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Um olhar crítico no poder e nos poderosos

Opinião|Castelo de cartas

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Coisas da política e do destino: tão diferentes, e por motivos distintos, os arqui-inimigos Eduardo Cunha e Dilma Rousseff chegaram ao mesmo fim, praticamente na mesma hora e negando com a igual ênfase as próprias “pedaladas”. Ele foi afastado ontem da presidência e do mandato na Câmara e ela caminha para ter o mesmo fim na semana que vem, nos dois casos sem perspectiva de volta e sob aplausos da maioria da população brasileira. O próximo na linha de sucessão, no bom e no mau sentido, é o presidente do Senado, Renan Calheiros.

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A degola de Cunha gerou alívio tardio no governo e veio em boa hora para o vice Michel Temer, a uma semana de ascender à Presidência. Dilma vai cair, mas não vai cair sozinha e pode ter pelo menos um gostinho de vingança. O único problema é que ela perde “a cara do golpe” e vai ter de arrumar outro “inimigo número um” para animar a torcida. Quanto a Temer: não terá mais que responder, de manhã, à tarde e à noite, sobre qual a influência que Eduardo Cunha terá no seu governo. Livrou-se dele sem ter de mover uma palha e com direito a manifestar solidariedade – a portas fechadas, claro.

Outro efeito da decisão do Supremo contra Cunha foi detonar desde cedo uma série de movimentos (inúteis, frise-se) a favor da anulação do pedido de impeachment de Dilma. No Senado, o advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, anunciou que vai entrar com ação nesse sentido. Na Câmara, parlamentares do PT iam na mesma direção. E, no Supremo Tribunal Federal, o clima era de guerra.

Esse clima começou na quarta-feira, quando o ministro Marco Aurélio Mello acertou com o presidente Ricardo Lewandowski suspender toda a pauta de ontem no plenário para julgar a ação da Rede Sustentabilidade proibindo que réus no STF – caso de Cunha – ocupem funções na linha sucessória da Presidência da República. Pipocaram dúvidas: por que não repassar essa ação para Teori Zavascki, desde dezembro relator do pedido da Procuradoria-Geral da República para afastar Cunha? Por que justamente na véspera da votação do parecer contra Dilma na Comissão do Impeachment do Senado?

Debruçados sobre a ação da Rede, ministros e assessores vislumbraram, e decidiram abortar, uma brecha para que, além do afastamento de Cunha da presidência da Câmara, pudessem se aproveitar para questionar também as ações praticadas por ele na gestão – inclusive o acatamento do pedido de impeachment de Dilma. A luz amarela acendeu.

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Incomodado por se sentir atropelado por Marco Aurélio e Lewandowski, Teori amanheceu com seu parecer pronto, acatando em termos duros o pedido da Procuradoria e afastando Cunha tanto da presidência quanto do mandato. Se Teori seria atropelado, acabou atropelando. Com sua decisão, adiou sine die o julgamento da outra ação, que poderia estimular fantasias sobre a anulação do impeachment de Dilma. Se havia uma bomba, foi desarmada. 

O advogado Eduardo Mendonça, autor da ação da Rede, porém, alerta que uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. A decisão de ontem com base no pedido da Procuradoria é subjetiva, contra Cunha. Já a ação da Rede é objetiva e institucional, para que réus no Supremo não possam ocupar cargos em que sejam substitutos do presidente da República, como as presidências da Câmara e do Senado.

O resultado de tudo isso é que Cunha está afastado e o impeachment caminha, tudo dentro da legalidade. Não há nenhum golpe e a democracia, com solavancos, disputas e suspeitas de todos os lados, vai muito bem, obrigada. 

Otimismo. Em encontro na quarta-feira, Lula deixou claro que, diferentemente de gregos e troianos, acha que a guerra do impeachment ainda não está perdida e um grande fiasco do início da gestão Temer pode reverter votos decisivos no Senado. Pode ser só sonho, mas Temer que se cuide.

Opinião por Eliane Cantanhêde

Comentarista da Rádio Eldorado, Rádio Jornal (PE) e do telejornal GloboNews em Pauta

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