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Estratégias eleitorais, marketing político e voto

A CNV e as escolhas de Dilma

Num momento de crise no governo, com denúncias de corrupção, e uma oposição fortalecida pelas urnas, a presidente escolheu qual briga não comprar

Por Julia Duailibi
Atualização:

Não era necessário exercício de adivinhação para saber que o relatório final da Comissão Nacional da Verdade (CNV), apresentado ontem, desagradaria aos dois lados: dos perseguidos pela ditadura, familiares de mortos e desaparecidos e organizações de defesa dos direitos humanos aos militares e críticos dos trabalhos do grupo.

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Se o relatório final não responde aos anseios desses grupos, ele se encaixa perfeitamente nas expectativas da presidente Dilma Rousseff (PT). Ao instalar a CNV em 2012, Dilma queria dar uma resposta à sociedade, mas sem entrar em confronto com as Forças Armadas nem com setores contrários à revisão da Lei da Anistia.

A despeito do passado de luta contra a ditadura, ela não quis jogar o peso da Presidência na discussão sobre a revisão da lei, de 1979, nem entrar em conflito com os militares a respeito da abertura dos arquivos dos anos de chumbo. A CNV enfrentou a resistência das Forças Armadas para acessar documentos sem que o Executivo se manifestasse a favor da comissão.

Dilma preferiu manter-se distante dos trabalhos do grupo, inclusive das disputas ideológicas e das picuinhas entre os comissionados. Quando poderia nomear novo integrante para a vaga do ministro Gilson Dipp (STJ), escolheu deixar a cadeira vazia para não levantar qualquer polêmica, sobretudo em ano eleitoral.

Assim, foi evitando o confronto com setores da sociedade e endossou a tese da reconciliação, presente na própria lei que cria a comissão. Sem a ajuda do Executivo para ultrapassar barreiras, a CNV acabou por produzir um relatório final que é basicamente uma "sistematização", como gosta de dizer o coordenador Pedro Dallari, das informações que já existiam.

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Apesar disso, o documento apresenta alguns avanços. Cita nomes, fala em cadeia de comando e pede responsabilização dos agentes públicos que perpetraram crimes contra a humanidade. Para isso, usa a mesma estratégia do Ministério Público Federal, segundo a qual esses crimes são imprescritíveis.

A presidente tirou do seu colo eventuais desdobramentos dos trabalhos da CNV e os jogou para o Supremo Tribunal Federal (STF), que voltará a analisar a Lei da Anistia sob a ótica de sua constitucionalidade diante dos acordos internacionais assinados pelo País que consideram imprescritíveis os crimes contra a humanidade.

Num momento de crise no governo, com denúncias de corrupção, e uma oposição fortalecida pelas urnas, Dilma escolheu qual briga não comprar.

 

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