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Chefe do Cade omite ligação com denunciante de cartel dos trens

Presidente de órgão que investiga suspeitas envolvendo setor metroferroviário trabalhou para deputado que denunciou irregularidades, mas não incluiu informação em currículo

Foto do author Andreza Matais
Por Andreza Matais e Fabio Fabrini
Atualização:

BRASÍLIA - O presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), Vinícius Marques de Carvalho, omitiu em ao menos quatro currículos oficiais ter trabalhado para o deputado estadual Simão Pedro (PT), responsável por representações que apontavam suspeitas de formação de cartel, superfaturamento e pagamento de propina envolvendo contratos do Metrô e da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM).Documento da Assembleia Legislativa paulista registra a passagem de Carvalho pela chefia de gabinete de Simão Pedro entre 19 de março de 2003 e 29 de janeiro de 2004. O vínculo não consta de nenhum currículo oficial apresentado por ele desde 2008, quando passou a ocupar cargos no conselho. A omissão ocorreu, inclusive, quando ele viabilizou sua indicação à presidência do Cade pelo Senado em 2012. "Foi provavelmente um lapso", disse ao Estado o presidente do Cade.O Cade, órgão que regula a concorrência empresarial no País, fechou em maio deste ano um acordo de leniência com a Siemens, empresa alemã detentora de uma série de contratos com o governo paulista nas últimas décadas. Nesse acordo de leniência - em que a empresa assume irregularidades para amenizar sanções futuras -, a Siemens confessou a existência do cartel e disse que ele atuou nas gestões tucanas no Estado entre os anos de 1998 e 2008.Assim que o conteúdo do acordo veio à tona, em julho deste ano, integrantes do governo Geraldo Alckmin (PSDB) acusaram o órgão federal de vazar informações de forma seletiva motivado por questões políticas.Simão Pedro, que hoje ocupa o cargo de secretário de Serviços da gestão Fernando Haddad (PT) na capital paulista, afirmou que se trata de uma coincidência o fato de o caso Siemens, denunciado inicialmente por seu gabinete, emergir no Cade após seu antigo assessor ter assumido a presidência do órgão. Em um documento enviado ao Senado pela então ministra da Casa Civil Erenice Guerra, em 2010, por exemplo, Carvalho lista suas "atividades profissionais" de fevereiro de 2002 a janeiro de 2003 e, na sequência, as de fevereiro de 2005 a fevereiro de 2006. Há um hiato justamente no período em que atuou para o deputado petista. Na ocasião, Carvalho era conselheiro do Cade e estava sendo reconduzido ao cargo. O currículo é detalhado, com nove páginas, elenca oito "atividades profissionais", mas silencia sobre a passagem pelo gabinete de Simão Pedro. Em 2012, a ministra Gleisi Hoffmann, da Casa Civil, também encaminhou o currículo de Carvalho ao Senado. Ela apresentava seu nome para a presidência do Cade por quatro anos. A relação de "atividades profissionais" não mencionou, igualmente, sua passagem pela Assembleia Legislativa. Os senadores aprovam as indicações para cargos públicos com base em sabatina e no currículo que recebem da Casa Civil. A única menção ao trabalho na Assembleia consta de documento enviado ao Senado em 2008, na primeira indicação de Carvalho para o conselho. Na ocasião, ele informou que foi chefe de gabinete na Assembleia, sem citar o deputado estadual petista.Os dois históricos profissionais do site do Cade também omitem que Carvalho trabalhou para Simão Pedro. O deputado apresentou verbalmente suspeitas de irregularidades nos contratos de trens ao Ministério Público paulista em 2010. A representação pedindo investigação foi protocolada meses depois, em fevereiro de 2011. Nela, o deputado mencionava carta de um ex-executivo da multinacional enviada à ombudsman da companhia, detalhando as irregularidades.Em junho e dezembro de 2012 Simão Pedro fez mais denúncias ao Ministério Público apontando suspeitas na reforma de 96 trens das linhas 1 e 3 do Metrô, nas quais a Siemens atuou. Naquele mesmo ano, Carvalho assumia a presidência do Cade. "Esse negócio da Siemens entrou no radar do Cade em 2012. Até chegar ao acordo de leniência, levou um tempo", disse o presidente do órgão. 'Alento'. A autodelação foi oficializada, enfim, em maio deste ano, o que detonou o escândalo. Nas palavras de Simão Pedro, foi "alento", já que as investigações não andavam no Ministério Público paulista. "Para minha sorte, (o caso) foi ao Cade. O Ministério Público sempre me disse que as provas que eu apresentei não eram suficientes para apresentar uma denúncia", disse o deputado.Após o acordo de leniência vir à tona, o Ministério Público reativou 45 ações civis e abriu uma ação criminal para apurar as licitações dos governos tucanos e as suspeitas de pagamento de propina a agentes públicos. O deputado estadual nega ter mantido contato com Carvalho durante seu período no Cade. Já Carvalho diz não aceitar "acusação de politização da investigação do cartel". "Se a empresa vem ao Cade, como o órgão pode ser acusado de estar politizando?", disse em 17 de agosto, numa reação às acusações dos integrantes do governo tucano segundo as quais o órgão estaria vazando informações de forma seletiva para atingir o PSDB.

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