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A Ciência Política e um olhar sobre os Legislativos

A votação do impeachment sob a ótica da imprensa internacional

*Em coautoria Luiz Fernando Miranda, doutor em Ciência Política pela Universidade Federal Fluminense, pós-doutorando em Ciência Política pela PUC/RJ e membro da Transparência Brasil.

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Por Vítor Sandes
Atualização:

A votação que autorizou o processo de impeachment na Câmara dos Deputados, no último dia 17 deste mês, foi o evento mais singular da política brasileira nos últimos anos. A votação foi aberta e transmitida ao vivo. Após horas de votação, o resultado foi a vitória da oposição que conseguiu aprovar a admissibilidade do pedido de impeachment, com mais de 2/3 dos votos necessários na Câmara dos Deputados. No Brasil, foram vários os enquadramentos dados ao processo de votação.

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Um tipo de análise se focou, particularmente, sobre o processo de votação, em si, principalmente sobre a forma como os deputados votaram. Foram observadas justificativas das mais diversas: em nome da família, de Deus e de parentes até "pela paz em Jerusalém". Teve até quem prestou homenagem ao Coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, que comandou o DOI-CODI de São Paulo, durante o regime militar. Um deputado, em resposta, repudiou o fato, cuspindo no autor da homenagem. Para completar, a sessão foi presidida pelo deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), investigado na Lava Jato e que sofre processo de cassação de mandato por quebra de decoro parlamentar no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados.

Um impeachment obviamente não é um evento muito comum no presidencialismo. No Brasil, no entanto, este é o segundo processo admitido em 24 anos (em 1992, houve o caso do ex-presidente Fernando Collor de Mello). Assim, houve outro enquadramento que não tratou do processo de votação em si, mas da incapacidade do governo de obter o apoio mínimo de 1/3 dos deputados federais, demonstrando a capacidade reduzida de coordenação política da presidente. Pela singularidade do processo e pela crise política por que o país passa, a votação do impeachment na Câmara dos Deputados chamou, em muito, a atenção da imprensa internacional.

Para esta breve análise, foram selecionadas reportagens de importantes jornais e revistas internacionais: New York Times, The Washington Post, Time, The Economist, The Guardian, The Independent, Le Monde e El País. A análise, portanto, está longe de ser exaustiva e tem apenas o intuito de apresentar um recorte da cobertura da mídia internacional sobre o processo de votação do impeachment acontecido na Câmara dos Deputados.

Uma análise preliminar das reportagens veiculadas pela mídia internacional evidenciou que os enquadramentos adotados foram diversos e muito menos polarizados do que aqueles observados no Brasil. A maior parte tenta apresentar possíveis razões para o processo e, para tanto, elencam as diversas causas: casos de corrupção, erros na condução da política fiscal, deterioração do desempenho econômico, perda de popularidade e, sobretudo, a dificuldade da presidente de obter apoio legislativo. O aparecimento dessas diversas causas, em conjunto, reforça a tese do julgamento político do impeachment brasileiro, pois não há um foco, em específico, no possível crime de responsabilidade cometido pela presidente.

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Em maior ou menor grau, é recorrente também a preocupação com o clima de incerteza que surge a partir desse cenário: a Câmara aprovou o impeachment, mas Dilma Rousseff continua a ser a presidente até o Senado analisar e votar o pedido de impedimento. Assim, é possível compreender a preocupação da seguinte forma: quem governa o país? A presidente que está prestes a cair ou o vice que está na eminência de assumir? Para além disso, quais os rumos do país a partir desse tsunami político?

Como foi apontado, o clima de incerteza, motivado por um processo de impedimento multicausal, é o "calcanhar de Aquiles" do país neste momento. Até resolver as arestas institucionais, na tentativa de minimizar o conflito, clarear o cenário nebuloso e definir rumos claros para o futuro, esse processo, para a imprensa internacional, continuará a ser analisado com muitos pontos de interrogação.

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