China põe o Brasil no jogo

Com suas importações gigantescas, chineses garantiram crescimento, emprego e superávits

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Por Luiz Guilherme Gerbelli
Atualização:

Nos próximos anos, o desempenho econômico Brasil estará associado ao da China. Essa relação pode ser explicada pelos laços econômicos cada vez mais fortes entre os dois países, sobretudo desde a década passada, quando a economia asiática superou os Estados Unidos e se tornou a principal compradora de produtos brasileiros.

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O crescimento da participação chinesa na pauta de exportação brasileira impressiona. Em 2000, a China importava 2% de tudo o que o Brasil exportava. Em 2013, essa fatia chegou a 19%, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento Indústria e Comércio Exterior compilados pela Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex). Até julho, a participação chinesa nas exportações brasileiras foi de 20,98%.

A China se tornou a principal compradora do Brasil por causa da sua crescente demanda por produtos básicos. O país viveu forte crescimento nos últimos anos - seu Produto Interno Bruto (PIB) chegou a passar de dois dígitos - e passou a importar commodities, como minério de ferro e soja, para sustentar a elevada taxa de expansão da economia. “Ao longo desses anos, houve um aumento da demanda por minério de ferro pela China por causa do avanço da construção civil e do investimento em infraestrutura”, afirma Daiane Santos, economista da Funcex.

O enorme apetite chinês fez subirem os preços das principais commodities exportadas pelo Brasil. Em 2001, o valor da tonelada da soja era de US$ 174. Em 2013, de US$ 533. Nesse período, a tonelada do minério de ferro passou de US$ 19 para US$ 98. 

Superávits. Ao mesmo tempo em que se valorizaram os preços, a quantidade exportada também cresceu. Diante dessa dinâmica positiva, o Brasil acumulou altas reservas nos anos 2000. “Com os superávits acumulados ao longo da década, o Brasil pagou a dívida externa e acumulou excedentes em reservas cambiais”, diz José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).

O aumento da demanda por produtos básicos pela economia chinesa influenciou o mundo inteiro. Mesmo os produtos não exportados pelo Brasil para a China subiram de preço - sua movimentação provocou uma valorização das commodities nas bolsas de valores do planeta. “Esse movimento da China fez com que todos os países emergentes e exportadores de commodities garantissem recursos e pagassem a sua dívida externa, exceto a Argentina”, afirma Castro.

A ascensão da China trouxe uma acomodação para o Brasil. O comércio exterior do País ficou dependente da economia chinesa. Em 2000, a participação dos básicos nas exportações brasileiras era de 22,79%, e os manufaturados respondiam por 59,07%. De lá para cá, essa relação mudou. No ano passado, os básicos responderam por 46,67% e os manufaturados por 38,44%. “O problema não é exportar commodities, mas o fato de o Brasil não ter nenhum controle sobre preços e quantidades (dos produtos). Ficamos ao sabor da China”, acrescenta Castro.

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A perda de participação dos manufaturados é explicada pelos já conhecidos problemas de baixa competitividade da indústria. A balança comercial de manufaturados foi superavitária pela última vez em 2006, quando as exportações superaram as importações em US$ 5,1 bilhões. 

No ano passado, o déficit dos manufaturados na balança comercial foi de US$ 105 bilhões, o maior da história. “Para sair dessa situação, o País precisa de reformas tributária e trabalhista e investimento maciço em infraestrutura e menos burocracia”, diz o presidente da AEB.

Como qualquer movimentação chinesa traz impactos para a economia mundial, o Brasil vê com atenção os novos passos traçados pela China. O gigante asiático está hoje em processo de transição. A base da expansão econômica sairá da combinação de investimento e exportação e migrará para o consumo. Esse novo ciclo vai implicar em um crescimento mais baixo que o dos últimos anos. A previsão do FMI é que o PIB chinês avance 7,5% neste ano e desacelere um pouco nos seguintes. Em 2019, a previsão do Fundo é que o PIB cresça 6,5%. 

Limite. “Já havia uma percepção de que o modelo bem-sucedido de crescimento com a redução da pobreza e o aumento da renda per capita estava no limite. O ritmo milagroso prolongado (do aumento do PIB) foi impulsionado pela transferência de excedentes da mão de obra de atividades pouco produtivas na área rural para atividades industriais não muito sofisticadas nas cidades, mas com um volume maior de capital empregado. Essa mudança gerou um processo no qual a produtividade total dos fatores e dos trabalhadores subiu de forma sustentável por vários anos”, afirma Otaviano Canuto, conselheiro sênior sobre Brics do Banco Mundial. “Todo mundo sabe aonde a China quer chegar e tem de ir. O que está em aberto é a velocidade e a suavidade desse processo de transição”, acrescenta. 

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Por causa de toda essa mudança estrutural, Canuto prevê que a fatia do setor de serviços na China deverá aumentar nos próximos anos. “Essa evolução vai abrir o mercado para a exportação de serviços da China para o resto do mundo”, afirma o conselheiro sênior sobre Brics do Banco Mundial.

Na avaliação de Canuto, o reequilíbrio da economia chinesa deve alterar o perfil das commodities mais compradas pelo país, com queda na demanda de produtos direcionados para a construção civil, e aumento na demanda por alimentos por causa da continuidade da expansão da renda. “Pode-se imaginar que, nos próximos anos, haverá um crescimento menor do setor de construção, mas, por outro lado, a expansão da renda nas regiões ainda mais atrasadas da China deve fazer com que demanda por alimentos continue forte.”

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