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Dilma cria nove conselhos para articular 'diálogo'

Decreto editado pelo Planalto institucionaliza relações do governo com movimentos sociais

Por BRASÍLIA
Atualização:

Em estratégia para se aproximar dos movimentos sociais, que ganharam maior visibilidade com as manifestações contra os gastos da Copa, a presidente Dilma Rousseff editou na segunda-feira um decreto que cria nove instâncias de negociação e comunicação com a sociedade civil.

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Embora já estivesse programada pelo Planalto desde 2010, a norma teve sua redação acelerada a partir das manifestações de junho do ano passado. O texto, que institui a Política Nacional de Participação Social (PNPS), oficializará a relação do governo com os "novos setores organizados" e "redes sociais", segundo assessores do Planalto.

De acordo com o documento, a tarefa de articulação e promoção da participação social caberá aos seguintes fóruns: 1) conselho de políticas públicas; 2) comissão de políticas públicas; 3) conferência nacional; 4) ouvidoria pública federal; 5) mesa de diálogo; 6) fórum interconselhos; 7) audiência pública; 8) consulta pública; e 9) ambiente virtual de participação social.

A convocação de cada uma dessas instâncias caberá à Secretaria-Geral da Presidência, hoje comandada pelo ministro Gilberto Carvalho, que editará portarias com as rotinas e métodos de escolha dos integrantes e periodicidade dos encontros.

Os integrantes não serão remunerados e, de acordo com a norma, as propostas apresentadas nas reuniões não precisam necessariamente ser levadas adiante pelo governo.

O diretor de Participação Social da Secretaria-Geral da Presidência, Pedro Pontual, justificou a edição do decreto. "Um dos legados importantes que o governo Dilma vai deixar é a institucionalização dos instrumentos de participação, transformando-os em método de governo", afirmou Pontual, lembrando que a implantação deste processo está prevista na Constituição de 1988, mas que, em 2003, isso foi intensificado, com a criação dos conselhos. Segundo o diretor de Participação Social, o que o governo quer, com este processo, é que "todos os órgãos estejam obrigados a usar a participação social para a execução das suas políticas".

Depois dos protestos, ainda no ano passado, Dilma fez nove reuniões com movimentos sociais e este ano já fez outras quatro.

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Na sexta-feira passada, em discurso, Dilma defendeu a necessidade da participação da sociedade civil em todos os processos de decisão. "Eu queria dizer para vocês que celebrar o diálogo e a participação social significa para mim celebrar a democracia e há algumas questões que exigem a participação social para ocorrer", disse, referindo-se à reforma política. "Não haverá reforma política se não tiver nesse processo participação social. Não haverá."

Para o cientista político da USP José Álvaro Moisés, é algo positivo o fato de a sociedade civil poder influir nas políticas públicas, mas, no Brasil, há risco de o governo usar as estruturas ditas de participação para cooptar entidades. "É muito estranho que essa iniciativa ocorra no último ano de governo", afirmou. "A impressão que tenho é de que está situada no quadro de uma estratégia eleitoral."

Moisés citou o exemplo das centrais sindicais, que, para ele, foram "trazidas para dentro do Estado" na gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e passaram a dar mostras de submissão. "O governo do PT convive mal com uma sociedade civil rigorosa e crítica. Prefiro o modelo no qual a sociedade se organiza de forma própria, sem estar colada ao Estado", afirmou.

Já Sérgio Praça, cientista político e professor da Universidade Federal do ABC, elogiou a iniciativa, por consolidar práticas que já existem, como a ação de conselhos e conferências, e até possibilitar a adoção da internet como um canal de participação.

Praça não viu no decreto uma tentativa de instituir um sistema de "democracia direta", que atropelaria atribuições do Legislativo. "Não é uma tentativa de governar por referendo ou plebiscito. O decreto apenas trata da possibilidade de a sociedade ser consultada sobre políticas públicas."

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