ANÁLISE: STF já andou longe pelo caminho da instabilidade e da individualização

A crise institucional não é nova e não será apaziguada de súbito com a decisão desta quarta-feira, 11

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Por Ivar A. Hartmann
Atualização:

A partir da decisão da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal pela suspensão de Aécio Neves (PSDB-MG) e a reação irresignada do Senado, instaurou-se a enésima crise institucional com o envolvimento do STF. Segundo a leitura mais comum, o problema seria o Supremo interpretar a Constituição para determinar a extensão de seus próprios poderes frente aos membros do Congresso. Embora esse seja o tema da decisão desta quarta-feira, 11, não é a causa da preocupação generalizada em Brasília e no Brasil.

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A apreensão é menos com o conteúdo da decisão sobre imunidade de agora e mais com o que ela poderia significar em termos dos poderes do Supremo amanhã. É menos sobre o que o Tribunal decide e mais sobre como ele decide. Mesmo negando a suspensão do mandato sem autorização do Congresso agora, a inconstância do Tribunal persiste. Ela é causada pela instabilidade de seus precedentes e a fragmentação de suas decisões, o que sinaliza a alta possibilidade de uma violação da separação de Poderes no futuro próximo.

Afastar parlamentar de seu mandato, pura e simplesmente, não foi considerado arriscado pelo Supremo e pelo Brasil quando o plenário afastou Eduardo Cunha da presidência e de seu mandato na Câmara. 

Por outro lado, os brasileiros temeram o excesso quando, por exemplo, veio a decisão solitária de ministro do Supremo afastando Renan Calheiros da presidência do Senado. Da mesma forma, quando o Tribunal enfrentou questão nova e colegiadamente estabeleceu o precedente diante do caso de Cunha, não motivou temor. A própria Câmara cassou depois o mandato. 

O medo da invasão das prerrogativas do Legislativo e Executivo é alimentado, isso sim, por inovações feitas individualmente, como a suspensão da posse do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como ministro. E esse medo se cristaliza quando os ministros, em decisão individual ou coletiva, expressam desdém por suas decisões anteriores. Ou quando insistem sempre que o caso à sua frente é excepcional. Isso aumenta a imprevisibilidade.

O histórico recente justifica o pessimismo generalizado acerca de como uma decisão sobre poderes de afastamento de parlamentares viria a ser utilizada ou gradualmente ampliada no futuro. O Supremo tomou um passo no sentido contrário agora. Mas já andou muito longe pelo caminho da instabilidade e individualização.

A crise institucional não é nova e não será apaziguada de súbito com a decisão desta quarta-feira. Cabe ao próprio Supremo estancá-la gradualmente. Um primeiro passo é não desrespeitar individualmente essa mesma decisão amanhã. *PROFESSOR DA FGV DIREITO RIO E COORDENADOR DO SUPREMO EM NÚMEROS

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