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Crônicas sobre política municipal. Cultura brasileira local sob olhar provocativo | Colaboradores: Eder Brito, Camila Tuchlinski, Marcos Silveira e Patricia Tavares.

Turismo pelas cidades do ministro

Em parceria especial com o gestor público, e pós-graduado em Ciência Política, Samuel Oliveira

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Por Humberto Dantas
Atualização:

 

O novo ministro do turismo, Marx Beltrão, é réu no STF acusado de falsidade ideológica quando foi prefeito em uma cidade alagoana. Ademais, não que isso seja uma acusação, mas pode ser sim um "belíssimo cartão de visitas", o ministro é apadrinhado por Renan Calheiros, que a imprensa aposta ser a bola da vez no mundo das acusações que a justiça tem protagonizado nesse país. Nós sinceramente duvidamos e esperamos estar errados, mas a habilidade lisa do sujeito que desde o governo Collor "se arruma em Brasília" não parece ter limites.

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Mas tudo bem. Vamos em frente. Nesse texto não vamos falar do fato de um ministro ser nomeado mesmo sendo acusado de um crime em investigação. Não, o caso aqui é de família, a de Beltrão.

Com dados do DIAP, nas eleições de 2014, o número de deputados federais eleitos com grau de parentesco com outros políticos, em diversos poderes, chegou a 16% da Câmara, ou seja, 86 deputados têm algum político eleito na família, o que influencia muito a votação desses parlamentares.

Já registramos diversas vezes a força dos frutos das mais diversas árvores genealógicas na selva chamada "política brasileira". Por exemplo: dos vintes e três deputados federais com até 30 anos de idade, eleitos em 2014, apenas um não fez carreira a partir de outros parentes já investidos em cargos políticos. Vamos requentar o debate sobre isso? Também não. Partimos para outro velho conceito de poderio familiar na política: conquistar cidades. No plural! E quando falamos em um conjunto de cidades, em mais de uma, podemos falar em turismo! Pois bem...

Antes da "interpretável" Súmula Vinculante nº 13, que dificultou a nomeação de familiares em cargos de confiança, o jeito encontrado por "dinastias políticas" foi conquistar diversas prefeituras para acomodar os parentes. Já pensou no turismo eleitoral em época de campanha? É isso!

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Mas, e o novo ministro? O que tem a ver com isso? Em tese, Marx Beltrão precisou se desdobrar para apoiar todos os familiares ao cargo de prefeito nas seguintes cidades alagoanas: em Jequiá da Praia, disputou Jeannyne Beltrão, irmã; em Coruripe (cidade onde Beltrão foi prefeito), Joaquim Beltrão, tio; em Feliz Deserto, Rosiana Beltrão, tia; em Penedo, Marcius Beltrão, primo; e, em Piaçabuçu, Djalma Beltrão, primo. Além disso, em cidade próxima das demais, mesmo estando em outro estado, Sergipe, um sobrinho disputou a eleição para prefeito em Ilha das Flores, Cristiano Beltrão. Será mesmo que Marx, com nome de quem briga contra a ditadura do capital, apoiou todos? Ou a família é rachada? Uma pista seria olhar o partido, mas anda difícil falar em partido nesse país: Marx é do PMDB de Renan, assim como Joaquim e Rosiana. Mas Jeannyne e Djalma são PRB e Cristiano é PSC, sendo que todos tiveram o PMDB como adversário. Sobra apenas Marcius, do PDT, que teve o PMDB como aliado...

Impressiona que todas as cidades ficam numa linha de 159 quilômetros partindo de Jequiá da Praia rumo ao sul, por vezes ladeando o mar e atravessando o deslumbrante rio São Francisco. As fotos e paisagens parecem fantásticas, roteiro belíssimo. Algo bastante emblemático e típico para um Ministro do Turismo, não fossem problemas profundos associados à ausência de bons indicadores sociais e à sua própria ficha na justiça.

Detalhe: todos os parentes foram eleitos, em todas as cidades! Pra completar a família faltou falar que Marx tem um irmão que é deputado estadual em Alagoas, João Beltrão. Se adicionarmos aqui o compadre senador, que é pai do governador, chegaremos em 2016 à família Calheiros, que conseguiu eleger para o quinto mandato seguido o prefeito de Murici (AL), mesma cidade que já foi gerida pelo filho e pelo irmão de Renan, onde agora desponta Olavo Calheiros Neto, sobrinho do presidente do Senado - nem vamos falar de Olinda-PE, que teve mais um irmão como prefeito por oito anos pelo Partido Comunista do Brasil. Pois bem, em meio a um roteiro turístico deslumbrante, fica difícil falar em "ditadura do proletariado", a despeito da palavra Marx e dos comunistas, mas tirando o "proletariado" do termo, o que fica merece atenção!

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