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Cartel da Lava Jato tinha regulamento semelhante a de campeonato de futebol, diz delator

Augusto Ribeiro de Mendonça, da Toyo Setal, relata à Polícia Federal normas do 'clube' das empreiteiras para dividir obras da Petrobrás

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Por Fabio Fabrini e Talita Fernandes
Atualização:

Brasília - Para ratear entre si as obras da Petrobrás, o cartel de empreiteiras investigado na Operação Lava Jato elaborou um regulamento semelhante às normas de um "campeonato de futebol". A revelação foi feita pelo executivo Augusto Ribeiro de Mendonça, da Toyo Setal, em depoimento à Polícia Federal.

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Segundo ele, as normas do "clube" de empreiteiras chegaram a ser escritas e eram de conhecimento das empresas participantes. Porém, os registros foram destruídos após a Operação Lava Jato ser deflagrada, em março, devido ao risco de ser apreendidos e usados como prova pelos investigadores.

"Em algum momento, alguém escreveu essas regras, como se fossem (de) um campeonato de futebol, para evitar discussões entre as empresas do clube", afirmou, acrescentando que os autores do regulamento eram, possivelmente, os dois "coordenadores" do cartel: Ricardo Pessoa e Antônio Carlos, da UTC.

O executivo - que aceitou fazer delação premiada, em troca de redução de pena - descreveu as regras. Aos investigadores, disse que as empreiteiras se reuniam regularmente para escolher com qual obra da Petrobrás cada uma ficaria.

As empresas davam notas para os projetos, de 1 a 3, conforme suas prioridades. A partir daí, discutiam os preços a ser apresentados nas licitações. As vencedoras eram previamente definidas. As demais participantes das concorrência entravam como figurantes.

O regulamento do cartel previa formas para solucionar conflitos, em caso de disputa acirrada por uma mesma obra. As empreiteiras, segundo Mendonça, eram chamadas de "equipes", como nos jogos de futebol, e participavam de "rodadas" para definir as executoras dos projetos da estatal.

 

Veja as regras citadas pelo delator:

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1) As reuniões do "clube" eram convocadas por SMS ou pelas secretárias, por telefone;

2) Existia sempre um coordenador da reunião (Ricardo Pessoa ou Antônio Carlos, ambos da UTC);

3) A periodicidade das reuniões variava de acordo com a oferta de oportunidades de concorrência na Petrobrás;

4) As reuniões ocorriam no escritório do coordenador, da UTC, no Rio ou em São Paulo;

5) Não havia registro de entrada dos participantes no local das reuniões;

6) Participavam delas 16 empresas ou "equipes" do cartel;

7) Com base nas oportunidades de obras da Petrobrás, cada equipe informava suas preferências, dando notas de 1 a 3;

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8) Um quadro era elaborado com as preferências de cada equipe, levando-se em conta o custo estimado de cada obra. A partir disso, começava a negociação entre as empreiteiras que queriam, como prioridade 1, a mesma obra;

9) Os consórcios eram formados conforme as prioridades definidas pelas empreiteiras. Se três delas elegiam uma obra como prioridade 1, por exemplo, juntavam-se num mesmo consórcio;

10) Em caso de conflito por alguma obra, buscava-se uma negociação entre as empreiteiras interessadas;

11) Caso não se chegasse a um consenso, as demais empreiteiras entravam na discussão, visando a uma decisão da maioria;

12) Cada empreiteira definia sua proposta de preço a ser apresentada à Petrobrás. Se não houvesse consenso entre as participantes, em vez de se associarem num consórcio, cada uma ficava liberada para disputar o contrato sozinha, de forma "competitiva";

13) A empresa escolhida pelo "clube" para ganhar o contrato deveria, embora participando de uma concorrência viciada, apresentar preços compatíveis com os propostos pela Petrobrás; as demais participantes entravam para "dar cobertura";

14) A "equipe" escolhida para vencer a licitação deveria informar às demais o preço que apresentaria. As empreiteiras que participavam como "figurantes" tinham o direito de questionar o valor;

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15) Caso a "equipe" escolhida desistisse de sua "preferência" por não conseguir ter preço competitivo, todas disputavam o contrato entre si, fazendo ofertas;

16) Se a "equipe" escolhida não desistisse de sua oportunidade e, por alguma medida, não tivesse êxito, entrava no fim da fila e aguardava que outras empreiteiras disputassem a oportunidade em outras "rodadas".

Em nota oficial, a Secretaria de Finanças do PT reitera que o partido somente recebe doações em conformidade com a legislação eleitoral vigente. "No caso específico, o próprio depoente reconhece em seu depoimento que foi orientado pela secretaria de Finanças do PT a efetuar as doações na conta bancária do partido. Os recibos foram declarados na prestação de contas apresentada ao TSE. Ou seja, todo o processo ocorreu dentro da legalidade", informa o texto. 

O advogado dos executivos da UTC, Alberto Toron, também não atendeu ontem aos telefonemas do Estado. Em depoimento à Polícia Federal, prestado em 18 de novembro, o dono da empresa, Ricardo Pessoa, disse que “nunca existiu” cartel para obtenção de obras na Petrobrás.

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