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Artigo - Política e Imprensa

Talvez esteja na hora de se promover uma campanha pela moralização dos tribunais em todas as duas instâncias

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Por Redação
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SÃO PAULO - Dom Pedro I adorava escrever para os jornais. Originais de alguns de seus artigos, muito rabiscados, mas escritos com boa letra (bem melhor do que a do pai), estão guardados no Museu Imperial de Petrópolis. Não está lá, no entanto, o mais célebre, publicado em janeiro de 1823 em O Espelho, cujo sugestivo título: Calmante do Malagueta ou p... que o pariu a ele, antecipava o conteúdo. Como não existe o original, ficou sempre a dúvida sobre a autoria, mas, como o estilo faz o homem e aquele artigo chulo tinha bem o estilo do nosso irrequieto imperador, tudo leva a crer que foi ele mesmo quem o escreveu.

 

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Se não hesitava em ofender, d. Pedro, no entanto, era muito pouco tolerante com qualquer crítica impressa. De forma que quando José Augusto May, o Malagueta, publicou em junho daquele ano artigo em que atacava principalmente a José Bonifácio, mas fazia também críticas veladas ao imperador, foi surpreendido por visita noturna de um bando de embuçados em sua casa no bairro de São Cristóvão. Apanhou muito o Malagueta, herdando dessa surra defeito permanente em uma das mãos.

 

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D. Pedro II, ao contrário do pai, foi totalmente tolerante com o que se publicava sobre ele nos jornais. Talvez não seja exagero dizer que foi durante o Segundo Reinado que a imprensa gozou de maior liberdade no Brasil, daí que existam tantas caricaturas suas. Mesmo quando as críticas foram mais contundentes, até mesmo ofensivas como as que publicava Apulco de Castro no seu O Corsário, o imperador nada fez contra o jornalista. Quem deu cabo de Apulco de Castro foram os militares que, sentindo-se ofendidos por alguns de seus artigos, o tocaiaram e lincharam numa esquina da hoje boêmia Rua do Lavradio.

 

Foi, de fato, sob o governo dos dois presidentes militares que a imprensa começou a sentir saudades do tempo do velho imperador. Se o Marechal Deodoro não tomou medidas legais contra o jornal monarquista, a Tribuna, seus sobrinhos, todos militares, empastelaram o jornal, causando a morte do tipógrafo. O sucessor, Marechal Floriano, prendeu e mandou para longe do Rio de Janeiro os jornalistas mais ousados como José do Patrocínio e Olavo Bilac. Durante a República Velha, oposição mesmo quem fazia era Edmundo Bittencourt, do Correio da Manhã. Chegou a bater-se em duelo contra seu conterrâneo, o também gaúcho Pinheiro Machado, presidente do Senado e eminência parda da política brasileira nos primeiros anos do século 20. Tão forte era a influência do jornal de Bittencourt que ele esteve por trás de duas agitações importantes no período: insuflando as massas contra o governo na Revolta da Vacina, em 1904, e tentando sabotar a eleição de Artur Bernardes, em 1922, com as famosas "cartas falsas".

 

A Revolução de 1930 marca um processo de ascendente controle da imprensa. Fatos como a Revolução Constitucionalista de 1932, em São Paulo, e a frustrada tentativa de golpe dos comunistas, em 1935, justificaram restrições que se tornariam ostensivas depois do golpe de 1937, quando a censura se torna política de governo. No entanto, reinou franca liberdade de imprensa durante o segundo governo Vargas. Foram os jornais de oposição que produziram a violenta campanha que resultou no desfecho trágico da madrugada de 24 de agosto de 1954. A censura mesmo só voltaria a predominar em 1964, a partir do golpe militar que levou o censor para dentro da redação.

 

Felizmente, hoje o Brasil vive período de franca liberdade de imprensa e as questões específicas são resolvidas nos tribunais. Há que se questionar, no entanto, a eventual parcialidade da Justiça. E, neste caso, talvez esteja na hora de se promover uma campanha pela moralização dos tribunais em todas as suas instâncias. Uma campanha contra as ligações antidemocráticas de compadrio entre juízes e políticos influentes, que se apresentam em todas as instâncias do Judiciário. São essas ligações perigosas que fazem com que leis bem-intencionadas como a da Ficha Limpa só atinjam - como é da lamentável tradição brasileira - os que não têm dinheiro para pagar os melhores advogados e, algumas vezes, podem até mesmo ser inocentes.

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