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''Aperto no crédito não substitui a política de juros''

Fernando Dantas/ RIO - O Estado de S.Paulo

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Por Redação
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Para Gustavo Loyola, ex-presidente do Banco Central (BC) e sócio da consultoria Tendência, o BC interrompeu prematuramente a alta de juros em setembro, quando manteve a taxa Selic em 10,75%. Loyola apoia o aperto dos compulsórios anunciado na sexta-feira. O que o sr. achou das medidas dos compulsórios? Foram acertadas. O Banco Central se mostrou preocupado com o crescimento do crédito, e por isso aumentou o compulsório e requerimentos de capital para operações de prazo mais longo e menor grau de garantia. Está no contexto da regulação macroprudencial, para evitar o surgimento de riscos sistêmicos no sistema financeiro. As medidas vêm num momento em que a economia está claramente aquecida, com crescimento de demanda acima do potencial. Qual a relação delas com a política monetária? Essa medidas atuam na mesma direção da política monetária, são complementares. Ao afetarem o crescimento do crédito, elas atingem também o crescimento da demanda. Dado que foram adotadas, o aumento do juro pode ser menor do que em situação contrária. Mas isso não substitui a política monetária, a política de juros. Por quê? O problema de contar só com o compulsório é que, quando se faz isso com exagero, o que se tem como resultado é uma gigantesca distorção no mercado de crédito e na economia como um todo. Criam-se mecanismos informais de crédito que são menos eficientes e trazem mais riscos à atividade econômica. Além disso, o crédito é apenas um dos canais através do qual a política monetária age. O sr. poderia explicar? A taxa de juros tem um efeito muito mais abrangente sobre a economia do que os efeitos diretos do crédito. Os juros afetam o valor dos ativos, com o chamado efeito riqueza. Por exemplo, o preço dos imóveis e títulos de renda fixa cai. Isso também reduz a demanda agregada. O sr. acha que o compulsório foi usado por que a presidente eleita, Dilma Rousseff, quer evitar ao máximo a alta de juros? Mesmo no governo Lula, há pessoas no Ministério da Fazenda que acreditam que a elevação do compulsório ou restrições diretas ao crédito, inclusive limites quantitativos, podem substituir a política monetária. Mas não é essa a visão do BC. Eles conhecem política monetária e sabem que não é bem assim. O BC se atrasou no combate à inflação? A nossa visão na Tendências é que o BC de fato interrompeu prematuramente a alta de juros. A taxa de juro real ainda estava e está abaixo do ponto neutro. Quando ele interrompeu, nós dissemos que a chance de ter de retomar em 2011 era muito alta. Parece que o BC está colocando menos peso nas expectativas inflacionárias, não sei se em função das mudanças na diretoria. O BC hoje olha muito mais seus próprios modelos e hipóteses. E acho que algumas das expectativas do BC não estão se realizando. Quais? A situação da economia internacional hoje, por força da alta das commodities, está provocando mais pressão inflacionária do que desinflacionária, ao contrário do que esperava o BC. Em segundo lugar, uma das hipóteses do modelo do BC é que haverá um esforço fiscal em 2011, que compensará a pressão de demanda. E também acho prematuro dizer alguma coisa sobre essa questão. Por quê? Tem sinais positivos na mesa, é verdade. O primeiro grande teste será a definição do salário mínimo. Vamos ver se o governo resiste às pressões e fica no R$ 540, e como se posiciona em relação ao Orçamento de 2011. Mas não é algo que dê para confirmar ou negar no ano que vem. Se houver esforço fiscal, acho que a alta de juros pelo BC pode ser menor. Qual a sua previsão de alta de juros, e como ela deve ocorrer? Acho que os juros têm de ser elevados o mais rapidamente possível, para evitar que a inflação atinja níveis preocupantes. Considero que o mais provável é que haja aumento já a partir de janeiro. Nossa previsão é de um ciclo de alta de dois pontos porcentuais, mas, se houver um esforço fiscal razoável, isso pode cair para 1% ou 1,5%.

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