A ordem foi expedida em dezembro, mas se tornou pública só nesta semana, por meio de reportagem do Diário de São Paulo. Diante da polêmica que o fato causou, o governador paulista saiu em defesa da PM.
Na quinta-feira, 24, disse em entrevista que o caso não indica racismo. Na avaliação do governador, trata-se de caracterização física de um grupo específico de supostos criminosos, que estariam agindo em Campinas. Se fosse o caso, afirmou, o comandante poderia ter indicado um suspeito loiro ou asiático.
Para o especialista, porém, a ordem de "abordar indivíduos em atitude suspeita, em especial os de cor parda e negra", destaca um determinado grupo de cidadãos, a partir do critério racial, e acaba direcionando a política de segurança pública contra tal grupo.
"Talvez, alguém, de modo 'ingênuo', possa se perguntar se tal ordem não seria admissível, pois estaria fundada, pretensamente, em um dado fático objetivo, relacionado a certos indivíduos, contra os quais há relato de possível prática de delitos", observa o especialista. "Esse raciocínio, no entanto, não se sustenta por dois motivos. O primeiro é que ação de segurança pública, no seu dever de vigilância e prevenção da prática de delitos, deve atentar para todo e qualquer indivíduo 'em atitude suspeita', sem depender da cor das pessoas envolvidas. O segundo é que, na ausência disso, estar-se-ia admitindo que a ação policial tome por base não a prevenção de crimes ou a repressão sempre que um delito possa ser ou seja praticado por alguém."
Ordens com o conteúdo da que foi expedida pelo comandante da PM em Campinas, na avaliação do estudioso, levam ao etiquetamento de certos grupos de cidadãos. "Na criminologia utiliza-se a expressão labelling approach. Refere-se àqueles cidadãos que passam a ser especialmente vítimas da ação policial. Isto gera um efeito de deterioração da identidade dos indivíduos e grupos etiquetados, alimentando e fomentando mais violência e discriminação."
Ainda que se argumente, segundo Rio, que a ordem não tenha o propósito de discriminar, haveria, no mínimo, a hipótese de discriminação indireta, não-intencional.
"Alguém, desatento às dinâmicas da discriminação, poderia pensar que a ordem da PM se funda no fato 'objetivo' de que o suspeito, assim como é 'negro e pardo', poderia ser 'careca ou loiro'", observa. "Mas o direito da antidiscriminação ensina como perceber o quão discriminatória é esta atitude.'
Ele cita o jurista americano Charles Lawrence III, que, em artigo largamente difundido nos EUA, pergunta: "Os grupos dominantes, nesta sociedade, aceitariam uma ordem policial para abordar 'brancos e loiros', em determinado bairro?"
Para Rios, a ação do comandante da PM pode desencadear reações jurídicas, tanto no plano administrativo, para que se evite a repetição dessas práticas, quanto no plano judicial. "É cabível pedido de reparação e de adoção de medidas corretivas da política pública de segurança, por eventuais prejudicados, pelo Ministério Público e por entidades que lutam contra a discriminação racial", afirma.
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