Franquia de ONGs, uma nova forma de combater a corrupção

Rede de Observatórios Sociais aposta na prevenção para combater a corrupção em mais de 70 cidades

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Por Daniel Bramatti
Atualização:

O início foi modesto, há dez anos, no interior do Paraná. Mas a iniciativa deu tão certo que a expansão foi inevitável: hoje a rede de Observatórios Sociais, ONGs que apostam na prevenção para combater a corrupção, atua em mais de 70 cidades de 14 Estados do País. O plano agora é, com a ajuda do Sebrae, ampliar a rede recorrendo à criação de franquias.

O primeiro Observatório surgiu em 2004, no rastro de um escândalo de desvio de recursos em Maringá. O ex-prefeito Jairo Gianoto foi condenado, preso e hoje recorre em liberdade. Dois anos depois, a vizinha Campo Mourão seguiu o exemplo. A iniciativa chegou a Estados como Santa Catarina, São Paulo e Rondônia.

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"É preciso matar a corrupção no edital", diz o presidente da ONG, Ater Cristófoli. "A gente percebe que, se o prefeito não resolve lá no começo, pouca coisa acontece depois." Uma de suas lições: "O fundamental é que os integrantes dos Observatórios não sejam filiados a partidos políticos, para que o prefeito não possa alegar que é uma ação da oposição". Com base nas irregularidades detectadas, a rede calcula ter conseguido em 2013 uma economia total de R$ 305 milhões para os cofres públicos.

Como surgiu o Observatório?

Após uma série de escândalos em Maringá. Na época, falava-se em um desvio de R$ 100 milhões. Os abusos geraram uma indignação enorme, e a Associação Comercial e outras lideranças resolveram montar uma estrutura para acompanhar os atos do município. Naturalmente foram ver os editais de licitação. Foi a decisão mais acertada: em vez de ver o que foi desviado, dar ênfase à prevenção.

Que entidades participaram?

Associação Comercial, OAB, maçonaria, Lions, igreja. Em Maringá, hoje são 60 instituições. No primeiro ano, a economia foi de R$ 9 milhões.

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Como medem essa economia?

Nem contamos os editais derrubados. Levamos em conta o que a prefeitura estava disposta a pagar por um produto no edital e o que ela paga após nossa intervenção. Em Campo Mourão, o preço do material escolar caiu para um terço. Medicamentos estão custando a metade. É preciso matar a corrupção no edital, fazer a prefeitura colocar lá que o preço é R$ 4, não R$ 10. É a coisa mais efetiva, dada a morosidade da Justiça.

A corrupção está na cúpula ou nos escalões inferiores?

Quem mais rouba não é o poder público. Em geral são as empresas que pegam o edital, combinam a coisa antes e vão acertadas para o pregão. Agora, estamos indo além. Melhor do que saber que a prefeitura pagou 49 centavos por uma caneta - o preço normal - e não R$ 3,50, é ver se a caneta é necessária. Só aí se faz o edital.

Há treinamento para o pessoal que analisa os editais?

Sim, e constante. Apesar de termos um quadro de voluntários, profissionalizamos a equipe. Precisamos de gente na linha de frente, das 8h às 18h - administradores, advogados, economistas, e dois ou três estagiários. Temos um software para a gestão e nele colocamos todos os valores que as prefeituras pagam pelos produtos. Com isso, temos referências.

Todos os Observatórios atuam da mesma forma?

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Temos um manual de procedimentos, que a Price Waterhouse ajudou a elaborar, e um fluxograma de trabalho. Quando se descobre alguma irregularidade, primeiro avisamos o secretário ou o prefeito. Se ele não faz nada, avisamos a Câmara. Se os vereadores não fizerem nada, e normalmente não fazem, aí a gente avisa o Ministério Público. Em Curitiba, estamos fazendo um acordo para notificar oficialmente o Tribunal de Contas do Estado.

A pressão dá resultado?

Temos uma prestação de contas quadrimestral. A gente chama as entidades que nos dão lastro, a imprensa. No ano passado, com 62 observatórios, conseguimos obter uma economia de R$ 305 milhões.

A corrupção é o principal problema do País?

Na minha opinião, temos dois grandes cânceres. Um é a sonegação. E outro é o desvio dos recursos públicos. Estamos vendo cada vez mais gente reclamando do poder público. É porque tem cada vez mais gente pagando imposto. E não é porque os brasileiros estão ficando mais honestos, é porque a informática está avançando. Estamos trabalhando com o Sebrae para tornar isso algo parecido com uma franquia. O pessoal das franquias tem toda uma metodologia de controle.

As manifestações de junho afetaram o trabalho de vocês?

Não. É outro público. Não adianta nariz de palhaço, não adianta quebra-quebra. O pessoal do mal é muito organizado e, desse jeito, sempre vai levar vantagem.

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