Após bolada de R$ 120 milhões na Mega-Sena, euforia dá lugar a cadeiras vazias no PT

Quem foi trabalhar e não jogou no bolão não escondia a frustração nesta manhã na Câmara, mas teve vencedor que apareceu

Por Renato Onofre
Atualização:

BRASÍLIA – Após bolada de R$ 120 milhões na Mega-Sena, a euforia deu lugar a cadeiras vazias – e um certo ressentimento – na liderança do PT. Um dia após um grupo de servidores e assessores ganhar na loteria, parte dos sorteados no bolão não apareceu para trabalhar ou foi dispensado. Quem esteve no local e não jogou não escondeu a frustração.

Ganhador do bolão exibe imagem do cartão premiado na porta da lotérica, em Brasília, onde jogo foi registrado Foto: Dida Sampaio/Estadão

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“Bom não está”, relatou uma assessora que não participou do bolão. “Acho que eu merecia até um dia de folga”, afirmou a funcionária, que pediu para não ser identificada. “Tem de ver a alegria que virou a liderança do PT. Você chega lá e ninguém olha na sua cara”, afirmou o deputado Paulo Teixeira (PT-SP), ao relatar o desânimo de alguns servidores que apareceram para trabalhar.

O líder do PT, deputado Paulo Pimenta (RS), afirmou que seis assessores pediram dispensa do dia para irem à Caixa Econômica Federal (CEF) resgatar o prêmio. O Estado percorreu as duas salas onde trabalha a maioria dos apostadores que compraram as 49 cotas do bolão premiado que rendeu, pelo menos, cerca de R$ 2,4 milhões para cada. 

“Bom não está. Acho que eu merecia até um dia de folga”

Funcionária da assessoria técnica do partido que não estava no bolão

Ao todo, são 96 servidores nomeados no gabinete da liderança, com salários que variam de R$ 3,6 mil a R$ 20 mil. São estes assessores que ajudam os parlamentares a elaborar projetos, auxiliam nas votações, além de fazer a interlocução com outros deputados. Partidos com melhor assessoria se saem melhor nas votações.

Logo na recepção da sala principal da liderança petista, onde fica o gabinete de Pimenta, era possível ver uma consequência da noite desta quarta-feira, 18. Uma recepcionista e outros servidores que atuam no local não apareceram.

“São R$ 2 milhões. Não dá para viver o resto da vida. É hora de manter o pé no chão”, afirmou um dos ganhadores, que pediu à reportagem para não ser identificado. Ele afirmou que está muito feliz e que vai pensar como investir a bolada.

Gabinete da liderança do PT na Câmara Foto: Dida Sampaio/Estadão

A aposta foi feita em uma loteria da Caixa em um supermercado da Asa Sul de Brasília. De acordo com Pimenta, até o momento, ele não recebeu nenhum pedido de exoneração.

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Nas comissões, onde a maioria dos vencedores atua ajudando parlamentares, a vitória na loteria virou piada. “(Deputado Marcelo) Freixo, o PT está precisando de assessores. Não tem ninguém lá do PSOL, não?”, afirmou Paulo Teixeira, brincando com o colega de Câmara durante reunião do grupo de trabalho que analisa o pacote anticrime.

“Paulo Teixeira veio de Uber. Não tem nem ninguém para dirigir lá”, brincou Freixo, em alusão a um motorista da liderança que ganhou parte da bolada. “Estão dizendo que Aécio pediu a recontagem e que o Ciro falou que se não fosse o PT, ele teria ganho”, continuou Freixo.

“São R$ 2 milhões. Não dá para viver o resto da vida. É hora de manter o pé no chão”

Um dos funcionários vencedores da bolada

Nos últimos dez anos, sempre que há uma aposta acumulada, eles jogam. Normalmente, a cota é de R$ 50, mas desta vez o grupo optou por uma parcela de R$ 10. Em outros momentos, relatou um ganhador, o grupo já acertou a quadra e a quina.

O bolão também motivou busca por vagas de emprego na Câmara. Na manhã desta quinta-feira, uma ex-funcionária do Congresso entrou na sala para deixar currículo.

Além da imprensa, os ganhadores também estão sendo abordados por amigos e parentes. O Estado teve acesso a uma troca de mensagens no grupo de WhatsApp “Assessoria Parlamento PT”, que reúne assessores técnicos que jogaram e os que não jogaram.

Um servidor do Senado, que não fez parte do bolão dos colegas da Câmara, escreveu: “Agora é convencer a família que somos do Senado”, disse, em referência ao assédio que começou a receber. Outro respondeu: “Aqui já apareceu ‘amigo’ que desde outubro de 2018 não me chamava”.

Dinheiro do prêmio está fora de ‘dízimo’ petista, diz Gleisi

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Os ganhadores do bolão da Mega-Sena filiados ao PT não precisarão dar o “dízimo”, como são chamadas as contribuições que parlamentares e ocupantes de cargos de confiança filiados têm de fazer ao partido. Pelo estatuto petista, quem for membro do PT tem de contribuir com um porcentual que varia de 2% a 20% do salário para ajudar na manutenção da legenda.

Cada uma das 49 cotas em que foi dividida a aposta pagará cerca de R$ 2,5 milhões.“O prêmio não entra na regra. Mas, quem quiser doar uma parte será muito bem-vindo”, afirmou a presidente do PT, Gleisi Hoffmann. O Estado apurou que uma sorteada que está lotada na assessoria técnica pretende doar uma porcentagem.

O porcentual varia de acordo com o valor do salário e é maior para os parlamentares. A cobrança do dízimo pelo PT já foi contestada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que proibiu o desconto na folha de pagamento. Mas o estatuto do partido, alterado em 2007, mantém a obrigatoriedade do pagamento mensal. Os parlamentares inadimplentes ficam sujeitos até a serem expulsos da legenda.

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