Oposição assiste ao governo fazer campanha

A recuperação parcial da presidente Dilma Rousseff nas pesquisas é de pequeno porte, mas tem importante significado por ser a única entre as personagens e instituições atingidas pelas críticas das ruas a obter algum resultado positivo. Os demais - Congresso e candidatos -, apesar de esboçarem reações, não conseguiram reverter os pontos perdidos.

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Por João Bosco Rabello
Atualização:

É de se perguntar a razão dessa melhora da presidente, uma vez que não corresponde a qualquer medida efetiva que tenha promovido alguma mudança no quadro de estagnação que gerou os protestos de junho. Dilma reagiu com muito estardalhaço, mas nenhum de seus movimentos gerou fatos concretos.

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Uma conclusão válida é a de que a hostilidade da presidente ao Poder Legislativo, se agravou as relações entre o governo e sua base e com o Parlamento de um modo geral, agradou ao eleitor. O que estaria confirmado pela piora da avaliação da instituição Congresso Nacional, cuja agenda positiva, que pouco produziu,  foi engolida rapidamente pela produção em escala de maus comportamentos.

Outra possibilidade, que não exclui a primeira, é a de que Dilma pode ter transmitido vontade de acertar ao eleitor, reagindo com propostas que provocaram polêmicas e ganharam alta exposição nos meios de comunicação, casos da reforma política e do projeto Mais Médicos. Embora nenhuma delas tenha avançado, provavelmente foram assimiladas como um gesto de humildade da presidente por tentar atender ao clamor popular.

Outro fator que as pesquisas indicam ter sido decisivo foi a entrada em cena do ex-presidente Lula, não pelos ataques à oposição - que de tão bisonha os dispensa -, mas pela reafirmação do apoio à afilhada repondo a unidade, ainda que a fórceps, do PT em seu torno. As pesquisas praticamente confirmam a relação de causa e efeito ao registrar um índice de aprovação ao ex-presidente maior que o da sucessora e candidata à reeleição.

Ainda permanecem incógnitas o limite e a velocidade dessa reversão da hora, não sendo possível avaliar seu ponto máximo e sua consistência daqui em diante. Nem mesmo se irá além do registrado pela pesquisa e se sobreviverá à resistente queda da economia, expressa na estagnação do crescimento e na resistência da inflação, cuja redução o governo comemora apesar de se manter bem acima da meta.

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Os movimentos da presidente a colocaram nas ruas, em clima e ritmo de campanha, assumindo sua antecipação e fazendo do ataque a melhor defesa, ao melhor estilo do seu criador.

O recesso do Congresso deixou-a sozinha em cena, exibindo energia, distribuindo bondades aos aliados e críticas à oposição, como em São Paulo, onde foi entregar ao prefeito do PT, Fernando Haddad, R$ 8 bilhões para a mobilidade urbana, registrando que a cidade tem um sistema muito aquém de sua importância.

Não foi mera coincidência o momento escolhido e o estouro das denúncias de formação de cartel nas obras do setor desenvolvidas durante sucessivas gestões tucanas. O processo de negociação com a Siemens já estava concluído e as investigações do Cade e da Polícia Federal, em curso. Teve-se, então, o governo federal investindo em São Paulo, reduto do PSDB, enquanto este começava um provável calvário sem previsão de fim próximo.

De sua parte, o PSDB, principal partido de oposição, ao contrário do PT sob a intervenção de Lula, aprofundou sua desunião interna que reproduz o cenário de 2010, com os mesmos personagens, candidatos e conflitos. Oficialmente tem um candidato, Aécio Neves.  De verdade, são dois, depois que José Serra pediu sua inclusão nas consultas dos institutos de pesquisa para questionar a legitimidade do rival interno.

O momento indica que sobrou a Dilma o que falta nos adversários: campanha. A oposição parece não ter compreendido que ela já começou e que a presidente, cuja condição já a privilegia como candidata, desfruta sozinha da cena. Não por acaso, a candidata sem partido, Marina Silva, é hoje a sua concorrente mais próxima, beneficiária da exaustão do eleitor com o Congresso e os partidos.

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Não deixa de ser curioso que, depositária dos votos dos que contestam a democracia representativa, portanto condenam os partidos políticos, a ex-senadora combine uma das mais fortes candidaturas com a falta de um partido que a sustente.

Não é improvável que essa circunstância de aparente inviabilidade de seu partido, responda por boa parte do apoio que vem registrando, por situá-la fora do contexto em xeque, confirmando seu discurso de co0ntestação a "tudo que aí está".

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