Combate à corrupção e legalidade policial não são excludentes

Não há o que se discutir quanto ao mérito da operação Voucher, da Polícia Federal, que apenas levantou uma ponta do iceberg da corrupção na estrutura do Estado, ao prender autoridades do primeiro escalão do ministério do Turismo envolvidas em desvio de recursos públicos.

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Por João Bosco Rabello
Atualização:

Por ser apenas uma ponta dos muitos novelos que unem as quadrilhas instaladas nos poderes Executivo e Legislativo, é de se esperar que outras operações ampliem o combate à corrupção no organismo governamental. E, ao que se sabe, algumas delas estão em curso.

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No momento em que sofre pressão pública pela liberação de emendas o governo consegue, graças à ação policial, desnudar para o contribuinte o uso dessas emendas, indicando que elas fazem a festa de muitos ladrões do erário. O que cria justa expectativa de conseqüências penais para os infratores.

Isto posto, é importante condenar os aplausos aos excessos policiais que surgiram após a operação como uma espécie de clamor por vingança através da execração pública dos presos sob custódia do Estado.

Não é sadia para a democracia a autonomia policial para fazer suas próprias regras, como defendeu um líder da categoria ao justificar a fotografia dos presos na operação como coerentes com a "doutrina policial".

"Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa", é um chavão popular aplicável ao caso. A PF foi exemplar na investigação, na estratégia e no bote aos responsáveis pelos desvios. A sociedade se sentirá ainda mais correspondida em seus anseios por justiça se cumprido o rito da condenação com a conseqüente punição aos culpados.

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Ao contrário, a memória dos excessos sacia o sentimento efêmero de vingança que se transformará em frustração sedo episódio não resultar condenações e punições efetivas. Não é preciso ser jurista para saber que a vingança não tem registro em qualquer código jurídico.

Por isso, foi salutar a condenação pública da presidente Dilma Rousseff aos exageros da PF, ao mesmo tempo em que reafirmava sua determinação de ir buscar a corrupção onde ela estiver.

O gene da violência faz parte da estrutura policial. Numa ditadura, gera o que o país viveu - e que a própria presidente sofreu -, nos tempos de repressão: delegacias policiais transformadas em ilhas de tortura.

Em tempos democráticos, desafia as regras legais e contamina ações legítimas e importantes abrindo pretexto a contestações legais e a críticas aonde elas não deveriam encontrar espaço. Concorrendo com o principal e mais estratégico, que é o combate à corrupção.

E, mais grave, estabelecendo um princípio pelo qual a ação legal deve ser acompanhada de uma dose de estímulo ao clamor público por justiçamentos.

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O combate à corrupção e a submissão às regras jurídicas não são excludentes e, mais: devem andar juntos.

 

 

 

 

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