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Crônicas sobre política municipal. Cultura brasileira local sob olhar provocativo | Colaboradores: Eder Brito, Camila Tuchlinski, Marcos Silveira e Patricia Tavares.

O rei do elevador: "desce!"

O Brasil tomou um susto quando uma revista resolveu falar sobre o Rei do Camarote. O país tem ainda o Rei do Futebol, a Rainha dos Baixinhos e o Rei - esse último é simplesmente o rei, tamanha sua importância. Falo de um famoso cantor que a história tratará de chamar sempre de Rei.

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Por Redação
Atualização:

 

Movido por um sentido monárquico com perfil absolutista o país segue em seu ritmo cultural. Semana passada eu acho que conheci, mesmo não sabendo de quem se trata, o Rei do Elevador - ou pelo menos um deles, pois devem existir outros. O Anexo IV da Câmara dos Deputados é um prédio de dez andares e um subsolo - se a configuração não for exatamente essa peço desculpas, mas não tenho intimidade com o empreendimento. Em muitos de seus andares ficam os gabinetes de uma série de deputados federais. Como meio de transporte elementar existem oito elevadores próximos à recepção. Três deles estão reservados para as excelências: para os "nobres" parlamentares que vivem no país dos reis, que sonha em ser republicano, mas vive escorregando em seus gestos monárquicos.

 

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Assim, enquanto algumas poucas dezenas de deputados que têm ali seus gabinetes possuem três elevadores - tudo bem que um deles pode ser utilizado por mortais com deficiência - os milhares de funcionários e visitantes precisam aguardar em longas filas os outros cinco. E é isso mesmo o que acontece: filas imensas. Várias viagens. Idas e vindas, o antigo "plim" sincronizado à seta vermelha que desce ou à verde que sobe. Os ascensoristas reclamando do calor.Plim, plim, plim, até chegar a sua vez. Tem até um senhor que organiza o fluxo: "vai pro quatro!", "Espera na fila, tá lotado!", "Volta! Deu sinal de sobrepeso". Tudo confuso e deselegante. Mas fique calmo. Você pode estar num dia de sorte.

 

Ele aparece em silêncio. Humilde, terno cinza, camisa grená, gravata cinza. Chama o elevador e olha em volta. O de número sete abre a porta, plim, e a seta verde acende. Ele está sozinho ao lado da porta. Não participa da fila. Entra no carro - como dizem aqueles que têm intimidade com elevadores - e se volta para a porta. Quando termina de virar o corpo percebo que é um parlamentar. O broche na lapela diz tudo. Ele se impressiona com o tamanho da fila e cria uma regra nova, ao sabor dos reis. Dirige-se aos últimos da fila com um discreto "ei!", de dentro do elevador. Os últimos se voltam. Os primeiros já perderam muito tempo, e no país da vantagem e do jeitinho o rei pouco se importa com isso. Ele continua: "venham por esse aqui. Vai subir vazio!". Uma pessoa adverte-o: "esse é dos parlamentares". E ouve como resposta: "eu sei. Eu sou deputado, e estou convidando vocês para subirem comigo!". Na frase, ênfase para o "convidando", com a letra "a" bem longa e carinhosa. O elevador lota. Os novos princípios da sustentabilidade justificariam a gentileza, mas certamente não foi isso que o motivou. Ele fez o favor, ele criou o laço que durará segundos. Ele reinou, a despeito de outros reinarem numa horda de reizinhos dos elevadores. Certamente a subida foi repleta de gracejos e elogios. A Casa do Povo tem mais um rei, o Rei do Elevador, e seus 512 nobres colegas para os quais existem regalias infinitamente maiores que três simples carros ascensores. Que tristeza. Plim, setinha vermelha acesa: desce... Até onde? Já não passamos do subsolo?

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