A responsabilidade da Administração Pública por um triz

A discussão pelo Supremo Tribunal Federal a respeito da responsabilidade da Administração Pública por débitos trabalhistas de empregados terceirizados de empresas contratadas via Lei de Licitações vinha se estendendo desde o começo deste ano, em sucessivos julgamentos do recurso extraordinário 760931.

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Por Supremo em Pauta
Atualização:

A ministra Rosa Weber, relatora do caso, defendeu a tese de que a transferência automática desses encargos pode até ser proibida pela Lei de Licitações, mas, uma vez provada a falta de fiscalização do contrato de trabalho pelo poder público, deveria haver sua responsabilização.

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O ministro Luiz Fux, porém, divergiu. Para ele, a Administração não poderia ser obrigada a arcar com esses valores pois faria a reserva de recursos financeiros para o pagamento desses contratos de trabalho no momento inicial do processo licitatório.

O Tribunal, então, se dividiu, ficando o desempate por conta do ministro Alexandre de Moraes, que votou contra a responsabilização do poder público, em defesa de suposta "modernização" do Estado. Ao final, a maioria dos ministros entendeu que a responsabilidade da Administração Pública não é nem solidária, mas pode ser subsidiária, na hipótese em que houve falha da administração na fiscalização do contrato, mediante comprovação em processo judicial.

Na tarde da última quarta-feira (26/04), o STF fixou a tese de repercussão geral, que servirá para todos os demais casos semelhantes, nos seguintes termos: "o inadimplemento dos encargos trabalhistas dos empregados do contratado não transfere automaticamente ao Poder Público contratante a responsabilidade pelo seu pagamento, seja em caráter solidário ou subsidiário, nos termos do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93".

Contudo, a tese não refletiu fielmente o que foi discutido pelo Pleno durante o julgamento, já que foi feita a ressalva de que a Administração Pública não será imediatamente responsável pelos débitos trabalhistas de terceirizados, mas existirá a responsabilização se, por exemplo, for comprovada sua omissão na fiscalização dos contratos.

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Como se pode notar, apenas o termo "automaticamente" remeteria a esta ideia. Porém, uma leitura feita de modo isolado desta orientação não leva ao entendimento do modo como se daria a responsabilização da Administração Pública, nem das obrigações de fiscalização exigidas do poder público. Ao se omitir sobre isso, o Tribunal abriu espaço para que os juízes de instâncias inferiores decidam, caso a caso, quando e quem tem o ônus de provar a ausência de fiscalização do contrato de trabalho, o que pode gerar novas ondas de litígio, incertezas e tratamentos desiguais.

Os ministros lembraram, nesse mesmo julgamento, que a fixação da tese não poderia deixar de cumprir sua função de reduzir a judicialização de conflitos, que inunda e congestiona o Tribunal. Infelizmente, este objetivo não deverá ser cumprido e o maior responsável é o próprio Supremo Tribunal Federal.

Thales Coimbra e Luíza Pavan Ferraro, pesquisadores do Supremo em Pauta da FGV Direito SP.

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