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50 anos patinando

Não é mais possível adiar reformas estruturais que reforcem nossas instituições

Por Claudio Adilson Gonçalez
Atualização:

Quem, como eu, iniciou seus estudos de economia na década de 1970 deve se lembrar bem do que nos ensinavam sobre desenvolvimento econômico. No plano teórico, prevalecia o modelo Harrod-Domar, em que o crescimento era basicamente função da acumulação líquida de capital físico, ou seja, do investimento e da taxa de depreciação. Ainda hoje é frequente a indagação: “Qual a taxa de investimento necessária para o Brasil crescer, digamos, 4% ou 5% ao ano?”.

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Era também famosa a tese dos economistas Raúl Prebisch e Hans Singer, desenvolvida nos anos 50, segundo a qual havia uma tendência de longo prazo de deterioração dos termos de troca entre os produtos primários e os manufaturados. Portanto, o crescimento econômico dependeria do grau de industrialização da economia. As expressões “países industrializados” e “países desenvolvidos” eram usadas como sinônimos. Se isso fosse verdade, pobres Canadá e Austrália, onde as participações das manufaturas no PIB são, atualmente, de 10% e 7%, respectivamente.

Aprendíamos também os modelos de convergência do crescimento entre os países. Muitas simulações estimavam que em cerca de 70 anos a renda per capita do País poderia alcançar a dos EUA. Para tanto, bastaria que a economia brasileira crescesse, em média, de 1,7% a 1,8% ao ano mais que a norte-americana, o que parecia plausível, numa época em que vivíamos o “milagre brasileiro”. Já passaram 50 anos e continuamos patinando. No início da década de 70, a renda per capita brasileira era 30% da dos EUA. Hoje, equivale a aproximadamente 25%.

A interpretação simplista e, por vezes, ideológica dessas ideias, aliada ao corporativismo e ao poder de influência das grandes empresas nas decisões governamentais, em geral mediante a prática descarada da corrupção, explica as políticas econômicas prevalecentes no Brasil na maior parte desse período. Ora, se o crescimento é função do investimento e da industrialização, então, concluía-se, protecionismo e crédito subsidiado para empreendimentos industriais seriam a chave do sucesso. Infelizmente, essa visão ainda é forte entre políticos e, curiosamente, entre economistas que se intitulam progressistas. Vejam, por exemplo, os argumentos radicais contra a criação da Taxa de Longo Prazo (TLP), que gradualmente vai reduzir o subsídio implícito nas taxas de juros nos financiamentos do BNDES.

Nos últimos 50 anos, a teoria e a experiência nos possibilitaram entender melhor as causas do crescimento econômico sustentável. Destaco a visão de Douglas North, Prêmio Nobel de Economia, sobre o papel das instituições na geração de incentivos ao crescimento. Segundo North, “além de incentivos, as instituições estabelecem restrições que moldam as escolhas individuais, e, ao mesmo tempo, são criação dos seres humanos que objetivam reduzir a incerteza em relação ao futuro e garantir um ambiente estável aos investimentos e à lucratividade do capital”. Instituições sólidas estimulam o investimento, o avanço tecnológico e promovem a alocação eficiente dos recursos produtivos.

No momento, é inegável que o Brasil está saindo de um de seus mais severos episódios recessivos. Infelizmente, trata-se apenas de uma recuperação cíclica, provavelmente de curta duração. Não é mais possível adiar reformas estruturais que reforcem nossas instituições: uma reforma política séria; modernização do Judiciário para que exerça seu papel de fazer cumprir as leis com eficácia e eficiência; maior respeito ao direito de propriedade; revisão das normas de estabilidade e de remuneração dos servidores públicos; reformas fiscais com destaque para a da Previdência; reforma tributária; melhoria da infraestrutura produtiva; uma revolução, para melhor, na educação; entre outras. Esse é o único caminho. Se continuarmos empurrando com a barriga o fortalecimento e a modernização de nossas instituições, continuaremos patinando, talvez ainda por muitas décadas.

* ECONOMISTA, DIRETOR-PRESIDENTE DA MCM CONSULTORES, FOI CONSULTOR DO BANCO MUNDIAL, SUBSECRETÁRIO DO TESOURO NACIONAL E CHEFE DA ASSESSORIA ECONÔMICA DO MINISTÉRIO DA FAZENDA

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