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O Brasil de Dilma e Aécio

Sem contradições relevantes entre eles, programas de governo dos dois candidatos são longas cartas de boas intenções

Por Lourival Sant’ Anna
Atualização:

Os programas de governo de Aécio Neves e Dilma Rousseff têm em comum o caráter vago: faltam números, tanto para demonstrar as possibilidades reais de executá-los quanto para medir o eventual êxito no alcance das metas. Não há grandes contradições entre eles. As diferenças estão nas nuances e nas ênfases. O que em um programa aparece como prioridade, no outro é mencionado como compensação pelo peso maior dado a outro aspecto.

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Em um grande esforço de incluir tudo, os dois programas são longas cartas de boas intenções. Mas, aqui e ali, pode-se notar as diferenças de visões, principalmente na economia e na política externa. A redução da maioridade penal, defendida por Aécio e rejeitada por Dilma, é outra diferença importante. Na reforma política, de educação e da saúde surgem algumas propostas concretas. No meio ambiente e na política indigenista, fica evidente o desejo de atrair os eleitores de Marina Silva.

Seguem os principais pontos dos dois programas.

POLÍTICA ECONÔMICA_______________________________

Defende ainda a autonomia operacional do Banco Central e a livre flutuação da taxa de câmbio, para "reequilibrar as contas externas e garantir maior competitividade à indústria".

O PSDB aposta em mudanças tributárias para incentivar o crescimento. Oferece "desoneração total dos investimentos e das exportações"; simplificação no curto prazo e redução da carga tributária no longo prazo; substituição do ICMS e de todos os tributos federais que incidem sobre o faturamento ou receita das empresas, incluindo o IPI e as contribuições sociais, por um Imposto sobre Valor Adicionado (IVA). 

O PT também fala em "ampla simplificação tributária", com a universalização da cobertura do Simples nacional e a implantação da Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios (Redesim). Promete "reduzir drasticamente a burocracia: informatizar, criar cadastro único e diminuir o volume de documentos e registros demandados do cidadão". 

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INFRAESTRUTURA___________________________________

 

Porto de Santos Foto: Márcio Fernandes/Estadão - 17.07.2014

PREVIDÊNCIA______________________________________

A presidente, no entanto, afirmou durante a campanha que considera uma "temeridade" mexer na fórmula do fator previdenciário, que leva em conta o tempo de contribuição, a idade de quem se aposentou e a expectativa de vida da população. Sindicalistas pressionam o governo para rever a fórmula, que consideram injusta com os trabalhadores.  

BOLSA FAMÍLIA____________________________________

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Aécio assinala que, como senador, apresentou projeto de lei para tornar o Bolsa Família um "programa de Estado, garantindo o benefício a todos os brasileiros que precisam, independentemente do governo". A proposta foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) em dezembro de 2013.

Outro projeto apresentado por Aécio no Senado estende o pagamento por mais seis meses para quem conseguir emprego com carteira assinada. Ele propõe ainda criar o Banco Travessia, "programa de poupança familiar que estimula as famílias a se qualificarem, estudarem e se inserirem no mercado de trabalho". 

A presidente promete ampliar a "busca ativa", para seguir incluindo as famílias mais pobres, que, de tão vulneráveis, os programas sociais têm dificuldade de alcançar.

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Criado pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010), o Bolsa Família beneficiou em setembro, segundo dados oficiais, quase 14 milhões de famílias. Também de acordo com o governo, o valor médio do benefício é de R$ 170. Durante a campanha, Dilma chegou a dizer em comícios que o adversário planejava acabar com o programa caso fosse eleito.

Beneficiários do Bolsa Família fazem atualização de cadastro, em São Paulo Foto: Felipe Rau/Estadão - 19.12.2013

REFORMA POLÍTICA_________________________________

A reforma prevê ainda o voto distrital misto, o que significa que uma parte dos candidatos ao Legislativo seria eleita pelo distrito, e a outra parte mediante a votação em lista definida pelo partido; incluir os candidatos a vice no cálculo do tempo de propaganda eleitoral na TV; fim das coligações proporcionais nas eleições para deputados federal e estadual e vereador; redefinição dos critérios de uso de medidas provisórias. 

Fustigada pelo escândalo de corrupção na Petrobrás no calor da campanha, Dilma propõe a elaboração de "regras claras de financiamento" das campanhas.  

EDUCAÇÃO_______________________________________

O candidato propõe ainda reformular a grade curricular do ensino médio, incluindo disciplinas básicas e específicas; apoiar os municípios na criação de 900 mil vagas na pré-escola, que deverá ser universalizada até 2016; e os Estados, na criação de mais vagas no ensino médio diurno, com o objetivo de eliminar gradualmente o turno da noite para os jovens que não trabalham.

O tucano fala ainda em "expandir e aperfeiçoar" o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e o Prouni, que dá bolsas de estudos para alunos de faculdades particulares; "aumentar o alcance" do Pronatec, que tem expandido a rede de escolas técnicas; ampliar vagas em cursos diurnos de formação de professores; e garantir que toda escola tenha conexão Wi-Fi acessível a todos os estudantes e Professores. 

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A petista promete criar mais 12 milhões de vagas nos cursos técnicos até 2015. De acordo com o Censo Escolar 2012 do Ministério da Educação, havia 1,3 milhão de alunos matriculados na chamada "educação profissional" naquele ano. O aumento seria de quase 1.000%. Em 2007, eram 780 mil, o que representou um salto de 75%. A presidente propõe também um "pacto nacional pela melhoria de qualidade do ensino médio", até 2016.

Dilma promete conceder, no período 2015-2018, mais 100 mil bolsas do Ciência sem Fronteiras, que custeia o intercâmbio de estudantes de graduação e de pós no exterior. Seu programa fala ainda em "mudança curricular e na gestão das escolas" e em "valorizar o professor, com melhores salários e melhor formação". 

SAÚDE__________________________________________

O programa prevê a criação de 500 "Centros Especiais de Saúde" com médicos especializados, exames e fornecimento de remédios; financiamento do BNDES para uma "Rede de Consultórios de Saúde" nas periferias das grandes cidades, áreas violentas e pobres; ampliar leitos de UTI neonatal; sistema eficiente de controle de custos e aumento da produtividade.

Aécio propõe também criar o Disque Cidadão Saúde, para recolher as reclamações e denúncias dos usuários do SUS; construir maternidades em todo o País em parceria com Estados e municípios e garantir recursos para equipe multidisciplinar; e o programa de transporte de pacientes "Vai e Volta com Saúde" nas cidades com maior dificuldade de acesso. 

O programa de Dilma considera que será necessária uma "rediscussão federativa", para evitar superposição de investimentos (por municípios, Estados e União), e tornar mais eficiente a distribuição dos serviços de saúde públicos. A presidente se compromete a fortalecer e aprimorar o Sistema Único de Saúde (SUS).

Posto de saúde em Belém (PA) que trabalha com profissionais contratados pelo Mais Médicos Foto: Hélvio Romero/Estadão - 28.08.2014

SEGURANÇA PÚBLICA________________________________

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Ele promete "inovações gerenciais" para a atuação conjunta entre as polícias e a Justiça; ampliar programas de formação de policiais comunitários; criar centros de inteligência policial integrada nas grandes cidades, com apoio do governo para equipamentos e treinamento de analistas criminais; um fundo de valorização da polícia, com metas para acessar seus recursos; aumento de pena para crimes contra policiais, juízes, promotores e agentes prisionais. 

A presidente promete ainda criar uma academia nacional de segurança pública, para formação conjunta de policiais e analistas, formulação e difusão de procedimentos operacionais padronizados. "Fortaleceremos ainda mais as ações de combate às organizações criminosas e à lavagem de dinheiro e de controle das fronteiras", afirma o programa. 

POLÍTICA EXTERNA_________________________________

Ele fala ainda em "definição de nova estratégia de negociações comerciais bilaterais, regionais e globais, para pôr fim ao isolamento do Brasil, priorizando a abertura de novos mercados e a integração do Brasil às cadeias produtivas globais". 

"A prioridade à América do Sul, América Latina e Caribe se traduzirá no empenho em fortalecer Mercosul, Unasul e Comunidade dos Países da América Latina e Caribe, sem discriminação de ordem ideológica", assegura o programa. "Da mesma forma, será dada ênfase às relações com a África, com os países asiáticos - a China é nosso principal parceiro comercial - e com o mundo árabe."

O programa pondera, no entanto: "A importância dada aos países do sul do mundo, que têm expressão concreta no Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), não significa desconsiderar os países desenvolvidos. Bem ao contrário, é de grande relevância nosso relacionamento com os Estados Unidos, por sua importância econômica, política, científica e tecnológica, sem falar no volume de nosso comércio bilateral. Critério semelhante é válido para nossas relações com a União Europeia e com o Japão". 

MEIO AMBIENTE____________________________________

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O meio ambiente ocupa maior espaço nos programas de ambos do que a maioria dos outros tópicos, como resultado do impacto da entrada de Marina Silva na corrida presidencial. Tanto Aécio quanto Dilma se comprometem a adotar medidas para reduzir a emissão de gás carbono e o desmatamento, e falam em implementar o Cadastro Ambiental Rural, previsto no novo Código Florestal. Ambos enfatizam também o papel das populações indígenas na conservação da biodiversidade - uma das preocupações expressas por Marina ao conferir apoio a Aécio no segundo turno.

O candidato tucano propõe orientar a gestão das unidades de conservação com o objetivo de gerar renda para as populações locais; formar corredores ecológicos de modo a conectá-las umas às outras; e criar políticas para a remuneração dos chamados "serviços ambientais" - como a manutenção das florestas de pé.

Inversamente ao programa do PT, Aécio se compromete a manter a importância do pré-sal, ao realçar a necessidade de expansão das fontes renováveis, e promete uma política tributária de incentivo aos biocombustíveis. 

Dilma fala em "fortalecer a coordenação intergovernamental" entre União, Estados e municípios, para gerir políticas internas, nas áreas de licenciamento ambiental, recursos hídricos, mudança climática e florestas. Para isso, promete regulamentar a lei complementar 140, sancionada em dezembro de 2011, que trata dessa cooperação entre os entes federativos.

O programa coloca como prioridade a chamada segurança hídrica, também preconizando a cooperação entre os três níveis de governo para atender às necessidades múltiplas de uso da água. E diz que "o Brasil se engajará fortemente nas negociações climáticas internacionais que terão lugar em 2015, para que seus interesses sejam contemplados no processo de estabelecimento dos parâmetros globais".

Área desmatada na Amazônia Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil
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