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"É notoriamente discriminatória", diz especialista sobre ordem da PM para abordagem de negros e pardos

Ao contrário do que pensa o governador Geraldo Alckmin (PSDB), o juiz federal Roger Raupp Rios, professor do curso de mestrado em direitos humanos da UniRitter e estudioso do direito da antidiscriminação, considera "notoriamente discriminatória" a ordem expedida pelo comandante da Polícia Militar em Campinas, interior de São Paulo, para que seus agentes abordassem jovens de "cor parda e negra" em suas rondas.

Por Roldão Arruda
Atualização:

A ordem foi expedida em dezembro, mas se tornou pública só nesta semana, por meio de reportagem do Diário de São Paulo. Diante da polêmica que o fato causou, o governador paulista saiu em defesa da PM.

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Na quinta-feira, 24, disse em entrevista que o caso não indica racismo. Na avaliação do governador, trata-se de caracterização física de um grupo específico de supostos criminosos, que estariam agindo em Campinas. Se fosse o caso, afirmou, o comandante poderia ter indicado um suspeito loiro ou asiático.

Para o especialista, porém, a ordem de "abordar indivíduos em atitude suspeita, em especial os de cor parda e negra", destaca um determinado grupo de cidadãos, a partir do critério racial, e acaba direcionando a política de segurança pública contra tal grupo.

 Foto: Estadão

"Talvez, alguém, de modo 'ingênuo', possa se perguntar se tal ordem não seria admissível, pois estaria fundada, pretensamente, em um dado fático objetivo, relacionado a certos indivíduos, contra os quais há relato de possível prática de delitos", observa o especialista. "Esse raciocínio, no entanto, não se sustenta por dois motivos. O primeiro é que ação de segurança pública, no seu dever de vigilância e prevenção da prática de delitos, deve atentar para todo e qualquer indivíduo 'em atitude suspeita', sem depender da cor das pessoas envolvidas. O segundo é que, na ausência disso, estar-se-ia admitindo que a ação policial tome por base não a prevenção de crimes ou a repressão sempre que um delito possa ser ou seja praticado por alguém."

Ordens com o conteúdo da que foi expedida pelo comandante da PM em Campinas, na avaliação do estudioso, levam ao etiquetamento de certos grupos de cidadãos. "Na criminologia utiliza-se a expressão labelling approach. Refere-se àqueles cidadãos que passam a ser especialmente vítimas da ação policial. Isto gera um efeito de deterioração da identidade dos indivíduos e grupos etiquetados, alimentando e fomentando mais violência e discriminação."

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Ainda que se argumente, segundo Rio, que a ordem não tenha o propósito de discriminar, haveria, no mínimo, a hipótese de discriminação indireta, não-intencional.

"Alguém, desatento às dinâmicas da discriminação, poderia pensar que a ordem da PM se funda no fato 'objetivo' de que o suspeito, assim como é 'negro e pardo', poderia ser 'careca ou loiro'", observa. "Mas o direito da antidiscriminação ensina como perceber o quão discriminatória é esta atitude.'

 Ele cita o jurista americano Charles Lawrence III, que, em artigo largamente difundido nos EUA, pergunta: "Os grupos dominantes, nesta sociedade, aceitariam uma ordem policial para abordar 'brancos e loiros', em determinado bairro?"

Para Rios, a ação do comandante da PM pode desencadear reações jurídicas, tanto no plano administrativo, para que se evite a repetição dessas práticas, quanto no plano judicial. "É cabível pedido de reparação e de adoção de medidas corretivas da política pública de segurança, por eventuais prejudicados, pelo Ministério Público e por entidades que lutam contra a discriminação racial", afirma.

Acompanhe o blog pelo Twitter - @Roarruda

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