'Política não deve mandar na religião, nem religião na política', afirma vice de Marina

Campanha do PSB intensifica esforço para desvincular imagem da candidata de grupos religiosos mais conservadores em meio à polêmica exclusão de temas caros à causa gay do plano de governo menos de 24 horas após o lançamento

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Por ROLDÃO ARRUDA E LUCAS AZEVEDO
Atualização:

A campanha da candidata do PSB à Presidência, Marina Silva, vem intensificando esforços para desvincular a sua imagem de grupos religiosos mais conservadores da área evangélica. Ontem, durante ato de campanha no Parque Farroupilha, em Porto Alegre, o candidato a vice na chapa, deputado Beto Albuquerque, defendeu a laicidade do Estado e disse que o governo do PSB não vai privilegiar nenhuma religião. "Não podemos fazer um governo desta ou daquela religião. Precisamos fazer um governo para os brasileiros", afirmou. "Nem a política deve mandar na religião, nem a religião na política. Temos que ser laicos."

Candidata do PSB à Presidência, Marina Silva, ao lado do vice, Beto Albuquerque Foto: Wilton Júnior/Estadão

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As críticas ao que seria uma excessiva dependência da candidata em relação a grupos mais conservadores se intensificaram após ela ter prometido em seu programa a defesa de reivindicações do movimento gay e, menos de 24 horas depois, divulgar uma errata na qual recuava nas questões principais daquele capítulo. A decisão da candidata ocorreu após alguns pastores e políticos da bancada evangélica terem exigido que ela se retratasse, sob pena de perder os votos da comunidade evangélica.

Em sua conta do Twitter, o pastor Silas Malafaia, destacado ativista contra as reivindicações do movimento de defesa dos direitos de gays, lésbicas, travestis e transexuais, afirmou que Marina, "a candidata membro da Igreja Evangélica Assembleia de Deus", estava fazendo "uma defesa vergonhosa da agenda gay". Em seguida, ameaçou: "Se Marina não se posicionar até segunda, na terça será a mais dura e contundente fala que já dei até hoje sobre um candidato a presidente".

Preocupação.

Marina divulgou a errata no sábado, atribuindo o que havia sido publicado - defesa clara do casamento entre pessoas do mesmo sexo e da criminalização da homofobia - a uma "falha processual na editoração do texto". A mudança provocou críticas de ativistas do movimento gay e fora dele.

"A errata foi um banho de água fria, mas nós já sabíamos que, dos três candidatos que se destacam nas pesquisas, ela é a que sempre se manteve mais distante da população LGBT", disse ontem o presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), Carlos Magno. "O mais preocupante , porém, é ver a candidata se distanciando de uma das grandes conquistas da democracia, o Estado laico."

O escritor Milton Hatoum, um dos mais importantes ficcionistas brasileiros da atualidade, traduzido em várias línguas, anunciou publicamente ontem a retirada de seu nome de uma lista de personalidades, intelectuais e artistas que haviam declarado apoio a Marina. "Não acredito em falha processual na editoração do texto. Foi uma falha moral. Uma falha de princípios éticos. Uma falha com os compromissos republicanos de um Estado laico", disse o escritor ao

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. "Não quero eleger um presidente da República que seja refém de bancadas religiosas. Tenho pavor disso."

A campanha da presidente Dilma Rousseff (PT) usou o episódio para definir Marina como "uma evangélica fervorosa" em post publicado no Facebook no fim de semana. Para o ex-governador tucano Alberto Goldman, um dos coordenadores da campanha de Aécio Neves, a "errata" da campanha do PSB "é uma agressão à nossa inteligência".

Ele disse em seu blog que, ao excluir o apoio às propostas em defesa do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo e de criminalização da homofobia, a ex-ministra do Meio Ambiente demonstrou "clara submissão a grupos que a apoiam, na linha da velha política".

Ação conjunta.

Enquanto o vice de Marina tentava desvincular a candidata de grupos religiosos mais conservadores, o comitê LGBT da campanha divulgava uma nota na qual confirma a versão de que houve um erro na editoração do capítulo que trata dos direitos dos homossexuais.

Segundo o comitê, o que saiu publicado foi a pauta integral reivindicada pela base do PSB e representantes da Rede de Marina - e não o que havia sido aprovado pela coordenação política da campanha. "Não vamos aceitar que uma falha de diagramação desqualifique nosso debate pela construção de uma nova política", diz o texto. "Nossa luta é pela defesa do Estado laico e por um Brasil que respeite a todos."

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A nota foi produzida após um longo e ruidoso processo de consultas internas, ao final do qual vários dos participantes disseram que não dariam entrevistas por orientação da campanha.

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