cunha e eleger novo presidente da Casa. Ele afirmou ainda que o conselho "vem sendo manipulado" por Cunha. "Esse mandato não mais representa o mínimo de respeito ao congresso e ao povo brasileiro", declarou antes do início da votação. Betinho Gomes (PSDB-PE) disse que o processo se tornou "angustiante". "Qualquer um em sã consciência, se fosse depender naturalmente do senso da população brasileira, que observa a política hoje, certamente a solução não seria outra que não a cassação de Eduardo Cunha. Me parece que esse é o desejo da sociedade, não por querer vingança, mas porque Cunha é um político corrupto e será julgado e provavelmente condenado e preso. Diante dos fatos, me parece que não poderia haver outra solução que não a aprovação desse relatório, ao não cumprirmos nosso papel, deixa de ter sentido esse conselho, essa casa está em xeque, está merecedora de desconfiança." Aliado de Cunha, Carlos Marun (PMDB-MS), disse que os desafetos do presidente afastado no conselho indicaram uma "sucessão de acusações desprovidas de provas". "Truste não é conta", disse. "Cabe a quem acusa provar a culpa", continuou. "O deputado Eduardo Cunha é o único réu político hoje, nós não estamos aqui indultando o deputado Eduardo Cunha, não estamos aqui anistiando, estamos atuando no sentido que cada coisa seja julgada em seu devido lugar." Para Marun, a punição não poderia ser tão grave quanto a cassação e, "se for para ser mais grave, que seja no Supremo Tribunal Federal (STF)".

Sentado, o deputado Wladimir Costa (SD-PA), que surpreendeu ao votar sim; de pé, o advogado de defesa de Eduardo Cunha, Marcelo Nobre, derrotado na sessão do Conselho de Ética Foto: Agência Brasil

Deputados contrários ao parecer de Rogério elogiaram Cunha por ele ter sido "responsável" pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff. O deputado Wladimir Costa (SD-PA) chegou a xingar os petistas de "vagabundos" e houve um princípio de tumulto. Sergio Moraes (PTB-RS) afirmou que Cunha tirou o PT no governo. Segundo ele, Dilma queria transformar o Brasil em "uma Venezuela, uma Cuba", e o País estava "encurralado porque não tinha um homem de coragem". "A Nação deve isso a Cunha, por ter tirado o PT do poder", considerou Moraes. Para ele, Cunha está sendo acusado injustamente.