Os programas de governo de Aécio Neves e Dilma Rousseff têm em comum o caráter vago: faltam números, tanto para demonstrar as possibilidades reais de executá-los quanto para medir o eventual êxito no alcance das metas. Não há grandes contradições entre eles. As diferenças estão nas nuances e nas ênfases. O que em um programa aparece como prioridade, no outro é mencionado como compensação pelo peso maior dado a outro aspecto.
Em um grande esforço de incluir tudo, os dois programas são longas cartas de boas intenções. Mas, aqui e ali, pode-se notar as diferenças de visões, principalmente na economia e na política externa. A redução da maioridade penal, defendida por Aécio e rejeitada por Dilma, é outra diferença importante. Na reforma política, de educação e da saúde surgem algumas propostas concretas. No meio ambiente e na política indigenista, fica evidente o desejo de atrair os eleitores de Marina Silva.
Seguem os principais pontos dos dois programas.
POLÍTICA ECONÔMICA_______________________________
Defende ainda a autonomia operacional do Banco Central e a livre flutuação da taxa de câmbio, para "reequilibrar as contas externas e garantir maior competitividade à indústria".
O PSDB aposta em mudanças tributárias para incentivar o crescimento. Oferece "desoneração total dos investimentos e das exportações"; simplificação no curto prazo e redução da carga tributária no longo prazo; substituição do ICMS e de todos os tributos federais que incidem sobre o faturamento ou receita das empresas, incluindo o IPI e as contribuições sociais, por um Imposto sobre Valor Adicionado (IVA).
O PT também fala em "ampla simplificação tributária", com a universalização da cobertura do Simples nacional e a implantação da Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios (Redesim). Promete "reduzir drasticamente a burocracia: informatizar, criar cadastro único e diminuir o volume de documentos e registros demandados do cidadão".
INFRAESTRUTURA___________________________________
PREVIDÊNCIA______________________________________
A presidente, no entanto, afirmou durante a campanha que considera uma "temeridade" mexer na fórmula do fator previdenciário, que leva em conta o tempo de contribuição, a idade de quem se aposentou e a expectativa de vida da população. Sindicalistas pressionam o governo para rever a fórmula, que consideram injusta com os trabalhadores.
BOLSA FAMÍLIA____________________________________
Aécio assinala que, como senador, apresentou projeto de lei para tornar o Bolsa Família um "programa de Estado, garantindo o benefício a todos os brasileiros que precisam, independentemente do governo". A proposta foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) em dezembro de 2013.
Outro projeto apresentado por Aécio no Senado estende o pagamento por mais seis meses para quem conseguir emprego com carteira assinada. Ele propõe ainda criar o Banco Travessia, "programa de poupança familiar que estimula as famílias a se qualificarem, estudarem e se inserirem no mercado de trabalho".
A presidente promete ampliar a "busca ativa", para seguir incluindo as famílias mais pobres, que, de tão vulneráveis, os programas sociais têm dificuldade de alcançar.
Criado pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010), o Bolsa Família beneficiou em setembro, segundo dados oficiais, quase 14 milhões de famílias. Também de acordo com o governo, o valor médio do benefício é de R$ 170. Durante a campanha, Dilma chegou a dizer em comícios que o adversário planejava acabar com o programa caso fosse eleito.
REFORMA POLÍTICA_________________________________
A reforma prevê ainda o voto distrital misto, o que significa que uma parte dos candidatos ao Legislativo seria eleita pelo distrito, e a outra parte mediante a votação em lista definida pelo partido; incluir os candidatos a vice no cálculo do tempo de propaganda eleitoral na TV; fim das coligações proporcionais nas eleições para deputados federal e estadual e vereador; redefinição dos critérios de uso de medidas provisórias.
Fustigada pelo escândalo de corrupção na Petrobrás no calor da campanha, Dilma propõe a elaboração de "regras claras de financiamento" das campanhas.
EDUCAÇÃO_______________________________________
O candidato propõe ainda reformular a grade curricular do ensino médio, incluindo disciplinas básicas e específicas; apoiar os municípios na criação de 900 mil vagas na pré-escola, que deverá ser universalizada até 2016; e os Estados, na criação de mais vagas no ensino médio diurno, com o objetivo de eliminar gradualmente o turno da noite para os jovens que não trabalham.
O tucano fala ainda em "expandir e aperfeiçoar" o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e o Prouni, que dá bolsas de estudos para alunos de faculdades particulares; "aumentar o alcance" do Pronatec, que tem expandido a rede de escolas técnicas; ampliar vagas em cursos diurnos de formação de professores; e garantir que toda escola tenha conexão Wi-Fi acessível a todos os estudantes e Professores.
A petista promete criar mais 12 milhões de vagas nos cursos técnicos até 2015. De acordo com o Censo Escolar 2012 do Ministério da Educação, havia 1,3 milhão de alunos matriculados na chamada "educação profissional" naquele ano. O aumento seria de quase 1.000%. Em 2007, eram 780 mil, o que representou um salto de 75%. A presidente propõe também um "pacto nacional pela melhoria de qualidade do ensino médio", até 2016.
Dilma promete conceder, no período 2015-2018, mais 100 mil bolsas do Ciência sem Fronteiras, que custeia o intercâmbio de estudantes de graduação e de pós no exterior. Seu programa fala ainda em "mudança curricular e na gestão das escolas" e em "valorizar o professor, com melhores salários e melhor formação".
SAÚDE__________________________________________
O programa prevê a criação de 500 "Centros Especiais de Saúde" com médicos especializados, exames e fornecimento de remédios; financiamento do BNDES para uma "Rede de Consultórios de Saúde" nas periferias das grandes cidades, áreas violentas e pobres; ampliar leitos de UTI neonatal; sistema eficiente de controle de custos e aumento da produtividade.
Aécio propõe também criar o Disque Cidadão Saúde, para recolher as reclamações e denúncias dos usuários do SUS; construir maternidades em todo o País em parceria com Estados e municípios e garantir recursos para equipe multidisciplinar; e o programa de transporte de pacientes "Vai e Volta com Saúde" nas cidades com maior dificuldade de acesso.
O programa de Dilma considera que será necessária uma "rediscussão federativa", para evitar superposição de investimentos (por municípios, Estados e União), e tornar mais eficiente a distribuição dos serviços de saúde públicos. A presidente se compromete a fortalecer e aprimorar o Sistema Único de Saúde (SUS).
SEGURANÇA PÚBLICA________________________________
Ele promete "inovações gerenciais" para a atuação conjunta entre as polícias e a Justiça; ampliar programas de formação de policiais comunitários; criar centros de inteligência policial integrada nas grandes cidades, com apoio do governo para equipamentos e treinamento de analistas criminais; um fundo de valorização da polícia, com metas para acessar seus recursos; aumento de pena para crimes contra policiais, juízes, promotores e agentes prisionais.
A presidente promete ainda criar uma academia nacional de segurança pública, para formação conjunta de policiais e analistas, formulação e difusão de procedimentos operacionais padronizados. "Fortaleceremos ainda mais as ações de combate às organizações criminosas e à lavagem de dinheiro e de controle das fronteiras", afirma o programa.
POLÍTICA EXTERNA_________________________________
Ele fala ainda em "definição de nova estratégia de negociações comerciais bilaterais, regionais e globais, para pôr fim ao isolamento do Brasil, priorizando a abertura de novos mercados e a integração do Brasil às cadeias produtivas globais".
"A prioridade à América do Sul, América Latina e Caribe se traduzirá no empenho em fortalecer Mercosul, Unasul e Comunidade dos Países da América Latina e Caribe, sem discriminação de ordem ideológica", assegura o programa. "Da mesma forma, será dada ênfase às relações com a África, com os países asiáticos - a China é nosso principal parceiro comercial - e com o mundo árabe."
O programa pondera, no entanto: "A importância dada aos países do sul do mundo, que têm expressão concreta no Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), não significa desconsiderar os países desenvolvidos. Bem ao contrário, é de grande relevância nosso relacionamento com os Estados Unidos, por sua importância econômica, política, científica e tecnológica, sem falar no volume de nosso comércio bilateral. Critério semelhante é válido para nossas relações com a União Europeia e com o Japão".
MEIO AMBIENTE____________________________________
O meio ambiente ocupa maior espaço nos programas de ambos do que a maioria dos outros tópicos, como resultado do impacto da entrada de Marina Silva na corrida presidencial. Tanto Aécio quanto Dilma se comprometem a adotar medidas para reduzir a emissão de gás carbono e o desmatamento, e falam em implementar o Cadastro Ambiental Rural, previsto no novo Código Florestal. Ambos enfatizam também o papel das populações indígenas na conservação da biodiversidade - uma das preocupações expressas por Marina ao conferir apoio a Aécio no segundo turno.
O candidato tucano propõe orientar a gestão das unidades de conservação com o objetivo de gerar renda para as populações locais; formar corredores ecológicos de modo a conectá-las umas às outras; e criar políticas para a remuneração dos chamados "serviços ambientais" - como a manutenção das florestas de pé.
Inversamente ao programa do PT, Aécio se compromete a manter a importância do pré-sal, ao realçar a necessidade de expansão das fontes renováveis, e promete uma política tributária de incentivo aos biocombustíveis.
Dilma fala em "fortalecer a coordenação intergovernamental" entre União, Estados e municípios, para gerir políticas internas, nas áreas de licenciamento ambiental, recursos hídricos, mudança climática e florestas. Para isso, promete regulamentar a lei complementar 140, sancionada em dezembro de 2011, que trata dessa cooperação entre os entes federativos.
O programa coloca como prioridade a chamada segurança hídrica, também preconizando a cooperação entre os três níveis de governo para atender às necessidades múltiplas de uso da água. E diz que "o Brasil se engajará fortemente nas negociações climáticas internacionais que terão lugar em 2015, para que seus interesses sejam contemplados no processo de estabelecimento dos parâmetros globais".