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O Congresso e o Supremo: PEC da Bengala e PEC 473

A mais nova Emenda Constitucional 88/2015, fruto da PEC 457/05, conhecida por PEC da Bengala, aumenta de 70 para 75 anos a idade para aposentadoria compulsória dos ministros dos tribunais superiores. A medida é uma clara resposta ao fato de que completariam 70 anos, até o final de 2018, cinco ministros do Supremo Tribunal Federal. Com a mudança, a presidente Dilma Rousseff perderá a atribuição de indicar ministros, já que não serão aposentados de forma compulsória durante seu mandato.

Por Supremo em Pauta
Atualização:

A Câmara dos Deputados, sob a batuta de Eduardo Cunha, tem se mostrado extremamente hábil na negociação de projetos que representem perdas à base governista. Na terça-feira, 5, foi ao ar programa do Partido dos Trabalhadores em rede nacional, com a participação de Lula. O ex-presidente teceu duras críticas ao projeto da terceirização. Deputados teriam ficado incomodados com a mensagem de que o PT estaria ao lado dos trabalhadores, em rede nacional, ao mesmo tempo em que a legenda pressiona os parlamentares para que defendam o ajuste fiscal no Congresso. O ajuste inclui, é importante lembrar, a alteração de alguns direitos trabalhistas, como o seguro desemprego. Assim, a mensagem que se transmite é de que a oposição aprova as medidas impopulares, enquanto o PT defende o trabalhador.

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Aproveitando a casa cheia, pois as MPs 664 e 665 do ajuste fiscal seriam votadas, e o clima de irritação diante da mensagem petista, Eduardo Cunha pôs em pauta a PEC da Bengala. Aprovou a PEC por 350 votos contra 125. Fica, assim, difícil aferir se a alteração passou por uma reflexão de ordem institucional ou até demográfica.

Esta não foi a única proposta de mudanças na relação entre STF e Presidência trabalhada por Eduardo Cunha. Ele determinou, nas últimas semanas, a volta da discussão da PEC 473/01, que retira da Presidente da República a exclusividade na indicação de ministros do STF e institui mandato de 11 anos.

Caso esta proposta seja aprovada, a Câmara e o Senado ganham o direito a duas indicações cada. À Presidente caberia a indicação de cinco nomes, enquanto o próprio STF poderia indicar outros dois, com base em listas tríplices, feitas pelo STJ, TST, CNJ, CNMP e OAB. A discussão está apenas começando, mas se for prioritária para Cunha, a PEC pode ser aprovada ainda este ano.

O objetivo da PEC 473/01 parece ser o de aumentar a participação de representantes democraticamente eleitos. O tema não é uma novidade. Em outros países, o presidente tem papel passivo, como é o caso na Alemanha, onde o presidente acata a decisão de um comitê eleitoral, com participação parlamentar. Parte-se do pressuposto de que diferentes interesses e setores são acomodados nas indicações e discutidos previamente. Considera-se que a indicação feita pelo chefe do Executivo seja, naturalmente, mais centralizada e sensível a interesses localizados nas restritas esferas de poder do presidente em exercício.

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A participação ativa do Congresso parece refletir, finalmente, o peso político que a escolha de um novo ministro representa para o país. Uma maior abertura do processo de indicação permite que o ministro escolhido reflita de forma mais precisa diferentes setores da sociedade.

Embora a discussão da mudança das regras para indicação no Congresso brasileiro seja antiga, o momento político para sua aprovação nunca foi tão favorável. A aprovação da PEC da Bengala demonstra bem isso. Com o animal político Eduardo Cunha presidindo a Câmara, num momento de baixa popularidade da presidente Rousseff, de fraco desempenho econômico e de ausência de nomes do PT que criem um núcleo gravitacional de poder alternativo, há a sensação de um laissez-faire político na Câmara, em que Cunha é a mão invisível.

Tendo o STF papel central na vida política do país, indicações da Câmara e do Senado, com a influência de Cunha, poderiam garantir nomes mais próximos a sua esfera de convicções e poder. O fato dos togados permanecerem por um mandato restrito, no entanto, ajudaria a atualizar de forma dinâmica o corpo colegiado, em linha com as mudanças da sociedade. A PEC da Bengala é um reflexo dessa mudança, ao menos se considerarmos a ampliação da expectativa de vida no país e a necessidade de ajuste das contas públicas.

A maior participação do Congresso no desenho do Supremo Tribunal Federal parece, assim, ter saldo positivo, ainda que a motivação e agilidade das votações passem, também, por disputas políticas. Os dois episódios deixam uma mensagem clara: as relações entre o Congresso e o Planalto mudaram e vão redefinir também as relações com o STF. A longevidade dessa mudança e suas características estão ainda sendo definidas.

Anna Luiza Carvalhido é economista, além de mestre e pesquisadora em Direito pela FGV DIREITO SP.

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