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A vingança de Cunha

Por José Roberto de Toledo
Atualização:

Primeiro foi o PMDB do Rio de Janeiro, liderado pelo ambicioso clã Picciani, que desembarcou de Eduardo Cunha. Depois foi o PSDB a se dar conta que a perspectiva de o presidente da Câmara acumular a Presidência da República mais atrapalhava do que ajudava seus planos de provocar o impeachment de Dilma Rousseff. Os tucanos adicionaram um furinho ao canhonaço vindo da Suíça. Mas mesmo desinflado, Cunha prova que não afundará sozinho. O presidente da Câmara começou por vingar-se de Leonardo, o primogênito dos Picciani. Líder do seu partido e do maior bloco da Casa, ele saíra da sombra de Cunha e assumira a frente da negociação por mais ministérios para o PMDB. Vendeu mas não está conseguindo entregar o apoio dos peemedebistas e dos outros partidos que supostamente deveria representar. Obra de Cunha. Na sessão do Congresso marcada para ontem a fim de manter os vetos de Dilma à pauta-bomba que Cunha havia armado (aquela que custaria bilhões aos cofres da União), o peemedebista e os petistas precisavam reunir quórum mínimo de 257 deputados para a sessão conjunta com o Senado poder ser aberta. Picciani só conseguiu que 57% dos deputados do PMDB registrassem presença. Menor ainda foi a assiduidade dos outros partidos de seu bloco: 44% no PTB, 41% no PP, 31% no PSC. Resultado: não houve sessão. Faltaram 34 deputados para que o quórum mínimo fosse atingido. Ao mesmo tempo, ausentaram-se 78 deputados do bloco do PMDB (28), PP (23), PTB (14), PSC (9) e PHS (4). Pior para Picciani, os demais partidos convidaram-no a retirar-se da aliança. Vão deixá-lo liderar o bloco do PMDB sozinho.  Ao revelar o limitado poder do peemedebista, o movimento dos outros líderes – entre os quais alguns muitos próximos de Eduardo Cunha – também coloca em xeque a candidatura de Picciani à presidência da Câmara – caso essa vaga venha a se abrir logo. A vingança de Cunha não parou no correligionário e conterrâneo. Sobrou também para o governo. Só 223 deputados registram presença na sessão conjunta (havia tucanos, mas nenhum registrou-se). O número é vital à sobrevida de Dilma: 223 é o máximo que sua base conseguiu arregimentar minutos após seu novo ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, tomar posse declarando que o governo não teria dificuldades para atingir o quórum. Esses 223 são 43% dos votos da Câmara. É tudo o que a reforma ministerial conseguiu reunir para a presidente. Poliana diria que são 52 votos a mais do que Dilma precisa para a Câmara negar a abertura do processo de impeachment que a afastaria da Presidência. Mas essa conta é enganadora. Entre os 223 presentes ontem contam-se 100% dos deputados do PSOL e da Rede de Marina Silva, que não são exatamente partidos governistas. Ou seja, sua margem de segurança é ainda menor. Mais grave para a presidente é o que os 223 simbolizam. Significam que Dilma não tem maioria garantida para aprovar nada importante. E sem essa maioria fica virtualmente impossível o governo fazer andar o ajuste fiscal – especialmente a volta da CPMF. Isso já havia sido sinalizado pela discussão entre o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e o líder do PSD na Câmara, Rogério Rosso. Ontem, o bate-boca mostrou seu preço. Dos 33 deputados do partido do ministro Gilberto Kassab, 73% se ausentaram. Apenas 9 parlamentares do PSD registraram presença na sessão conjunta da Câmara e Senado que apreciaria os vetos de Dilma. No PDT, cujo líder virou ministro, a taxa de presença foi maior, mas ainda baixa: 58%. Mesmo entre os petistas, não foi total: 87%. A lição de ontem é que um Cunha moribundo atrapalha mais o governo do que todos os novos ministros de Dilma são capazes de ajudá-la. Toda vez que ela relaxa, achando que dominou o jogo, toma uma bola nas costas do presidente da Câmara. Ele está tentando e conseguindo que o pós-Cunha seja também o pós-Dilma.

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