‘Afastamento é mais prudente que rompimento’

Presidente da Câmara no impeachment de Collor, Ibsen Pinheiro diz que PMDB deveria liberar voto dos parlamentares

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Por Luiz Maklouf Carvalho
Atualização:
  Foto: marcelo bertani | DIV

Avô coruja de Lina, de 3 anos, o presidente do PMDB gaúcho, Ibsen Pinheiro, completa em 2016 40 anos de atividade política. Tem 80 – 81 “só em julho”, avisa – e segue articulado na Assembleia Legislativa local. Amanhã estará em Brasília, na reunião do diretório nacional do PMDB, onde defenderá o afastamento da sigla do governo Dilma Rousseff, a entrega dos cargos, e a liberação do voto dos deputados no processo de impeachment.

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Jornalista por gosto e promotor por profissão, Ibsen viveu grandes momentos. Um foi a presidência da Câmara no primeiro e até agora único impeachment que o Brasil já teve, em 1992. “O que o povo quer, esta casa acaba querendo”, disse, ao votar pelo afastamento do hoje senador Fernando Collor. “Hoje falta a unanimidade daquele época”, afirmou, apostando que “a votação vai ser apertada, mas o impeachment não vai passar”.

Outro momento foi a cassação em 1994, após a CPI do Orçamento. Mais tarde ficou claro que a denúncia foi um erro da revista Veja, admitido publicamente. Absolvido pela Justiça, recomeçou como vereador, em 2004, e voltou a ser deputado federal em 2006. Há dois anos, ficou na terceira suplência para deputado estadual. Chegou à Assembleia após o governador Ivo Sartori (PMDB) indicar três deputados como secretários. Na quinta-feira, quando falou com o Estado por telefone, comemorava, a seu discreto estilo, não estar entre os 41 políticos gaúchos citados na lista da Odebrecht.

Logo que o pedido de impeachment foi aceito, o sr. disse que não via fundamento nas pedaladas fiscais como crime de responsabilidade, nem em tese. Mudou de opinião de lá para cá?

Como dizia o dr. Ulysses (Guimarães), a cadeira principal é de sua excelência, o fato. E houve alguns relevantes: a delação do senador Delcídio (Amaral), que trouxe fatos novos, e as gravações liberadas pelo juiz Sérgio Moro. São circunstâncias que alteram o quadro inicial. Agora há uma definição, em tese, de um ato que constitui crime de responsabilidade, quando praticado e provado, que é a intromissão na independência dos outros poderes, no caso o Judiciário.

A presidente tem se batido pela inexistência de crime de responsabilidade e classificado o processo como um “golpe”.

A presidente bate em alguns pontos vulneráveis do processo. Um deles, que não está no processo, mas faz parte, é a atuação do juiz Moro. A divulgação das gravações vulnerabilizou o juiz, passou a ideia de politização, ou de revide, ou de um paladino acima das regras de conduta profissional judicial. Dizer que o governado tem direito de saber da atuação do governante dá a ideia de que isso não tem limite. É claro que tem: a legalidade. Batendo nisso, a presidente procura evitar de bater no conteúdo das gravações, que é forte.

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As gravações e a delação de Delcídio não constam do pedido de impeachment em discussão.

Não importa, porque vão ter o seu peso. O fato é que a decisão sobre o impeachment não depende de uma decisão do Judiciário. É política. Só depende da Câmara e, se passar, do Senado. Deputado e senador não precisam fundamentar o voto, demonstrar a legalidade do voto. Se a Câmara considera que foi crime de responsabilidade, é irrecorrível. O Supremo não poderá dizer: ‘O Congresso decidiu, mas isso não é crime de responsabilidade, não ficou provado’.

Que comparações o sr. faz com o processo de impeachment do presidente Fernando Collor?

Os dois momentos cruciais que levaram à aprovação do impeachment foram a entrevista do irmão do Collor, que não teve provas, só acusações, e a entrevista do motorista Eriberto (França), uma pra Veja, outra pra Isto É. Foram as peças-chave da condenação. Mas o fundamento legal veio de um pequeno fato, vergonhoso, que foi a compra do Fiat Elba com recursos da campanha levantados por PC Farias. Hoje, falta um elemento: um fato pequeno e vergonhoso. Os fatos grandes você explica, por piores que sejam. Os pequenos, quando vergonhosos, tiram de perto os aliados fiéis, que dizem: “Não, agora deu”.

O sr. disse, ao votar pelo impeachment de Collor: “O que o povo quer, esta casa acaba querendo”. Diria a mesma coisa hoje?

Não. Falta o sentimento de unanimidade. O impeachment é amplamente majoritário no sentimento popular, mas não posso concluir que é unânime. Ao contrário do Collor, Dilma tem apoio de um partido que tem base social e inserções nos movimentos sociais, sindicatos, em alguns segmentos intelectuais.

Em 92 era diferente?

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Naquela ocasião, aritmeticamente, a aprovação não foi unânime. Mas politicamente foi. Só votaram com Collor uns 30 e poucos parlamentares, por lealdade pessoal, sabendo do resultado. Hoje eu não diria que o resultado já é conhecido. Até me arrisco a uma previsão: a votação vai ser apertada, mas o impeachment não passa. Se for preciso contar votos, acho que dois terços é impossível. Acho pouco provável chegar a 342 favoráveis.

A presidente diz que o governo terá os 172 votos necessários...

O governo não precisa de 172 votos. Porque estarão a favor do governo os votos contra o impeachment, os votos de abstenção e as ausências.

Na conta que todo mundo faz, o governo precisa ter os 172 votos.

Não precisa. Se for 341 a zero, o impeachment não passou. A ausência é uma posição contra o impeachment. Tem que somar o voto “não” à ausência e à abstenção. É possível que um deputado que não queira votar não, por causa da opinião pública, não compareça. Para o impeachment não passar o governo só precisa que não chegue a 342 votos favoráveis. Só disso.

Se o pedido for rejeitado, qual sua expectativa em relação ao que vai ocorrer no País? Como será recebido esse resultado?

Nós estamos numa crise política, não numa crise institucional. Se as instituições funcionarem, o impeachment tem que ser votado. E o dia seguinte, com qualquer resultado, será melhor que o dia da véspera, que é de incerteza. O resultado tem que ser respeitado, seja qual for.

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Qual é sua posição para a reunião do PMDB?

Meu voto será pelo afastamento. No caso do PMDB gaúcho este voto é fácil, já foi nossa posição na eleição que passou. Fizemos campanha para Eduardo Campos. Quando ele morreu, passamos para a candidatura Marina (Silva), e, no 2.º turno, para Aécio Neves – que ganhou a eleição no Rio Grande do Sul, graças ao PMDB. O PMDB gaúcho é a favor de que o PMDB entregue todos os cargos.

Qual é a sua expectativa sobre o resultado da reunião?

O mais provável é que saia uma decisão prudente, que não seja o rompimento, mas o afastamento, com a entrega dos cargos, em nome do projeto próprio para 2018. Afastamento é mais prudente, e não vincula o parlamentar ao voto pelo impeachment.

Dilma tem reafirmado que conta com a fidelidade dos sete ministros do PMDB...

É difícil fazer uma avaliação sobre a totalidade da conduta dos ministros. Mas uma decisão unânime, ou de ampla maioria, pelo afastamento, terá muita força política e conteúdo psicológico.

E sobre a posição do partido na votação do impeachment?

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Essa matéria não entrará na pauta, embora possa estar na cabeça de cada um. Acho que o voto deve ficar em aberto, para a decisão de cada parlamentar.

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), está cercado de denúncias por todos os lados, ao mesmo tempo em que comanda o andamento do processo de impeachment. Como o sr. vê essa situação?

O deputado Eduardo Cunha está muito vulnerabilizado. Ele e o centro do governo praticam um acordo tácito. Convém a Eduardo Cunha que haja um processo de impeachment, porque isso o mantém na presidência e coloca seu processo de cassação num plano secundário. Mas é bom para o governo dizer que esta é uma armação do presidente Eduardo Cunha.

O sr. é contra ou a favor do impeachment?

É a única resposta que não devo dar. Primeiro, porque não vou votar. Segundo, porque a antecipação do voto dá ideia de pregação, engajamento no resultado. Eu quero evitar isso. Não é uma posição de neutralidade, porque votarei terça-feira pelo afastamento do PMDB do governo.